O ano de 2020 foi marcado pela incerteza. A pandemia causada pelo novo coronavírus pegou a todos os setores de surpresa, principalmente os da saúde, economia e o mercado de trabalho em geral. Com a queda nas relações trabalhistas, tanto contratantes quanto colaboradores passaram a viver com medo e insegurança no âmbito profissional, aguardando por notícias que pudessem reverter o quadro gerado pela crise, como o desenvolvimento de vacinas contra a Covid-19.
Já pensando em 2021, o mundo corporativo está esperançoso: no final do ano passado, a Análise Editorial realizou uma enquete sobre as perspectivas trabalhistas para este ano com mais de 250 participantes, entre empresas e escritórios de advocacia. Na amostra das companhias, 48% afirmaram que o primeiro trimestre deste ano será parecido com o final do último, e que o início da vacinação fará com que a atividade econômica aumente e o desemprego passe a cair a partir da metade de 2021; mais da metade das bancas advocatícias pensa o mesmo. Para entender melhor este movimento, a Análise Editorial conversou com duas profissionais da área de RH, especializadas no mercado jurídico, que possuem experiência para avaliar como ele poderá se comportar neste ano, além de orientar profissionalmente advogados de departamentos jurídicos e de escritórios: Maria Eduarda Silveira, fundadora da Bold HR e Renata Maiorino, diretora de Desenvolvimento Humano do escritório Mattos Filho Advogados.
Maria Eduarda possui mais de dez anos de experiência como headhunter, recrutando para as áreas jurídica, relações governamentais e legal tech. Em novembro do ano passado, fundou a Bold HR, empresa de recrutamento focada em inteligência de dados que seleciona profissionais para as áreas de tax, compliance, finanças e recursos humanos, além das previamente citadas. Dispondo de plataformas de inteligência artificial para otimizar processos na organização, ela comenta que os mundos jurídico e corporativo atuais requerem a união da tecnologia com a capacidade humana de aplicar conhecimento, fortalecendo o relacionamento e gerando valor para clientes e candidatos.
Já Renata, que começou sua carreira como publicitária e migrou para a área de recursos humanos, acumula mais de dez anos de história dentro do Mattos Filho Advogados. Tendo começado no escritório como coordenadora, evoluiu gradualmente dentro do setor, passando pelo cargo de gerente e chegando ao de diretora. Ela destaca a importância da capacidade de humanização que a área de RH possui, transformando profissionais e auxiliando no crescimento da empresa como um todo. A banca da qual faz parte é um exemplo disso: ela relata que, ao longo de sua trajetória, viu o Mattos Filho Advogados se tornar líder em diversos setores e colecionar admirações no anuário Análise Advocacia.
Tendências gerais de contratação para 2021
Na opinião de ambas as profissionais, tanto o mercado de trabalho geral quanto o jurídico começaram a se reaquecer um pouco no segundo semestre de 2020 e continuarão neste processo em 2021. Maria Eduarda explica que isso aconteceu porque muitos empregadores seguraram contratações no primeiro semestre do ano passado e, a partir do segundo, fizeram reajustes nos contratos trabalhistas, como adaptações para o home office, movimentando as vagas paradas. Na ala corporativa, ela destaca os setores de agronegócio, saúde, varejo, tecnologia, startups e logística, este último sendo o que moveu o país durante a pandemia e que continuará forte neste ano. Já em escritórios de advocacia, o que está em alta são as áreas transacionais, como Societário, Project Finance e M&A, tendo em vista que o investidor estrangeiro está voltando a olhar para mercados emergentes, como o do Brasil.
Renata argumenta que o mercado jurídico não foi drasticamente afetado, estando sempre mais aquecido que os outros. Pensando em áreas que se destacaram nos escritórios de advocacia durante 2020, ela ressalta o Direito Trabalhista, IPO e M&A, indicando que elas continuem com alta demanda em 2021. Para a diretora, as oportunidades congeladas do ano passado podem aparecer com um modelo de trabalho readaptado agora, já que a pandemia difundiu o home office como uma prática comum e efetiva para a rotina trabalhista. Considerando o cenário das bancas jurídicas, ela relata que diversas áreas do Direito estão com muitas vagas e que os escritórios acompanham o movimento gradual de reaquecimento das empresas: quanto mais demandas elas têm, mais oportunidades de trabalho surgem para os prestadores de serviço.
LGPD
Com a implementação da Lei Geral de Proteção de Dados no Brasil, em setembro do ano passado, as empresas e escritórios de advocacia precisaram se adaptar à nova realidade do funcionamento de processamento de dados. As profissionais comentam que, por se tratar de uma área muito nova e que ainda será aprimorada, a LGPD é um oceano de oportunidades para a carreira jurídica, sendo um foco de trabalho e contratações. A dica é buscar conhecimento específico relacionado à área, visto que é preciso estudo para conseguir dialogar com um campo novo de trabalho. Isso permitirá um atendimento mais completo aos clientes já existentes e facilitará na prospecção de novos, considerando que essa demanda nunca deixará de ser importante para contratantes e contratados, não importando se são de grande, médio ou pequeno porte.
Direito Digital e Tecnologia
Durante a produção do anuário Análise Advocacia, os executivos participantes podem declarar quais áreas do Direito consideram como promissoras para o próximo ano. Na última edição da revista, quase 60% dos respondentes apontaram o Direito Digital como a especialidade que deve gerar mais demandas na contratação de serviços advocatícios em 2021, seguido por Compliance (23%) e Tributário (18%). Renata comenta que o movimento é transformacional e que o Direito Digital é uma prática que já está influenciando a área corporativa, fazendo com que as empresas busquem profissionais com conhecimentos no assunto e evidenciando que o momento atual é o de maior relevância da área. Na mesma linha, Maria Eduarda ressalta que 2021 será um ano de grande avanço para o Direito Digital, gerando formações específicas e muitas oportunidades relacionadas ao tema. Ela explica que as pessoas estão olhando com mais atenção para políticas de privacidade nos sites, fazendo com que a população se conscientize sobre segurança de dados. Para a headhunter, quem encabeça essa transformação social são os advogados, e por isso as oportunidades na área irão aparecer de forma crescente.
A tecnologia também é cada vez mais presente no mundo jurídico. Através de softwares inovadores e robôs com inteligência artificial, as tarefas mais burocráticas e operacionais de departamentos jurídicos e escritórios podem ser realizadas de maneira automática, poupando o tempo dos advogados e evitando a necessidade de contratações extras para realizar esse tipo de demanda. Renata enfatiza que isso é um avanço: quanto menos trabalho manual e repetitivo um advogado precisar fazer, mais tempo ele terá para se dedicar às questões estratégicas de uma operação, entregando resultados melhores para o cliente e explorando o melhor da relação humano e máquina. Maria Eduarda também destaca o caráter estratégico que o profissional jurídico precisa ter hoje, especialmente em empresas: além do conhecimento legislativo, é necessário entender de finanças, negócios e funcionamento comercial, sendo um parceiro de business para a organização, que vá além das questões jurídicas. Na advocacia moderna, o advogado não será substituído por inteligências artificiais, mas trabalhará em parceria com elas.
Dicas gerais para se destacar no mercado jurídico
Pedimos para que as entrevistadas listassem quais fatores valorizam em um profissional diante do disputado mercado jurídico que, apesar de concorrido, também é muito vasto nos tipos de oportunidade. As principais dicas foram:
- Nunca deixar de se atualizar, seja acadêmica ou profissionalmente;
- Buscar conhecimento em outras áreas do Direito;
- Especializar-se na área de Novos Negócios e adquirir habilidades negociais;
- Aprofundar-se na área de Dados e Tecnologia, pois ela influencia todas as outras;
- Valorizar as chamadas soft skills, habilidades comportamentais que auxiliam o prestador de serviço a atender diferentes tipos de negócios e clientes;
- Entender que advogar não se resume apenas a fazer Direito: é necessário entender os variados perfis dos clientes, buscando aprimorar habilidades relacionais e comunicativas, indo além da capacidade técnica e conseguindo dialogar com diversas frentes;
- Investir na capacidade de ser flexível e adaptável, pois o pós-pandemia exigirá isso dos profissionais.
A advocacia é um universo muito plural. Confira também como profissionais renomados do mercado jurídico realizaram mudanças na carreira, oscilando entre escritórios, departamentos jurídicos e até mesmo conselhos de administração.