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Entenda como os escritórios centenários se adaptam às novas tecnologias

Dannemann Siemsen e Villemor Amaral mostram como tradição e inovação andam juntas ao completar mais de um século de história e investir em tecnologia jurídica, cultura digital e ESG

14 de July 9h30

Por milhares de anos, a humanidade não teve o domínio da escrita. Não havia como registrar toda a sabedoria de uma comunidade em um objeto singular que se tornaria transmissor do conhecimento. Por isso, cabia ao ancião da tribo carregar todo o aprendizado, cultura e tradição do grupo, para, assim, poder liderar seu povo e garantir que os saberes antigos fossem passados para as novas gerações. Entretanto, em algum momento da modernidade, esse hábito milenar se perdeu. Não nos reunimos mais ao redor da fogueira para ouvir as histórias de quem já foi marcado pelo tempo e recebeu seus cabelos grisalhos como recordação, mas sim procuramos o conhecimento dos fantasmas do passado em anotações, livros ou no senhor de toda a sabedoria moderna: o Google.

Em um país onde seis em cada dez das empresas não sobrevivem após cinco anos, cruzar o século parece quase impossível, mas alguns escritórios de advocacia conseguiram. Ao todo, a mais recente edição do Análise Advocacia Regional contou com dez escritórios centenários no ranking dos Mais Admirados. Após perambular pela selva de pedra em busca do conhecimento ancião, encontramos dois velhos sábios dispostos a compartilhar alguns segredos da longevidade, e te convidamos para, em nome dos velhos tempos, sentar em volta desta fogueira conosco e ouvir.

Com mais de 100 anos de trajetória, os escritórios Dannemann Siemsen Advogados e Villemor Amaral Advogados mostram que a longevidade no mercado jurídico brasileiro não se sustenta apenas na memória, mas na capacidade contínua de se reinventar.

Tradição como alicerce, inovação como caminho

Ao observar a história de bancas centenárias, é comum pensar que o segredo da longevidade está na preservação de um modelo de atuação consolidado. Embora isso seja parcialmente verdadeiro, tanto o Dannemann Siemsen quanto o Villemor Amaral mostram que o passado só tem valor real quando está a serviço do presente — e, principalmente, do futuro.

O Dannemann Siemsen, fundado em 1900, consolidou sua atuação como referência em Propriedade Intelectual e inovação tecnológica. Ao longo das décadas, o escritório investiu na construção de uma cultura híbrida, que integra o conhecimento técnico-jurídico com uma mentalidade orientada à transformação. "Tradição e inovação coexistem de forma natural em nossa cultura, que valoriza tanto a excelência jurídica construída ao longo de um século quanto a modernização constante dos nossos processos", afirma Peter Eduardo Siemsen, sócio da banca.

No Villemor Amaral, que iniciou suas atividades em 1909, o equilíbrio entre o clássico e o contemporâneo também é estratégico. A filosofia institucional parte da ideia de que a modernização não significa ruptura, mas continuidade consciente. "A história de um escritório centenário não se sustenta apenas na memória, mas na capacidade de se reinventar com responsabilidade. A tradição é o alicerce; a inovação, o caminho", resume Hermano de Villemor Amaral, sócio-diretor.

Inovar para permanecer

Ambos os escritórios adotaram uma abordagem robusta e personalizada para a incorporação de ferramentas tecnológicas em suas operações, não como uma tendência a ser seguida, mas como um pilar estratégico para eficiência e competitividade.

No Dannemann Siemsen, foram implementadas soluções que vão desde softwares para tratamento de e-mails até ferramentas baseadas em inteligência artificial voltadas à redação de petições. Um dos destaques recentes é a criação de um portal exclusivo para clientes, que permite acompanhar o andamento de processos em tempo real, promover o intercâmbio seguro de documentos e aumentar a previsibilidade das entregas. "Nosso portal exclusivo fortalece o relacionamento com os clientes, que agora podem acompanhar tudo on-line e on-time, de qualquer lugar do mundo", pontua Peter Eduardo Siemsen.

Já no Villemor Amaral, a aposta está em automatizar o que é repetitivo para liberar tempo para o que é estratégico. Com uso de RPA (Robotic Process Automation), o escritório automatizou a captura e distribuição de processos, leitura de publicações e monitoramento de andamentos — tudo isso operando em nuvem, com dados criptografados. "Inovar, para nós, não é apenas adotar tecnologia, mas buscar soluções que otimizem o tempo do advogado e entreguem mais valor ao cliente", afirma Alexandre Montoni, sócio-diretor.

Nos dois casos, a tecnologia não é vista como fim, mas como meio: ela está a serviço da técnica, do relacionamento e da reputação construída ao longo de décadas. Trata-se de um investimento contínuo e direcionado, que respeita a essência de cada escritório.

Sabedoria anciã, visão de futuro

A digitalização das bancas não ocorre à revelia das lideranças mais experientes — pelo contrário, elas desempenham papel central na transformação. A visão de mundo acumulada ao longo de décadas é usada como bússola para orientar o uso ético e estratégico das novas tecnologias.

No Dannemann Siemsen, sócios e líderes participaram ativamente da elaboração das diretrizes internas para o uso de IA, adotadas desde janeiro de 2024. Um comitê de governança foi formado com representantes de diversas gerações e áreas técnicas, para garantir segurança, responsabilidade e atualização constante dos modelos. "A IA é vista como uma aliada dentro da nossa organização, pois agiliza o tratamento de grandes volumes de informação e apoia advogados e suas equipes nas suas atividades", afirma o sócio Peter Eduardo Siemsen.

O Villemor Amaral segue por trilha semelhante. A digitalização é acompanhada de programas internos de capacitação, e os sócios seniores atuam como mentores da nova geração — sem abdicar do protagonismo. "Construímos um ambiente no qual a experiência se soma à inovação. A tecnologia não reduz o papel do advogado; ao contrário, amplia nossa capacidade de análise e aconselhamento estratégico", pontua Vitor Lopes, sócio-diretor.

Esse diálogo intergeracional é, talvez, um dos maiores trunfos dos escritórios centenários: criar uma cultura viva, em que o aprendizado flui de forma orgânica entre os que carregam a memória institucional e os que trazem novas visões de futuro.

Entre os desafios do século e as oportunidades do agora

A longevidade, embora admirável, impõe desafios próprios. Um dos principais é preservar a identidade institucional sem se tornar resistente à mudança. Com um mercado jurídico cada vez mais digital, regulado e orientado a resultados, manter-se relevante exige esforço contínuo.

Para o Dannemann Siemsen, o desafio da transformação digital está acompanhado por um outro: o da regulação da tecnologia. "A digitalização não é mais apenas uma vantagem competitiva, mas um requisito para manter agilidade e eficiência operacional. O mesmo vale para o compromisso ESG, que se tornou uma exigência dos nossos stakeholders", pontua Peter Eduardo Siemsen.

O Villemor Amaral destaca que, além de tecnologia, é necessário modernizar a própria relação com o capital humano — incluindo ações afirmativas e bem-estar corporativo. Com 68% do quadro composto por mulheres, o escritório se orgulha de ser pioneiro na inclusão feminina desde sua fundação, em 1909. "Ser um escritório centenário é um privilégio, mas também uma responsabilidade. Precisamos honrar a história que nos trouxe até aqui, sem deixar de olhar com coragem para as novas demandas do mercado", afirma Hermano de Villemor Amaral.

As duas bancas convergem na leitura de que o tempo é ativo estratégico — desde que administrado com visão, ética e investimento contínuo.

O legado que permanece

Mais do que a idade, o que sustenta esses escritórios é a consistência. No Dannemann Siemsen, a combinação entre excelência jurídica, investimento em inovação e uma cultura intergeracional é apontada como motor da longevidade. "A inovação faz parte dos nossos valores e é tratada como parte estruturante da forma como nossos serviços são prestados", destaca o sócio Peter Eduardo Siemsen.

Já o Villemor Amaral acredita que a razão de sua permanência está nas pessoas. "Estamos aqui há mais de um século porque sempre colocamos as pessoas — sejam clientes, colaboradores ou parceiros — no centro da nossa atuação", conclui Gustavo Paixão, sócio-diretor.

Enquanto o futuro jurídico parece cada vez mais digital, automatizado e veloz, os velhos sábios da advocacia mostram que conseguir envelhecer com consistência é, por si só, um gesto de inovação. Afinal, a fogueira da tradição segue acesa — agora com sinal Wi-Fi.

Imagem: gerado por ChatGPT em 11/07/2025.
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