Não é novidade que as organizações têm se empenhado cada vez mais em migrar suas atividades para o mundo digital. No caso dos escritórios de advocacia, segundo pesquisa realizada para a última edição do anuário ANÁLISE ADVOCACIA, 97,5% das bancas afirmam que os investimentos em tecnologia cresceram nos últimos dois anos. O investimento em tecnologia de 346 escritórios em 2021 correspondeu até 5% do faturamento do ano anterior.
Já no caso dos departamentos jurídicos, de acordo com dados da última edição do anuário ANÁLISE EXECUTIVOS JURÍDICOS E FINANCEIROS, 70% dos departamentos jurídicos afirmam que os investimentos em tecnologia cresceram nos últimos dois anos. O investimento em tecnologia corresponde até 10% do orçamento do departamento jurídico deste ano.
Dessa forma, é possível afirmar que a tecnologia ajuda a potencializar a produtividade dos escritórios e os departamentos jurídicos, tornando a automação jurídica cada vez mais implementada. O processo consiste em otimizar os processos do trabalho de forma automatizada com ajuda de softwares especializados.
Ações mais estratégicas
No mundo jurídico, a maior rapidez em lidar com a "papelada" pode resultar em ganho de clientes e, por sua vez, crescimento dos escritórios de advocacia ou departamentos jurídicos. Para além da possibilidade de concentração de grandes conteúdos em pequenos dispositivos, antes distribuídos em pilhas de papel, há que se ressaltar principalmente a maior praticidade conferida às atividades cotidianas da profissão.
Nesse sentido, o professor e advogado especialista em Direito Digital e Software, Rodrigo Rebouças, explica que antigamente os processos eram todos físicos, sendo necessário que o estagiário ou até mesmo o advogado percorressem longas distâncias para manuseá-los, algo que hoje se faz com um simples clique. Com a automação jurídica, é possível ter tempo para o essencial: advogar!
Além da digitalização da "papelada", há softwares atuais que ajudam profissionais do direito no tocante às suas teses processuais. A ciência de dados e a jurimetria são caminhos indicados para quem deseja ter sucesso em causas judiciais. Contudo, o especialista alerta que a mera adoção da automação jurídica não garantirá bons resultados se você não estudar sua viabilidade financeira e, principalmente, definir as metas e objetivos que estarão por trás dessa implementação.
Quando implementar?
Primeiramente, antes de implementar a automação jurídica é necessário se atentar ao público-alvo do escritório ou organização. Instalar um "chatbot" - robô que atende clientes por telefone ou chat quando os profissionais não estão disponíveis - pode fazer sentido quando seus clientes são, por exemplo, empresas de tecnologia ou profissionais familiarizados com ferramentas digitais.
No entanto, mesmo estando apenas no começo da relação do Direito e Inteligência Artificial, Rebouças aponta três passos importantes para quem deseja começar a investir na automação jurídica, sendo eles:
- Refletir sobre o propósito desse investimento. É necessário entender como a automação jurídica irá ajudar a empresa a prestar o melhor serviço possível ao cliente. Para isso, é fundamental realizar uma análise inicial dos processos internos, que aponte o que precisa ser melhorado, bem como o que o cliente espera e o que ele procura do serviço prestado ou produto oferecido;
- Começar aos poucos! Se na empresa não houver profissionais com expertise suficiente em tecnologia ou gestão de projetos, buscar uma assessoria especializada. Para escolher, é interessante levantar depoimentos de antigos e/ou atuais clientes, além de cases realizados pela equipe;
- Considerar o tamanho e o potencial financeiro da empresa. Isso porque, no caso dos escritórios de advocacia, por exemplo, algumas ferramentas fazem mais sentido em boutiques do que em escritórios maiores. Avaliar a funcionalidade da automação dentro do cenário atual da empresa é essencial.
O escritório Urbano Vitalino Advogados, de Recife (PE), seguiu esses três passos e hoje se posiciona como o primeiro do Brasil a fazer uso da inteligência artificial para realizar tarefas consideradas repetitivas e mecânicas. Inicialmente, o objetivo da banca era de concluir processos na justiça com mais eficiência e maior índice de vitória. A tecnologia foi apelidada de Carol.
Carol, a "advogada robô"
Há cinco anos, o Urbano Vitalino, escritório eleito nove vezes Mais Admirado pelo anuário ANÁLISE ADVOCACIA, inseriu em seu sistema interno a plataforma Watson, software desenvolvido pela International Business Machines Corporation (IBM), empresa líder em soluções tecnológicas.
Essa tecnologia aumentou a produtividade e eficiência da firma em processos, e ganhou uma voz feminina chamada de Carol, mais conhecida como "advogada robô". Em um primeiro momento, o software atuava apenas no cadastro de novas demandas do escritório, algo que soa simples. Contudo, segundo o IBM, o índice de acerto humano nesse tipo de tarefa gira em torno de 75%. Com a implementação da Carol, o Urbano Vitalino atingiu a casa dos 95% de acerto.
Sem a Carol, os profissionais precisariam ler documentos muito extensos repetidamente ou criar agendas complexas para não cometer erros ou esquecer datas importantes. Além disso, o robô trabalha com jurimetria e análises preditivas. São técnicas de análise e cruzamento de dados feitas pelo software para evidenciar como magistrados de determinados tribunais sentenciam a respeito de um tema. De acordo com o sócio-diretor do escritório, Christiano Sobral, a técnica é muito precisa.
A partir dessa previsão, os advogados do escritório conseguem comunicar aos seus clientes sobre o melhor caminho em um processo, como firmar acordos ou prosseguir com a ação.
Além disso, a "robô advogada" foi treinada pela equipe do escritório para estruturar peças processuais mais elaboradas e até recursos. Para prepara-los, Carol precisaria entender as decisões judiciais anteriores. Empolgado, Sobral diz que a precisão do software no entendimento das decisões chegou aos 90%.
Sobral conta que o documento chega "pré-pronto" para o advogado, com marcações em amarelo que sinalizam o que deve ser verificado e, se houver necessidade, alterado pelo próprio profissional. De acordo com o sócio, todo esse pacote tecnológico moderno permite aos advogados da equipe acompanharem mais processos em menos tempo. Isso, por consequência, se reverte em captação de novos clientes.
Com mais de 200 mil processos sob seu guarda-chuva, o Urbano Vitalino tem milhões de prazos que devem ser cumpridos mensalmente. Contudo, não foram revelados os valores totais de investimento do escritório em suas plataformas de inteligência artificial durante a entrevista.