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Análise

Um avanço na prevenção de fraudes financeiras

Por Denise Leonardi dos Reis, gerente jurídica Contencioso do Reis Advogados

25 de July de 2023 8h

A Resolução Conjunta no 6, publicada pelo Banco Central no último dia 23 de maio, estabelece que os bancos e as demais instituições financeiras devem compartilhar entre si dados e informações sobre fraudes. O objetivo é preventivo, evitando que pessoas que tenham aplicado ou tentado aplicar um golpe em uma organização venham a fazê-lo em outras. A resolução entrará em vigor no dia 1º de novembro.

É um avanço oportuno e bem-vindo para a prevenção e o controle desses delitos, pois os levantamentos periódicos feitos pela Febraban, por meio de seu Radar, indicam que vem aumentando o número de pessoas que sofreram golpes financeiros ou tentativas destes por diferentes meios, com destaque para os digitais.

Pesquisa realizada pela entidade entre o final de maio e o início de junho do ano passado, nas cinco regiões brasileiras, constatou que haviam sido vítimas, em setembro de 2021, 21% dos entrevistados, percentual que subiu para 22% três meses depois e chegou a 31% em junho de 2022. É provável que, passado um ano, tenhamos números ainda mais alarmantes. Portanto, é um quadro que requer ações de peso.

Nesse sentido, a Resolução Conjunta no 6 representa um passo importante, contendo regras bem detalhadas. Exige que as instituições reguladas pelo Bacen instalem um sistema eletrônico de compartilhamento seguro de dados, acessível a todas essas organizações, com padrão único de comunicação, com as seguintes funcionalidades: registro, alteração, exclusão e consulta de dados sobre indícios de ocorrência ou tentativa de fraudes. Entre outras informações, deve conter a identificação do autor do ilícito, descrição dos indícios da ocorrência, instituição responsável pelo registro dos dados e, no caso de pagamentos, informação sobre os dados da conta destinatária e de seu titular.

Ante essa nova obrigatoriedade, a questão que se coloca é: como seu cumprimento poderia ferir os preceitos da LGPD - Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (Lei no. 13.709/18)? A resposta a essa dúvida é respondida na própria norma, que fixa obrigações adicionais para as instituições financeiras, dentre as quais obtenção do consentimento formal do cliente para registro dos dados e das informações a serem compartilhadas e limitação de tal consentimento à finalidade específica de subsidiar procedimentos de prevenção de fraudes, como sua inclusão em bases de cadastro. O titular também deve ter livre acesso aos dados inseridos no sistema que envolvam seu nome e sua conta, bem como direito à exclusão ou correção imediata de erros ou inconsistências.

O sistema de compartilhamento ainda deve incorporar controles que garantam sua segurança, incluindo a elaboração de relatórios de auditoria especializada e a definição de processos e trilhas de auditoria, métricas e indicadores. Para completar, as instituições financeiras devem armazenar e manter à disposição do Bacen, pelo período de dez anos, os dados sobre indícios de fraude

compartilhados e a documentação sobre os procedimentos para identificação de crimes dessa natureza e, por cinco anos, informações sobre a aplicação dos mecanismos de controle.

A norma em si não tem o poder de reduzir o número de golpes ou tentativas expresso pelos percentuais citados na parte inicial deste artigo. Serão necessárias concomitantemente ações em várias frentes, dentre as quais educação do consumidor, treinamento de todos os que atuam direta e indiretamente na área de crédito de bancos e demais instituições do Sistema Financeiro Nacional, desenvolvimento de ferramentas tecnológicas e colaboração entre as organizações que, de alguma forma, possam contribuir para coibir essa escalada criminosa.

Dentre as organizações que podem associar-se a esse esforço, destacam-se os escritórios de advocacia, em especial os que detêm expertise na prestação de serviços ao setor financeiro, no contencioso de volume de ações contra bancos e instituições financeiras e em campos correlatos. Poderiam auxiliar seus clientes na análise de documentos e no desenvolvimento ou aperfeiçoamento de metodologias de análise que possibilitem conclusões mais rápidas e seguras, incluindo o uso de Inteligência Artificial.

Adicionalmente, os escritórios de advocacia especializados na área poderiam criar bancos de dados com estudos e relatos sobre fraudes e fraudadores, inclusive com indicações geográficas de regiões com maior incidência de crimes desse tipo, possibilitando a tomada de medidas localizadas. Desse modo, bancos e escritórios poderiam unir-se em torno da prevenção desses crimes, pois juntos teriam condições de obter e gerir um volume de dados muito maior.

A Resolução Conjunta no 6 é, portanto, uma porta que se abre para numerosas oportunidades de ação, em benefício de uma sociedade com maior grau de segurança.

Denise Leonardi é graduada em direito pelo Centro Universitário da Fundação Educacional de Barretos, possui mestrado em Direitos Difusos e Coletivos e Função Social do Direito pela Universidade de Ribeirão Preto, também possui um LLM.

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