O ministro do Trabalho e Emprego, Luiz Marinho oficializou na última semana o adiamento da entrada em vigor da Norma Regulamentadora nº 1 (NR-1). A atualização trouxe pela primeira vez a inclusão dos fatores de risco à saúde mental dos colaboradores nas empresas. Com isso, a norma, que passaria a valer em 26 de maio de 2025, foi postergada para 26 de maio de 2026. O objetivo é oferecer um período maior de adaptação às companhias, sem precisar alterar o texto normativo.
O que realmente muda?
Para Jorge Gonzaga Matsumoto, sócio da área trabalhista do Bichara Advogados, o adiamento resulta em poucas alterações para as empresas de fato. Segundo ele, a principal mudança já ocorreu na redação da norma, que agora exige que o Programa de Gerenciamento de Riscos (PGR) das companhias contemple fatores como estresse ocupacional crônico, síndrome de burnout, assédio moral, sobrecarga mental, isolamento social, hiperconectividade e outros riscos relacionados à organização do trabalho.
Dados do Ministério do Trabalho e Emprego mostram que, em abril de 2024, foram registrados 724.228 acidentes de trabalho. Desses, 74,3% foram acidentes típicos e 24,6% de trajeto. Apenas 1% relacionados a doenças ocupacionais — o que evidencia a dificuldade em reconhecer enfermidades ligadas ao ambiente laboral.
Bruno Freire e Silva, sócio do Bruno Freire Advogados, reforça que o adiamento não suspende a responsabilidade civil e trabalhista do empregador. Segundo ele, as empresas continuam obrigadas a adotar medidas de prevenção previstas em lei, já que acidentes, doenças ocupacionais e adoecimento mental seguem gerando passivos imediatos. "O que muda, decerto é a possibilidade de autuação específica pelo descumprimento da nova redação da NR-1. Mas, mesmo nesse período educativo e orientativo, as companhias precisam avançar no sentido de proteger a saúde dos trabalhadores", afirma.
Tendências de saúde mental
Segundo dados do Ministério da Previdência Social, somente em 2024 foram registrados mais de 440 mil afastamentos decorrentes de transtornos mentais e comportamentais. A ansiedade lidera as estatísticas, com 141.414 casos, seguida por episódios depressivos (113.604) e transtorno depressivo recorrente (52.627).
Para Arnaldo Pipek, advogado trabalhista e sócio-fundador do Pipek Advogados, o aspecto fático terá fundamento legal baseado na responsabilidade do empregador pela não adoção das medidas previstas em lei para a mitigação dos riscos psicossociais existentes no ambiente laboral.
Medidas preventivas
A partir de março de 2026, quando a norma entrar em vigor, o descumprimento da NR-1 já poderá gerar penalidades administrativas, civis e até criminais. Entre as sanções previstas, os auditores fiscais poderão aplicar multas que variam de acordo com a gravidade da infração, o porte da companhia e a quantidade de colaboradores, podendo superar R$ 6 mil.
Além disso, caso a situação seja considerada risco iminente à saúde e segurança dos trabalhadores, o MTE poderá embargar obras de forma total ou parcial, bem como interditar atividades, máquinas ou equipamentos até a correção das irregularidades. Se o descumprimento causar danos de qualquer natureza aos empregados, a Justiça poderá responsabilizar a empresa e obrigá-la a pagar indenizações. Em casos mais graves, como acidentes fatais ou com sequelas permanentes, pode haver responsabilização criminal dos gestores envolvidos.
Bruno Freire afirma que, para evitar cenários como esses, as políticas internas precisam ser concretas e bem estruturadas. Para isso, é essencial manter documentação e registros claros, para identificar perigos, avaliar riscos, e aplicar medidas de controle, além da garantia da implementação de programas de apoio psicológico e monitoramento frequente.
O sócio do Bruno Freire Advogados enfatiza que essa atuação deve ser estendida também a treinamentos, consultas aos trabalhadores e atualizações periódicas. Além disso, é fundamental implementar políticas contra assédio, planos emergenciais e canais de denúncia, de modo a assegurar segurança no exercício das atividades, criando assim um ambiente de cuidado e um conjunto probatório robusto.
Os resultados para a saúde mental
Na visão de Jorge Gonzaga Matsumoto, antecipar o cumprimento da NR-1 por meio de iniciativas voluntárias inspiradas em boas práticas internacionais pode transformar a pauta da saúde mental no trabalho em um vetor de vantagem competitiva. "Não se trata apenas de evitar penalidades, mas de promover um ciclo virtuoso em que trabalhadores saudáveis e valorizados impulsionam o sucesso sustentável da empresa."
O advogado trabalhista Arnaldo Pipek, sócio-fundador do Pipek Advogados, compartilha da mesma visão. Para ele, a atuação preventiva em saúde mental reduzirá inegavelmente os afastamentos, aumentará a produtividade e fortalecerá o engajamento dos colaboradores. "É preciso considerar que as empresas que valorizarem uma cultura de bem-estar mental terão mais facilidade para atrair e reter talentos, em um mercado que está inegavelmente cada vez mais atento às práticas de responsabilidade social e à sustentabilidade das relações de trabalho."