Criatividade na advocacia: 6 dicas para pensar fora da caixa | Análise
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Criatividade na advocacia: 6 dicas para pensar fora da caixa

Marcel Leonardi e Fernanda Maia discutem como o ambiente de trabalho, a colaboração da equipe e influências externas são diferenciais na prestação de serviço jurídico

2 de January 7h

O que é ser criativo na advocacia? O exemplo clássico - e clichê - é o do advogado Sobral Pinto, que recorreu à Lei de Proteção aos Animais em defesa de presos torturados pela ditadura (1964-1984).

Após cinco décadas da "sacada" de Sobral Pinto e com as intensas transformações tanto na profissão quanto no próprio advogado, a criatividade se propõe a resolver problemas que vão além dos jurídicos.

Ficou claro que o advogado não vive apenas de artigos, parágrafos, incisos e alíneas. Cedo ou tarde, ele precisará de algo a mais: criatividade.

"Ser criativo, em primeiro lugar, é entender que o cliente busca um escritório para encontrar soluções", definiu o advogado Marcel Leonardi, sócio do Leonardi Advogados. "Essas soluções não consistem em explicar o que a lei e a jurisprudência já dizem — isso a IA já faz. Ser criativo é ter insights próprios."

Portanto, com o auxílio do sócio Marcel Leonardi e da gerente estratégica do Leonardi AdvogadosFernanda Maia, separamos exemplos de como você pode exercitar a criatividade na advocacia. A seguir, confira 6 dicas para pensar fora da caixa e estimular sua criatividade:

1. Crie um ambiente de trabalho estimulante

Quando a única cor que se vê no escritório é o bloco de Post-it, algo está errado. Um ambiente que favorece a troca de ideias entre advogados e outros profissionais se torna um verdadeiro celeiro de soluções.

Inaugurada em 2021, a sede de 180 m² do Leonardi Advogados, em São Paulo, foi inspirada em empresas como o Google - local onde Marcel trabalhou por sete anos. O espaço conta com paredes coloridas, mesas de trabalho compartilhadas, videogames, bebidas e snacks. "Ser criativo é criar um ambiente colaborativo", afirmou Marcel.

"Esse escritório de arquitetura que contratamos disse que não fazia projetos para escritórios de advocacia. Na cabeça deles, [o projeto] deveria ser algo sisudo, cinza. Até que eu expliquei minha proposta e eles aceitaram", contou.

O projeto do Studio DLux - o mesmo responsável pelo design das sedes do Spotify, incluindo Escuta as Minas, e das escolas da rede Red House - chamou a atenção da publicação especializada em arquitetura corporativa Officelovin.

2. Diversidade para ter criatividade

"Para sermos criativos, precisamos ser diversos", afirmou Fernanda Maia, gerente estratégica do escritório. Pensar em como romper a bolha foi um dos pilares na fundação do Leonardi Advogados, segundo ela.

A primeira turma de estagiários foi selecionada a partir de um grupo de juristas negros. O próximo passo foi expandir a seleção para candidatos fora de São Paulo. Atualmente, o escritório conta com quatro advogados nordestinos em sua equipe.

3. Explorar tecnologias emergentes

Dizem que a advocacia está passando por uma "revolução cambriana" devido ao surgimento repentino de novas tecnologias. No caso da advocacia, isso se traduziu em um avanço significativo na quantidade de softwares de gestão jurídica e ferramentas de Inteligência Artificial, que prometem organizar e otimizar o trabalho.

"Se surgir algo novo, seja uma ferramenta que um cliente está desenvolvendo e que precise de testes, nos prontificamos a ajudar", afirmou Fernanda. Acompanhar as inovações tecnológicas e pensar em como aplicá-las no dia a dia do escritório é uma tarefa que envolve toda a equipe. "Desde que traga eficiência, estamos abertos a novas soluções".

"Quando lançam algo novo, já queremos testar. Isso nos ajuda tanto no desenvolvimento de novos trabalhos quanto na melhoria da eficiência nas tarefas cotidianas."

4. Thinking outside the box

Além dos métodos tradicionais de litígio, explorar alternativas como mediação, arbitragem e negociação oferece soluções mais rápidas, menos onerosas e mais satisfatórias para todas as partes. Ao analisar um caso, desafie-se a pensar em opções inovadoras e menos óbvias.

Uma boa prática é incentivar a autorreflexão na equipe. Em avaliações semestrais, por exemplo, incluir uma pergunta sobre a disposição do advogado em pensar "fora da caixa" pode estimular essa reflexão constante. "Essa reflexão é algo que buscamos o tempo todo", afirmou Fernanda.

"Mudamos muito nossa forma de trabalhar, pois aprendemos com os erros e acertos, além de ouvirmos o feedback", explicou. "Uma das críticas que recebíamos estava relacionada ao controle e visibilidade. Pedi soluções aos advogados, testamos ferramentas que eles sugeriram e agora tudo está funcionando muito bem."

5. Abordagem interdisciplinar

É possível - e recomendado - incorporar conhecimentos de outras áreas, como psicologia, economia, sociologia e tecnologia. Alguns chamam isso de "advocacia holística". Um exemplo é compreender aspectos psicológicos em um conflito familiar, o que pode facilitar a mediação e resolução de disputas.

Abordagens interdisciplinares tiram a advocacia do âmbito puramente jurídico, proporcionando ao advogado estudos que ampliam sua visão sobre negócios, administração e marketing, por exemplo.

Às vezes, é mais útil o profissional saber como funciona um efeito de rede no ambiente digital, a mídia programática ou as soluções tecnológicas de um cliente, como explicou Marcel, do que ler 40 livros sobre processo civil.

6. Ter inspiração fora do ambiente jurídico

Que tal buscar insights em filmes, livros, músicas e em experiências de outras indústrias? Muitas vezes, esses meios fornecem ideias inovadoras para lidar com questões legais.

Essas referências podem ser incorporadas no escritório e até no site. Se a música for uma paixão, por que não ter as salas Queen e Iron Maiden? No site, uma boa ideia é revelar curiosidades sobre cada advogado ao passar o mouse sobre a foto.

Fernanda Maia, por exemplo, é descrita no site do Leonardi Advogados como "mãe de golden, disneymaníaca e cantora". Já Marcel é apresentado como "metalhead, corredor de rua e PC gamer".

"Essas coisas ajudam a manter a higiene mental", afirmou Marcel. "O advogado que passa 24/7 pensando em direito, faturamento e clientes acaba não tendo tempo para se tornar uma pessoa mais culta, perspicaz e sábia. Cultura geral ajuda demais."

O que é criatividade?

A criatividade pode ser definida como a capacidade de gerar ideias, soluções ou inovações originais e úteis, conectando elementos de forma inédita.

Por exemplo, na psicologia, a criatividade é vista como a combinação de habilidades cognitivas e emocionais que permitem a resolução de problemas de maneira inovadora.

De maneira similar, nas artes ou na ciência, é entendida como a habilidade de criar algo novo e significativo. De acordo com o psicólogo existencialista Rollo May, "a criatividade é o processo de trazer algo realmente novo à realidade".

Em outras palavras, apesar das diferentes abordagens, um ponto comum é que a criatividade não é restrita a áreas específicas, mas pode ser aplicada em qualquer campo, seja na advocacia, nos negócios, na ciência ou no dia a dia. Assim, ela envolve tanto inspiração quanto esforço deliberado, sendo uma habilidade que pode ser desenvolvida e aprimorada com prática e exposição a novas experiências.

Os 5 elementos da criatividade

Os 5 elementos da criatividade são um modelo frequentemente associado ao trabalho de Teresa Amabile, psicóloga e pesquisadora da Universidade de Harvard. Amabile é reconhecida por seus estudos sobre criatividade e inovação, especialmente no ambiente organizacional. 

O conceito surge a partir de suas pesquisas na década de 1980 e é amplamente explorado em sua obra "The Social Psychology of Creativity" (1983). A ideia central é que a criatividade resulta da interação de cinco fatores principais:

  • Expertise
    Refere-se ao conhecimento e habilidades acumuladas em uma área específica. É a base técnica ou intelectual necessária para resolver problemas de maneira inovadora. Sem domínio de uma área, é difícil produzir soluções criativas.
  • Pensamento criativo
    É a capacidade de abordar problemas de maneira nova, original ou divergente. Inclui características como flexibilidade mental, capacidade de improvisação, curiosidade e tolerância ao risco.
  • Motivação intrínseca
    A motivação interna, ou o prazer de realizar uma atividade por si só, é um dos principais combustíveis da criatividade. Amabile destaca que, quando estamos genuinamente interessados em algo, tendemos a ser mais criativos do que quando somos movidos apenas por recompensas externas.
  • Influência social
    O ambiente e as interações sociais desempenham um papel crucial. Um ambiente que encoraja a colaboração, a troca de ideias e a experimentação ajuda a nutrir a criatividade. Por outro lado, um ambiente hostil ou muito controlador pode inibi-la.
  • Recursos disponíveis
    Ter acesso a ferramentas, tempo, dinheiro e outras condições práticas necessárias também impacta a capacidade de ser criativo. A ausência ou limitação de recursos pode restringir as possibilidades, embora às vezes, paradoxalmente, também estimule a criatividade como forma de superação.

Qual é o seu tipo de criatividade?

A criatividade é a capacidade de imaginar, criar e produzir algo novo. Você sabia que ela pode ser dividida em quatro tipos? Cada um reflete como a pessoa combina conhecimento, emoções e espontaneidade no processo criativo. Confira:

  • Deliberada e cognitiva
    Baseada em conhecimento e pesquisa. Pessoas assim estudam e planejam antes de criar, combinando informações de forma estratégica.
  • Deliberada e emocional
    Focada em sentimentos e reflexões. Aqui, a criação vem da introspecção e da conexão emocional com o projeto.
  • Espontânea e cognitiva
    Surge no ócio criativo, quando a mente relaxa. Essas pessoas precisam de pausas para ter ideias inesperadas.
  • Espontânea e emocional
    Depende de inspiração e não lida bem com pressão. Ideias surgem de repente, como em um momento de epifania.

Como estruturar processos criativos?

O processo criativo geralmente não acontece de uma hora para outra. Na verdade, ele exige organização e etapas claras para alcançar resultados eficientes. Portanto, conheça as cinco fases principais para estruturar sua criatividade:

  1. Preparação
    Começa com curiosidade e pesquisa. Identifique o problema, crie metas e organize suas ideias para clarear o ponto central.
  2. Amadurecimento
    Depois de processar as ideias, deixe-as evoluir naturalmente. Esse momento envolve reflexão e imaginação para começar a dar forma ao projeto.
  3. Iluminação
    É o "eureka" do processo, quando as ideias se conectam e fazem sentido. Esse insight pode surgir de maneira inesperada.
  4. Avaliação
    Revise o que funciona e descarte o que não agrega. Teste, peça opiniões e ajuste até chegar ao melhor resultado.
  5. Implementação
    É hora de colocar as ideias em prática e dar vida ao produto final, com espaço para ajustes durante o caminho.

Criatividade nos negócios da advocacia

A criatividade é uma competência indispensável para escritórios de advocacia e departamentos jurídicos, sobretudo em um cenário de constante transformação nos negócios. Confira como ela pode impulsionar resultados no mercado jurídico empresarial:

1. Soluções inovadoras

No mercado jurídico, a criatividade é, sem dúvida, sinônimo de inovação. Desenvolver estratégias diferenciadas para atender às demandas de clientes, especialmente em contextos de crise, pode ser, portanto, o fator decisivo para a fidelização e o sucesso de um escritório. Além disso, advogados criativos, por sua vez, tendem a apresentar soluções mais eficazes, que integram não apenas o aspecto legal, mas também uma visão estratégica de negócio.

2. Engajamento da equipe

Promover um ambiente colaborativo, no qual advogados e demais profissionais tenham a liberdade para sugerir ideias e desenvolver projetos, é, sem dúvida, uma forma eficaz de estimular a criatividade. Isso não apenas melhora a integração da equipe, mas também favorece, de maneira significativa, a criação de soluções mais completas e estratégicas, que atendem tanto às necessidades jurídicas quanto às comerciais dos clientes.

3. Aumento da produtividade

Estimular a criatividade no ambiente jurídico é, sem dúvida, investir na potencialização de talentos. Advogados mais engajados e motivados tendem a ser, consequentemente, mais produtivos e comprometidos com o resultado final. Isso reflete diretamente na qualidade do serviço prestado e, consequentemente, na satisfação dos clientes.

4. Redução de conflitos

Em um escritório ou departamento jurídico criativo, a comunicação aberta entre gestores e colaboradores desempenha um papel fundamental, pois permite identificar gargalos e falhas antes que se tornem problemas maiores. Além disso, essa prática não só contribui para um ambiente de trabalho mais harmônico, mas também fortalece a eficiência no atendimento ao cliente.

5. Preparação para o futuro

Com o avanço da inteligência artificial e a automação de processos repetitivos, o diferencial dos advogados será cada vez mais baseado nas habilidades humanas, como criatividade, pensamento estratégico e empatia. Escritórios que já promovem um ambiente criativo estão mais preparados para enfrentar os desafios de um mercado que exige inovação constante e soluções personalizadas.

Por isso, ao apostar na criatividade, escritórios de advocacia empresarial e áreas jurídicas corporativas não apenas se destacam no mercado, mas também constroem soluções mais eficazes e personalizadas, consolidando sua reputação e impulsionando o crescimento sustentável no setor jurídico.

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