STF: dano ambiental é imprescritível, mesmo com indenização | Análise
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STF: dano ambiental é imprescritível, mesmo com indenização

Por Luciana Camponez Pereira Moralles, Bruno Rodrigo Klesse Moreira, Fernanda Kaori Baptistella Choli Hayama, e Luísa Frasson Lopes do Finocchio e Ustra

3 de June 18h11

Em recente acórdão, o Supremo Tribunal Federal, ao julgar o Recurso Extraordinário com Agravo nº 1.352.872/SC, sob a relatoria do Ministro Cristiano Zanin, firmou uma tese em sede de repercussão geral (Tema 1.194) reconhecendo a imprescritibilidade da pretensão executória relativa à reparação de dano ambiental, ainda que a obrigação originária de fazer tenha sido posteriormente convertida em indenização por perdas e danos. Também restou assentada a inaplicabilidade da prescrição intercorrente na fase de execução, reforçando o caráter fundamental, coletivo e intergeracional do direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, nos termos do artigo 225 da Constituição Federal.

O caso concreto teve origem no Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4), que havia determinado a extinção da execução de sentença penal condenatória por entender que, como a obrigação de reparação ambiental, esta foi convertida em perdas e danos. Assim, a natureza da dívida tornou-se meramente pecuniária, sujeita, portanto, à prescrição. O entendimento da Corte Regional foi mantido em sede de Apelação e Embargos de Declaração, sob a sistemática de que "o direito à reparação ambiental foi reconhecido. Converteu-se em dívida de valor. A pretensão executória da dívida de valor prescreveu."

O decidido pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região não necessariamente implica em rejeição ao precedente firmado anteriormente, em 2018, no julgamento do Tema 999 da repercussão geral, no qual o Supremo Tribunal Federal reconheceu a imprescritibilidade da pretensão de reparação civil por dano ambiental. Conforme linha argumentativa utilizada pelo Judiciário regional, tratou-se de interpretação segundo a qual tal imprescritibilidade não alcançaria a fase de execução do título judicial, especialmente quando a obrigação reparatória fora substituída por prestação pecuniária. O Supremo Tribunal Federal, ao contrário, entendeu que o mesmo regime jurídico aplicável à pretensão principal deve incidir sobre sua execução, sob pena de esvaziamento do conteúdo do direito tutelado.

O Supremo Tribunal Federal ao firmar a tese no Tema 1.194, assentou que o decurso de tempo não possui o condão de extinguir o direito à reparação do dano ambiental, ainda que se trate de execução de título judicial transitado em julgado ou de indenização em pecúnia, destacando que a pretensão executória não se dissocia da natureza transindividual, indisponível e essencial do bem jurídico tutelado. O STF fez remissão expressa à Súmula 150, segundo a qual "prescreve a execução no mesmo prazo da ação", ressaltando, contudo, que, tratando-se de direito imprescritível, sua execução não pode estar submetida a limite temporal.

É importante, nesse contexto, recordar que o ordenamento jurídico brasileiro consagra a chamada tríplice responsabilidade ambiental, de natureza civil, administrativa e penal, conforme delineado no §3º do artigo 225 da Constituição Federal. A responsabilidade civil, de caráter objetivo, tem por finalidade a reparação do dano ambiental causado, independentemente de culpa. No caso concreto, embora a condenação à reparação de dano ambiental tenha origem em sentença penal, a discussão jurídica centra-se precisamente sobre a dimensão civil da responsabilidade ambiental, mais especificamente sobre os limites temporais da pretensão executória do direito à reparação civil de danos ao meio ambiente. Aqui, é relevante pontuar que é efeito secundário extrapenal da sentença penal condenatória tornar certa a obrigação de reparar o dano, nos termos do artigo 91, I, do Código Penal, tornando-se a sentença título executivo judicial passível de execução, conforme se vê no caso em tela.

A Corte ainda reforçou que o fato de a obrigação de fazer, consistente na recomposição do meio ambiente degradado, ter sido substituída por indenização em pecúnia não desnatura a finalidade reparatória da medida nem a natureza jurídica da obrigação imposta ao causador do dano. A indenização, ainda que sucedânea da obrigação originária, continua a representar um meio de restaurar o bem jurídico ambiental lesionado. Assim, tanto a obrigação de fazer quanto a obrigação de dar devem submeter-se ao regime da imprescritibilidade, dado que ambas estão intrinsecamente ligadas à efetivação de um direito fundamental.

Ao reconhecer a imprescritibilidade da pretensão executória em tais hipóteses, o Supremo Tribunal Federal reafirma a centralidade da proteção ambiental como vetor interpretativo do sistema jurídico-constitucional brasileiro, e explicita que a tutela jurisdicional do meio ambiente não se submete aos contornos tradicionais da lógica privatista da prescrição civil. A tese firmada, por ter sido proferida em sede de repercussão geral, deverá ser observada pelas demais instâncias do Judiciário. Em síntese, o julgado está em linha com o posicionamento do Tribunal.

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