Apesar dos avanços em políticas de diversidade, a presença de pessoas com deficiência (PcDs) na advocacia brasileira ainda é reduzida. Dos 557 escritórios que responderam ao ANÁLISE ADVOCACIA DIVERSIDADE E INCLUSÃO 2025, 44% não possuem nenhum advogado com deficiência. Apenas 3% têm mais de cinco profissionais nessas condições. Além disso, 17% não fazem controle ou levantamento desses dados, e 12% preferem não informar.
Entre os sócios, a representatividade é ainda menor: 25% dos 312 escritórios ouvidos não contam com nenhum sócio PcD e apenas 1% declarou ter mais de seis. Indo mais a fundo, o número de escritórios que não registram dados sobre sócios é maior do que o de advogados, 27% e 21% preferem não informar. Esses números somados mostram que quase metade dos escritórios entrevistados negligenciam a questão dos PcDs quando o tema tange aos sócios.
As deficiências mais citadas nos escritórios são transtornos de humor (depressão, bipolaridade, esquizofrenia, entre outros) (20%), baixa visão (12%), deficiência física leve (12%) e deficiência auditiva (11%). Casos de autismo representam 10% das ocorrências. Ainda assim, 32% das bancas não realizam controle sobre o tipo de deficiência e 24% preferem não informar.
Para as integrantes do Comitê de Diversidade e Inclusão do Lee, Brock e Camargo Advogados (LBCA), Danielle Pereira Silva, presidente do comitê, Simone de Almeida Costa, presidente do Subcomitê PcD e Santamaria N. Silveira, presidente do Subcomitê Afro, a principal barreira é estrutural. "Existe um capacitismo entranhado nas estruturas sociais, políticas e econômicas do mercado de trabalho, que dificulta a equidade para advogados PCDs", afirma. As representantes do comitê destacam a importância de eliminar obstáculos físicos, adotar tecnologias assistivas e preparar as equipes para uma interação não discriminatória.
Boas práticas para a inclusão de PcD’s
1. Eliminar barreiras de acessibilidade física
- Substituir escadas por rampas
- Garantir acesso a elevadores
- Adaptar banheiros e instalar corrimãos
- Criar estações de trabalho com acessibilidade arquitetônica
2. Promover adaptações específicas
- Ajustes para profissionais autistas
- Recursos para baixa visão
- Adequações para uso de muletas ou próteses
3. Ampliar a empregabilidade de advogados PCDs
- Aumentar a contratação
- Preparar equipes para interações não discriminatórias
4. Adotar tecnologias assistivas
- Softwares leitores de tela
- Teclados modificados
A sócia Fernanda Negreiros, do Gondim Albuquerque Negreiros Advogados, alerta para a necessidade de considerar também as condições invisíveis e por muitas vezes invisibilizadas. "Além de acessibilidade física, como elevadores, banheiros adaptados, baias acessíveis e equipamentos adequados, é essencial considerar também as deficiências ocultas. No Gondim, temos uma preocupação contínua com a saúde mental: contamos com psicóloga no time, mantemos campanhas internas sobre o tema e disponibilizamos, na nossa intranet, uma cartilha com orientações de cuidados e apoio", explica.
Sabrina da Silva Castro, advogada do vezzilapolla.legal e que possui deficiência visual, ressalta que recursos já citados como rampas, elevadores e mesas adaptadas, bem como ajustes tecnológicos — tamanho de fontes, escrita por voz, cursores coloridos — têm avançado e ampliado as possibilidades de atuação.
Maiores desafios
O Comitê de Diversidade e Inclusão do LBCA aponta a falta de políticas públicas voltadas à formação acadêmica também como entrave: "Dados do Censo 2022 e da PNAD Contínua do IBGE indicam que, em 2022, somente 7% das pessoas com deficiência tinham concluído o ensino superior, contra 20,9% das pessoas sem deficiência". Não há estatísticas específicas para o curso de Direito. De acordo com elas, ampliar a presença de PcDs no mercado jurídico exige políticas públicas que incentivem o ingresso e a permanência no ensino superior. Também é necessário criar medidas que estimulem a contratação de profissionais com deficiência por escritórios e departamentos jurídicos. "Medidas desse tipo podem contribuir para que a advocacia reflita, de fato, os princípios de diversidade, equidade e inclusão".
Para Sabrina, o desafio começa antes mesmo da porta do escritório. "A maior barreira é a locomoção em meio ao caos do transporte público de São Paulo. Além disso, há menos chances de contratação pela falta de infraestrutura ou preconceito", diz.
Iniciativas em busca da inclusão
Entre as iniciativas apontadas pelas entrevistadas como exemplos de boas práticas estão a criação de comitês internos dedicados às pautas de inclusão, como por exemplo, o Subcomitê de PcDs criado dentro do Comitê de Diversidade e Inclusão do LBCA. A adaptação da infraestrutura física e o uso de tecnologias assistivas como citado anteriormente, o LBCA, por exemplo, dispõe de uma escola corporativa (Akdia) que propicia capacitação contínua de todos os colaboradores e o site do escritório conta com recursos de libras e assistivos. A flexibilização de horários e o home office também foram citados como práticas inclusivas, principalmente para pessoas que possam ter alguma dificuldade em se locomover pela cidade.
Embora leis como a Lei de Cotas (Lei nº 8.213/91) e a Lei Brasileira de Inclusão (Lei nº 13.146/2015) ofereçam diretrizes, as especialistas avaliam que a efetiva ampliação da presença de PcDs na advocacia depende tanto do cumprimento da legislação quanto do engajamento voluntário dos escritórios.
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