ESG em baixa: Especialistas analisam mudança no mercado | Análise
Análise

ESG em baixa: Especialistas analisam mudança no mercado

Sócios do TozziniFreire, Lefosse e Sahione Pugliese Advogados, além do diretor de compliance da Eldorado Brasil, analisam se o ESG está em um momento de queda ou de estabilidade

14 de February 10h30

O interesse pelo ESG entre executivos jurídicos, financeiros e de compliance caiu significativamente para 2025, de acordo com a nova edição do anuário ANÁLISE ADVOCACIA. Desde 2017, o levantamento mede quais áreas devem ter maior demanda no ano seguinte, segundo a percepção do mercado.

Na edição anterior, 15% dos entrevistados apontaram o ESG como uma das áreas mais promissoras, garantindo-lhe a quinta posição no ranking de demandas. Agora, esse número despencou para apenas 6%, uma queda de 60%, sinalizando uma possível mudança de prioridade nas empresas.

Gráfico extraído da página 26 do anuário Análise Advocacia 2025

O que explica essa queda?

Para Alexei Bonamin, sócio de ESG do TozziniFreire Advogados, a redução do interesse na área é resultado da natureza cíclica do mercado e do crescente investimento em inteligência artificial. Além disso, a menor cobrança por parte dos investidores em relação à sustentabilidade tem desviado o foco das empresas dessas iniciativas. Ele também aponta as mudanças nas políticas internacionais, especialmente nos Estados Unidos, como um fator determinante.

"É importante ressaltar que as recentes dinâmicas no cenário político e econômico, incluindo a adoção de posturas contrárias à agenda ambiental e à promoção da diversidade pela nova administração do governo dos Estados Unidos, impactam o interesse em questões relacionadas ao ESG. Essas movimentações não apenas moldam a percepção pública e a aceitação das práticas sustentáveis, como também podem afetar a forma como as empresas priorizam e implementam tais iniciativas", explicou Alexei.

Yuri Sahione Pugliese, managing partner do Sahione Pugliese Advogados, reforça essa visão, destacando que já se observam os impactos da pressão norte-americana, especialmente no novo mandato de Donald Trump, sobre a agenda ESG.

Na área ambiental, segundo Yuri, houve um retrocesso na descarbonização, com empresas optando por fontes de energia mais poluentes, embora a consultoria ambiental tenha se mantido estável. No aspecto social, pautas de diversidade e inclusão foram afetadas, comprometendo processos de diligência que antes eram exigidos de grandes multinacionais e seus fornecedores. Já na governança, o impacto é menor, pois reguladores como a CVM e o IBGC seguem ditando boas práticas no mercado brasileiro.

"Houve uma pressão para a redução desse tipo de demanda vinda dos EUA. Como a adequação à pauta ESG está associada a grandes empresas, fundos de private equity e outros players institucionais, quando os EUA sinalizam que essa pauta não é mais prioritária, há uma pressão natural para que ela retroceda. Consequentemente, esses players acabam reduzindo a demanda", pontuou Yuri.

Há discordâncias sobre a queda de interesse

Para Adriana Dantas, head da prática de compliance e investigações do Lefosse e Mais Admirada no anuário ANÁLISE ADVOCACIA, a percepção de queda na demanda por ESG não se confirma na prática. "Na prática, ainda noto bastante interesse. Inclusive, tenho visto muitas publicações no LinkedIn sobre profissionais de compliance migrando para ESG. No meu portfólio de casos e clientes, o interesse continua evidente."

Segundo Adriana, diversas regulamentações e exigências continuam impulsionando as empresas multinacionais a manterem suas iniciativas na área. Ela destaca que a Diretiva de Due Diligence de Sustentabilidade Corporativa da União Europeia tem levado muitas companhias a se adequarem às novas exigências, especialmente nos setores agropecuário e farmacêutico, além de operações francesas em território nacional.

"O alinhamento com o ESG continua, e temos vários clientes que ingressaram nessa agenda. Muitas iniciativas seguem em andamento, e as vagas nos conselhos de administração voltadas para ESG ainda permanecem. Na prática, não percebo um aumento, mas também não noto uma diminuição relevante nas demandas", destacou Adriana.

A visão dos executivos sobre o ESG

André Tourinho, head de compliance e auditoria interna da Eldorado Brasil, empresa produtora de celulose de eucalipto e geradora de energia renovável, compartilha da visão de Adriana Dantas. Para ele, o interesse das empresas pelo ESG não diminuiu, mas o foco das companhias passou por uma mudança natural.

O executivo ressalta que as empresas estão cada vez mais conscientes dos benefícios das práticas ESG, que vão além da responsabilidade socioambiental. Ele destaca que essas iniciativas favorecem a retenção de talentos, fortalecem a imagem corporativa, proporcionam vantagens competitivas e facilitam o acesso a melhores condições de crédito. Por isso, ESG segue sendo um tema estratégico para os negócios.

Sobre os impactos das políticas de Trump na agenda ESG, André adota um tom mais cauteloso. "Ainda é cedo para medir os efeitos das recentes declarações do governo dos Estados Unidos. O mercado está atento às movimentações norte-americanas, mas quero acreditar que os avanços internacionais em ESG e compliance não serão facilmente revertidos. Há diversos players globais, como a ONU, que seguem influenciando a manutenção das boas práticas de governança corporativa", concluiu.

Qual é o momento do ESG no mercado?

Para Adriana Dantas, o ESG segue um caminho de consolidação. Ela acredita que as empresas continuarão cumprindo normas ambientais para evitar penalizações, como multas da Comunidade Europeia. Embora, em tempos de crise, as demandas comerciais ganhem prioridade, isso não significa que os avanços em ESG serão descartados.

Yuri Sahione Pugliese compartilha da visão de estabilidade, mas enxerga uma possível tendência de queda, associada ao fim abrupto da Operação Lava Jato. Segundo ele, a operação não teve um encerramento gradual, o que impediu um desfecho adequado dos riscos e dos acordos de leniência. Como consequência, muitas empresas relaxaram seus controles internos. Hoje, o foco está em questões comportamentais, investigações de executivos, fusões, aquisições e gestão reputacional, enquanto algumas práticas essenciais foram deixadas de lado.

Já André Tourinho adota um tom mais otimista e vê espaço para crescimento da área. "Eu diria que o momento do ESG no mercado ainda é muito próspero. Legislações europeias estão sendo discutidas internacionalmente, buscando um objetivo comum: dar uma resposta concreta à crise climática global. As agendas de sustentabilidade e redução de emissões de gases de efeito estufa seguem em pauta. Ética e integridade nos negócios continuam sendo de interesse, promovendo práticas comerciais mais justas e sustentáveis. Esse é o futuro que devemos buscar, caso contrário, futuro não haverá", concluiu o executivo.

O que é ESG?

ESG é a sigla em inglês para Environmental, Social and Governance (Ambiental, Social e Governança, em português). Trata-se de um conjunto de critérios usados para avaliar a responsabilidade e sustentabilidade das empresas dentro de três pilares:

  • Ambiental (E - Environmental): Refere-se ao impacto das empresas no meio ambiente, incluindo práticas de descarbonização, uso eficiente de recursos naturais, gestão de resíduos, controle de poluição e políticas de combate às mudanças climáticas.
  • Social (S - Social): Diz respeito à forma como a empresa lida com seus colaboradores, clientes, fornecedores e a comunidade em geral. Inclui pautas como diversidade e inclusão, condições de trabalho, direitos humanos, privacidade de dados e impacto social das operações da empresa.
  • Governança (G - Governance): Relaciona-se à estrutura de liderança da empresa, abrangendo transparência, ética nos negócios, políticas anticorrupção, composição do conselho administrativo e cumprimento de regulamentações.

Ao implementar essas práticas, a empresa demonstra a investidores, consumidores e órgãos reguladores que sua preocupação vai além do lucro, priorizando também a sustentabilidade e a ética empresarial.

Por que implementar o ESG nas empresas?

Segundo Alexei Bonamin, a adoção de práticas ESG é mais do que uma tendência, é uma estratégia essencial para a longevidade dos negócios. Além de contribuir para o desenvolvimento sustentável e a melhoria das condições sociais e ambientais, o ESG fortalece a posição da empresa no mercado.

Ele explica que a incorporação de critérios ESG pode facilitar o acesso ao capital, já que muitas instituições financeiras utilizam esses parâmetros em suas avaliações de risco. Além disso, permite que as empresas antecipem e mitiguem riscos ambientais, sociais e regulatórios, evitando penalidades legais e danos à reputação. Em um cenário de crescente fiscalização e exigência por parte dos investidores, implementar ESG se tornou um diferencial competitivo para as empresas que buscam solidez e relevância no mercado.

Adriana DantasAlexei BonaminAnálise Advocacia 2025André TourinhoEldorado BrasilLefosseSahione Pugliese AdvogadosTozziniFreire AdvogadosYuri Sahione Pugliese