O que faz um advogado de startups? Essa pergunta certamente já foi tema de muitos profissionais do Direito na atualidade. Colocadas como o símbolo maior das empresas "do futuro", as startups estão em tanta evidência que muitos já consideram o setor como um novo ramo de especialidade, destinado a muitos advogados que objetivam praticar uma advocacia mais flexível e criativa.
Não é por menos: o ecossistema empreendedor brasileiro encontra-se em franco crescimento, ganhando cada vez mais destaque no cenário global. A edição 2020 do relatório anual Global Startup Ecosystem Report apontou São Paulo entre os 30 melhores ambientes para negócios de inovação do planeta, graças principalmente ao intenso volume de investimentos que o setor recebeu nos últimos anos (2018 e 2019). Os números comprovam: de acordo com a pesquisa Inside Venture Capital publicada periodicamente pela Distrito, em 2019 tivemos 331 operações de investimento no Brasil, totalizando US$ 3 bilhões em volume de capital.
É evidente que o destaque global do ambiente empreendedor brasileiro atrai inúmeros profissionais que enxergam nesse mercado a oportunidade de desenvolver uma atividade alinhada com inovação e propósito, mas ao mesmo tempo lucrativa - advogados e outros profissionais jurídicos, inclusive. Startups são associadas com flexibilidade, dinamismo e informalidade, mas ao mesmo tempo movimentam um enorme volume de capital. Parece a receita perfeita para uma advocacia mais autônoma e "sem barreiras", onde (quase) tudo seria permitido em prol do desenvolvimento de novos negócios.
Contudo, o mesmo amadurecimento do ecossistema demonstrado pelos números reflete-se em uma considerável evolução dos aspectos jurídicos e do panorama regulatório enfrentado por essas empresas. Antes de prosseguir, cabe uma ressalva: mesmo assim, ainda é impossível considerar a existência de um "Direito das Startups" enquanto disciplina autônoma da profissão.
Recentemente, o Executivo federal enviou ao Congresso um Projeto de Lei Complementar que endereça as discussões por um Marco Legal das Startups, ocorridas nos últimos anos. A ideia é oferecer ao ecossistema benefícios para um rol de empresas que se enquadrem em parâmetros legais para serem consideradas como "startups", mas esse cenário ainda não é realidade - visto que a norma precisa ser apreciada e aprovada. Assim, apesar de tais debates em nível governamental e legislativo, ainda não há uma lei ou conjunto de leis específico que impacte significativamente os negócios de tais empresas. Temos, sim, o Inova Simples (LC nº 167/2019), a Lei do Investimento-Anjo (LC nº 155/2016) e alguns outros temas pontuais tratados em legislações estaduais ou normas infralegais; entretanto, o seu efeito é pequeno e, na prática, startups ainda se sujeitam à imensa maioria das regras que incidem sobre empresas em geral, sem qualquer privilégio ou benefício.
Assim, não há de se falar em um Direito próprio para tais empresas: muda-se o dinamismo das atividades, permanecem as obrigações legais - e a inovação jamais poderá ser usada como pretexto para descumprimento de normas. Assim, voltamos à pergunta que abriu este artigo: o que faz um advogado de startups? E ainda: faz sentido pensar nessa prática em escritórios full-service?
Inicialmente, o advogado de startups é um profissional capaz de mapear necessidades e dialogar com empreendedores de forma a proteger seus negócios, considerando o momento e grau de evolução de cada empresa. Nesse sentido, é preciso enxergar uma startup como um ente que evolui e se desenvolve muito rápido, mas que certamente vivenciará eventos comuns no ambiente empreendedor, como rounds de investimento, contratos com grandes clientes, provas de conceito, entre outros.
Essa estratégia é muito bem desenhada no Guia de Governança Corporativa para Startups e Scale-ups, publicado pelo IBGC em 2019: conscientes de que a estrutura enxuta das startups não comporta formalidades desde o início (e que empreendedores em fase de crescimento possuem outras prioridades em relação a obrigações legais), o guia aponta muito bem o que é imprescindível em cada estágio de uma startup - e o que pode ser deixado para outro momento, sem prejuízos legais ou estruturais.
O perfil de um advogado de startups costuma ser generalista: alguém que entende as principais necessidades jurídicas de empresas inovadoras, sejam essas relacionadas a Direito Empresarial, Trabalhista, Tributário ou de outras áreas de notória importância nesse contexto. É relevante entender os pontos de incidência e saber encaminhar aos especialistas no momento certo, para que os desdobramentos sejam tratados com maior cautela. Essa característica é uma das principais razões pelas quais um escritório full-service, capaz de atender todas as esferas do Direito, pode ser uma boa opção para startups em fase de crescimento.
Por fim, é também importante saber que a advocacia para startups não se resume a atender apenas... startups. Há um crescente interesse de grandes corporações e investidores nesse mercado, e cada vez mais teremos um choque cultural entre dois universos: o tradicional e o inovador. O advogado de startups precisa falar com as duas pontas e fazer com que o negócio aconteça de forma interessante para ambas, atuando de forma justa e alinhada com as boas práticas do ambiente corporativo. Esse é outro elemento que conta pontos para um grande escritório, acostumado a assessorar grandes operações, mas que atua para entender a cultura do ambiente empreendedor.
Ante o exposto, é possível concluir que a advocacia para startups não demanda um conhecimento específico de um ramo do Direito, mas sim uma postura pró-ativa, flexível e consciente do profissional. É fundamental entender que aspectos jurídicos de uma startup podem parecer pequenos ou inofensivos, mas eventuais problemas, ainda que pontuais, são capazes de derrubar negócios inteiros em questão de dias. Portanto, advogar para startups envolve responsabilidade, muito estudo e, acima de tudo, uma racionalidade nas escolhas, sopesando o impacto de cada decisão para a empresa e o ecossistema