Perto de completar um ano da publicação da Lei n°13.988/20, que resultou da conversão em lei da conhecida "MP do Contribuinte Legal" e que estabeleceu os requisitos e as condições para que a União, suas autarquias e fundações e os devedores realizem transação resolutiva da cobrança de créditos da Fazenda Pública, nota-se que o mecanismo alternativo, criado para solucionar as disputas travadas e estimular o diálogo entre o fisco e os contribuintes, visando a redução de litígios, ainda não é opção atrativa, tampouco vantajosa, para grande parte dos contribuintes.
O que se observa é que as modalidades de transação tributária já instituídas e colocadas à disposição dos contribuintes destinam os seus principais benefícios aos créditos classificados como irrecuperáveis ou de difícil recuperação - como aqueles inscritos em dívida ativa da União há mais de 15 anos e exigíveis, de titularidade de devedor com falência decretada ou de titularidade de devedor com CNPJ baixado, por exemplo - não alcançado, assim, parte substancial das pessoas jurídicas com atividade regular e saúde financeira frágil.
Diante disso, os anseios dos contribuintes estão voltados à opção de transação tributária que ainda não foi instituída, isto é, a transação por adesão no contencioso tributário de relevante e disseminada controvérsia jurídica. Nesta modalidade, o Ministro da Economia poderá propor aos sujeitos passivos transação resolutiva de litígios, com base em manifestação da Procuradoria Geral da Fazenda Nacional (PGFN) e da Secretaria da Receita Federal do Brasil (SRFB).
De concreto, até o momento, há apenas a Portaria do Ministério da Economia n°247, de 16 de junho de 2020, que disciplinou os critérios e procedimentos para a elaboração de proposta e de celebração de tal modalidade. Dentre eles, destaca-se a possibilidade da concessão de descontos, inclusive sobre o montante principal, de até 50% do valor total do crédito a ser transacionado e de prazo para pagamento de, no máximo, 84 meses.
Em complemento, o que se sabe é que a controvérsia jurídica será considerada disseminada quando se constatar a existência de:
- demandas judiciais envolvendo partes e advogados distintos, em tramitação no âmbito de, pelo menos, três Tribunais Regionais Federais;
- mais de 50 processos judiciais ou administrativos referentes a sujeitos passivos distintos, incidente de resolução de demandas repetitivas cuja admissibilidade já tenha sido reconhecida ou;
- demandas judiciais ou administrativas que envolvam parcela significativa dos contribuintes integrantes de determinado setor econômico ou produtivo.
No que lhe diz respeito, a relevância de uma controvérsia ficará demonstrada quando houver impacto econômico igual ou superior a R$1 bilhão, considerando-se a totalidade dos processos pendentes, decisões divergentes entre as turmas ordinárias e a Câmara Superior do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (CARF) ou sentenças e acórdãos divergentes no âmbito do contencioso judicial.
Enquanto são poucas as informações sobre a proposição de tema por parte do Ministro da Economia, bem como quando ocorrerá, por outro lado, muitas são as especulações de quais temas serão propostos. Conforme adiantado, existem temas que já estão em estudo interno para submissão à apreciação do Ministro da Economia, com especial destaque àqueles que vinham sendo decididos pelo extinto voto de qualidade no CARF, abrangendo teses consideradas como "zona cinzenta", ainda pendentes no Poder Judiciário. Essa iniciativa visa reduzir o contencioso tributário em âmbito federal, a qual, conforme informações divulgadas pelo Núcleo de Tributação do Insper no "Contencioso tributário no Brasil - Relatório 2020", alcançou o valor de R$3,8 trilhões - o equivalente a cerca de 53% do PIB do Brasil no ano de 2019.
Ainda que os contribuintes não tenham a possibilidade de participar ativa e diretamente nas definições dos temas que serão passíveis de transação por adesão no contencioso tributário de relevante e disseminada controvérsia jurídica, certo é que o Ministro da Economia possui todos os elementos necessários para definir os temas que merecem ser objeto de transação - seja pelas informações acima reportadas ou em razão de a própria exposição de motivos da MP do Contribuinte Legal reconhecer que os contribuintes são autuados "não raro, pela complexidade da legislação que permita interpretação razoável em sentido contrário àquele reputado como adequado pelo fisco".