Pressão por resultados. Alta carga de estresse. Muita competitividade. Ambiente pouco acolhedor. Se eu não descrevi o seu local de trabalho, você tem sorte. Infelizmente, para 67% dos nossos colegas a influencia negativa no ambiente de trabalho é movida pelo estresse e poderíamos estar descrevendo a empresa onde eles atuam. Esse percentual está um pouco acima da média global (de 65%), encomendada[1] pelo relatório People at Work 2023: A Global Workforce View, do ADP Research Institute.
Ao aprofundar-se na pesquisa, os dados não melhoram. O mesmo estudo aponta que a gestão imediata não está pronta para falar de saúde mental - cerca de 57% acreditam que seriam julgados pelos gestores caso entrassem no assunto. E a pergunta que sempre se faz é: é esse o mundo do trabalho que gostaríamos de deixar como o nosso legado? Que herança zero sustentável para as próximas gerações seria essa?
Tudo bem que muitas vezes somos obrigados a tomar decisões coletivas não compreensíveis. Em muitas situações, precisamos executar uma estratégia "parte de algo maior" e sequer temos acesso ao racional da decisão. Em um mundo altamente competitivo, onde um produto ou serviço inovador é lançado todos os dias, todo o cuidado é pouco. Assim, só saberemos a importância de determinados movimentos no tabuleiro de xadrez muitas rodadas após mexermos na peça.
Com a chegada da Inteligência Artificial na nossa rotina, a disputa ficou ainda mais acirrada. Segundo o cofundador da Oracle Larry Ellison[2], os costumes também irão evoluir. Se você reclama do perfil microgerenciador de um determinado colega, saiba que o monitoramento será ainda maior - e isso se dará para evitar problemas de segurança e garantir bom comportamento. A população pode realmente viver em um verdadeiro Show de Truman, dentro ou fora do trabalho.
Perceba como estamos caprichando na arte de tornar o ambiente de trabalho ainda mais ansioso, estressante e desafiador. A equação "inovações disruptivas + acelerada mudança nos costumes + insegurança extrema + incerteza de carreira" deixa qualquer um a beira dos nervos.
Portanto, a preocupação da população com a saúde mental vem aumentando de forma avassaladora - 79% dos entrevistados por uma plataforma de contratação[3]dizem que preferem priorizar o bem-estar no trabalho a uma promoção (43%) ou aumento salarial (36%). A maioria quer paz.
Tais fatos refletem diretamente na estratégia de retenção, atração e desenvolvimento de talentos. No mundo jurídico não seria diferente. Abaixo, compartilho dicas simples que você pode implementar no time, que não custa absolutamente nada e pode ajudar no desenvolvimento dessa importante agenda:
· Reflita sobre a estratégia do bem-estar emocional e psicológico do seu time. Se há muitas prioridades e urgências, o cliente precisa respeitar os processos pré-acordados. Você, gestor, não adianta receber o pedido de prioridade e repassar ao time - muitas vezes é necessário sustentar e apoiar sua equipe.
· Entenda quais são os benefícios disponíveis para suporte à saúde mental ao seu time, o percentual de uso e incentive a manutenção da segurança psicológica.
· Promova pesquisas confidenciais voltadas para a cultura do respeito e do senso de engajamento coletivo. Se falta proatividade é porque também o ambiente pode não estar sendo convidativo a isso.
· Dialogue com as pessoas e veja se há respeito entre o tempo de trabalho e o de lazer/descanso. Para este ponto em específico, a coragem se faz necessária ao líder no comando. Você, membro da alta liderança... Está exigindo um resultado compatível à estrutura e tamanho do time que possui? Ou é perceptível que as pessoas estão trabalhando após o horário e inclusive nos finais de semana para entregar?
· Qual é o exemplo que você está dando quando o assunto é descansar e aproveitar a vida?
Quem está no topo não só dá exemplos pela ação. Também dá pela omissão. O incentivo a práticas saudáveis precisa vir pelas atitudes, pelo gesto, pela escolha certa das palavras e pelas iniciativas práticas em torno de um ambiente de trabalho mais acolhedor e humano. Aproveite o Setembro amarelo para começar. O que importa é sair da inércia.
Falando especificamente sobre o Setembro amarelo, aqui cabe um parêntese. Se nada do que você faz é perfeito, se a gestão não demonstra generosidade para dialogar e construir consensos ou se com as suas entregas você se sente desprestigiado... Talvez o problema não esteja em você. É um padrão da natureza humana sermos muito mais rigorosos com a gente mesmo... Exerça o autoconhecimento e busque entender se a sua gestão tem sido humanizada e acolhedora o suficiente para te estimular à melhoria contínua. Novamente... Talvez o problema não esteja em você. Priorize sua saúde mental e, no menor sinal de colapso, desmotivação, melancolia ou autodepreciação, busque ajuda médica e psicológica. Fale com a área de saúde ocupacional da sua empresa, se houver uma.
Dar um passo além para a promoção de um local de trabalho psicologicamente saudável, pensando em ações individuais e coletivas que os gestores e os liderados podem adotar de forma prática é algo essencial para construir o futuro do trabalho que a gente quer. A era da humanização - ventilada pela 5ª Revolução Industrial - já começou. E só vamos conseguir realmente defender essa ideia no nosso setor com o que chamamos de Jurídico 5.0[4] com o apoio principalmente daqueles que tem o poder de decidir e podem fazer a diferença não somente no futuro, mas principalmente no presente... A partir de hoje.
[1] https://www.cnnbrasil.com.br/economia/financas/estresse-no-trabalho-afeta-67-dos-brasileiros-aponta-estudo/
[2] https://arstechnica.com/information-technology/2024/09/omnipresent-ai-cameras-will-ensure-good-behavior-says-larry-ellison/
[3] https://forbes.com.br/carreira/2024/09/saude-mental-em-primeiro-lugar-profissionais-priorizam-bem-estar-ao-salario/
[4] https://www.jota.info/artigos/o-que-significa-juridico-5-0
Paulo Samico líder na ACC Brasil, LinkedIn Top Voice e Idealizador e Coordenador do livro "Jurídico 5.0 e Organizações Exponenciais".
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