A presença feminina em cargos de liderança na advocacia brasileira é ampla e vem crescendo cada vez mais, mas ainda enfrenta desafios para se consolidar em todos os níveis da gestão. Dos 557 escritórios que participaram do ANÁLISE ADVOCACIA DIVERSIDADE E INCLUSÃO 2025, 49% deles afirmam que têm uma advogada como sócia-presidente, enquanto apenas 6% contam com uma mulher na função de CEO. Outros 39% não possuem nenhuma mulher no cargo mais alto da gestão, 6% preferem não informar.
A participação feminina é ainda mais expressiva nas posições de liderança por áreas. Entre os escritórios ouvidos, 88% têm advogadas como heads das áreas de especialidade do direito, apenas 6% não têm mulheres como heads dessas áreas, 4% não fazem esse tipo de controle e 2% preferem não informar.
Já nas áreas estratégicas dos escritórios, 86% deles contam com mulheres na liderança, 8% não contam com mulheres nessas funções, enquanto de 4% não registram e 2% preferem não informar.
Não é só para inglês ver
Para Renata Furtado, sócia-fundadora do Euds Furtado Advogados Associados, o aumento da representatividade é reflexo de uma transformação gradual iniciada ainda na universidade. "Na medida em que notamos mais mulheres se formando, é natural que essa presença também venha a aumentar nas posições de liderança", afirma.
Segundo Ellen Cristina Gonçalves Pires, CEO do PG Advogados, esse avanço também se refletiu na liderança, impulsionado por fatores como, valorização de competências, habilidades como visão estratégica, gestão de pessoas e construção de relacionamentos sólidos. De acordo com ela esses pontos são altamente demandados na liderança jurídica e frequentemente associados a estilos de gestão adotados por mulheres. Além de mudanças culturais e de mercado onde clientes e organizações valorizam cada vez mais equipes diversas, o que estimula oportunidades igualitárias e a quebra de barreiras históricas.
Para a CEO do PG Advogados, a valorização de competências como gestão de pessoas, visão estratégica e relacionamento com clientes tem ampliado o protagonismo das mulheres no comando. "A combinação de habilidades alinhadas às demandas de liderança e um contexto de transformação cultural explica a expressiva participação feminina no topo da advocacia", diz.
Ambas enxergam esse avanço da liderança feminina bem difundido em todas as áreas do direito. Ellen cita o PG Advogados como um exemplo: "Com atuação multidisciplinar e liderança feminina em áreas estratégicas que vão do contencioso de massa à gestão de contratos. Na minha visão, essa diversidade de atuação demonstra que a habilidade e a competência das mulheres líderes não se restringem a nichos específicos, mas alcança todo e qualquer setor", afirma.
Nem tudo são flores
Apesar dos avanços, as lideranças entrevistadas apontam barreiras como resistência em espaços de decisão historicamente masculinos, dificuldade de conciliar expectativas sociais e responsabilidades profissionais e a ausência de políticas formais para estimular a ascensão feminina.
Renata ressalta, que ainda é necessário combater preconceitos estruturais e a visão de que a credibilidade feminina precisa ser validada por um homem. "Acredito que os desafios sejam os mesmos desafios históricos que estamos conseguindo derrubar dia após dia como mostrar que a mulher deve ter credibilidade em sua fala sem depender de um homem para avalizá-la; fazer a sociedade acreditar de uma vez por toda que se uma mulher chegou a uma posição de destaque isso se deve unicamente à sua dedicação profissional e não a qualquer outro fato".
Ellen também faz um aviso e um pedido: "Precisamos continuar investindo em ambientes de trabalho inclusivos, que reconheçam o mérito de forma equitativa e incentivem a representatividade feminina em todos os níveis".
Mulheres presentes
Renata e Ellen concordam que a presença de mulheres em cargos de liderança impacta diretamente a cultura e a gestão dos escritórios de advocacia. Para uma das Renata, "o primeiro ponto é quebrar, de cara, o preconceito que a mulher não sabe trabalhar, afinal, ter uma mulher na liderança já mostra que ela conseguiu se destacar naquele ambiente". Segundo ela, esse posicionamento também transmite às demais mulheres da equipe "a tranquilidade que serão tratadas de forma justa" e contribui para "quebrar nos homens da equipe qualquer resquício de preconceito que ainda possa existir".
Já na visão de Ellen, CEO do PG Advogados, é um ponto chave do escritório: "a presença feminina na liderança fortalece nossa essência como parceiro estratégico dos clientes, guiando a gestão pela proximidade, pela escuta ativa e pela capacidade de desenvolver soluções criativas, seguras e alinhadas às necessidades de cada negócio".
Falar e fazer cada vez mais
A nova lei que estabelece que 30% dos conselhos de administração de grandes empresas seja ocupado por mulheres, ainda que não se aplique diretamente aos escritórios de advocacia, reforça a importância da diversidade de gênero como ativo estratégico e pode fazer com que mais escritórios adotem práticas internas para romperem as barreiras de gênero.
Em relação a práticas internas, ambas citam práticas baseadas no mérito e sem barreiras de gênero, como:
- Seleção cega em processos de contratação;
- Flexibilidade para conciliar vida pessoal e profissional;
- Programas de mentoria para fortalecimento de habilidades;
- · Participação ativa em projetos estratégicos que abrem caminho para cargos de liderança.
Para Ellen, "a lei representa um marco na valorização da diversidade de gênero nas instâncias de decisão e envia um recado claro ao mercado: diversidade não é apenas uma questão de justiça social, mas um ativo estratégico que gera inovação, legitimidade e melhores resultados", afirma.
Renata pondera que "mais importante do que marcos legais e normativos é fazermos a transformação cultural necessária para que todos entendam que a igualdade é algo fundamental em qualquer ambiente coletivo, principalmente se considerarmos a natural diversidade e pluralidade existente na população brasileira", conclui.