ZPEs sustentáveis: como a nova MP impacta a demanda jurídica | Análise
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ZPEs sustentáveis: como a nova MP impacta a demanda jurídica

Com foco ambiental mais rígido, a medida provisória pode trazer desafios jurídicos para empresas que começam a atuar nas áreas de exportação

1 de August 6h50

No dia 21 de julho, o governo publicou a MP 1.307/2025, que altera a legislação sobre as Zonas de Processamento de Exportação (ZPEs). Essas são áreas que possuem um tratamento tributário que visa estimular a instalação de empresas produtoras de bens e serviços, com foco no mercado externo. Atualmente, existem 17 ZPEs localizadas em 16 estados brasileiros.

O objetivo da medida é trazer mais investimentos para essas áreas. Com isso, a meta é estimular o desenvolvimento da exportação de serviços, para trazer mais igualdade entre empresas de bens e serviços e, com isso, fortalecer toda a economia exportadora brasileira.

Contudo, o ponto que mais chamou a atenção foi o incentivo à sustentabilidade que a nova MP traz. Todas as empresas que começarem a operar após a data da publicação da medida, incluindo data centers, deverão usar energia elétrica de fontes renováveis. Vale frisar que ela não se aplica à geração de energia para consumo próprio dentro da respectiva ZPE.

Os impactos da MP nas demandas jurídicas

De acordo com Cynthia de Souza Cardoso, advogada da área ambiental do Ciari Moreira Advogados, embora seja possível enxergar um impacto financeiro imediato, a longo prazo pode ocorrer uma diminuição dos custos. Além disso, é possível ter mais agilidade e ganhos decorrentes da transição energética, sem esquecer das exceções estabelecidas na própria medida.

"Os maiores impactos recairão sobre o mecanismo de incentivo às energias limpas e os consequentes desafios logísticos, segurança e garantia de fornecimento dos sistemas e logística. Essa exigência deve ser incorporada à análise de viabilidade dos projetos", declara Cardoso.

Além disso, com essa nova medida, também haverá uma exigência maior de comprovação documental de que as empresas estão cumprindo as exigências. Com isso, também haverá a atualização das bases contratuais dos fornecedores de energia. É exatamente nesse ponto que Mariella Rocha, advogada e head societária que atua na área de contratos do Fonseca Brasil, aborda. Segundo ela, a exigência de 100% de energia renovável traz um novo paradigma de contratos de fornecimento de energia para empresas localizadas na ZPE.

"O principal impacto jurídico reside na necessidade de recalibração e renegociação de contratos existentes (para empresas que, de alguma forma, possam ser impactadas pela transição ou que busquem se adequar para aproveitar futuros benefícios) e, mais criticamente, na inclusão de cláusulas relevantes para os novos empreendimentos", afirma Mariella.

Foco nas letras miúdas

Para Cynthia, a modelagem contratual vai depender da análise do caso concreto, levando em conta tanto o projeto quanto o perfil da empresa. Neste processo, a equipe da empresa, ou escritório, deve analisar os riscos regulatórios e o impacto do licenciamento ambiental. Essa última parte se deve por conta da utilização de matriz energética limpa cuja fonte, caso ainda não esteja operante, ou seja, com o licenciamento ambiental possivelmente ainda não concluído.

Consumo próprio e energia contratada

Mariella afirma que é crucial distinguir o que se considera consumo próprio dentro da ZPE e a energia contratada, pois a falta de clareza na MP e em sua regulamentação pode gerar dificuldades regulatórias e contenciosas. A advogada do Fonseca Brasil diz que o setor elétrico possui conceitos de autoprodução e autoconsumo, que devem ser claros dentro das regulações da medida. 

"Se a intenção da MP é dispensar a exigência de energia renovável para a energia gerada e consumida no mesmo local, isso é compreensível. No entanto, se o ‘consumo próprio’ abranger energia gerada por um parceiro ou em outro local, mas sob a rubrica de ‘autoprodução remota’, a fiscalização da origem renovável se torna essencial", afirma Mariella.

Com isso, disputas poderiam surgir sobre a interpretação da expressão, principalmente no caso de empreendimentos sendo acusados de não cumprir a exigência. A advogada diz que isso demandaria uma análise das cadeias de suprimentos de energia, contratos e sistemas de medição. Contudo, ela complementa com o que é realmente essencial para atender a essa demanda jurídica.

Como se preparar para os efeitos da MP?

Com a nova medida, é preciso que os escritórios de advocacia e empresas se preparem adequadamente para cumprir com as novas exigências do governo. Segundo Cynthia, o acompanhamento do trâmite processual de iniciativas estratégicas deveria ser praxe das empresas, mas nem todos os segmentos se organizam adequadamente para fazê-lo.

"Como ainda há tempo hábil para ajustes à iniciativa do executivo, este é o momento de mobilizar as consultorias jurídicas especializadas para verificar a necessidade de eventuais ajustes ao texto", conclui a advogada do Ciari Moreira Advogados.

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