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Se diversa e inclusiva, advocacia fará a Justiça melhor

Por Letícia Rodrigues, sócia-fundadora da empresa de educação e consultoria Tree Diversidade

27 de September de 2022 17h35

O avanço do ESG, sigla para meio ambiente, social e governança a congregar os esforços corporativos nessas áreas, tem motivado empresas a adotar iniciativas de diversidade, equidade e inclusão (DE&I) junto a colaboradores e, também, cadeias de fornecimento.

Essa realidade tem afetado os escritórios de advocacia, que integram naturalmente o rol de fornecedores de todas as grandes organizações, de forma que são cada vez mais estimulados a adotar suas próprias ações de DE&I, em alguns casos, inclusive, como condição para a continuidade do atendimento jurídico a seus clientes.

Assim, o debate sobre DE&I vem avançando nas grandes sociedades de advogados sem deixar de enfrentar uma cobrança crescente dos clientes para incluir mais mulheres, pessoas negras, pessoas da comunidade LGBTI+, pessoas com deficiência e de outros grupos minorizados. As exigências incluem, ainda, a readequação dos ambientes de trabalho, para torná-los livres de assédio e inclusivos, ou seja, ambientes em que pessoas de todos os grupos se vejam esperadas, refletidas em diversos níveis hierárquicos e em proporções mais próximas da demografia social.

Não somente pelo desafio que representa em si, a discussão sobre DE&I no meio jurídico já inicia com status de questão estratégica, na medida em que se relaciona com a retenção de bons clientes, entre os mais rentáveis deste mercado, bem como com a conquista de novas contas deste desejado e seleto perfil. Apesar disso, o que se vê nos escritórios ainda é uma grande disparidade na abrangência, efetividade e maturidade das ações de DE&I em curso no segmento.

Claro que é possível encontrar escritórios de advocacia com ações-modelo no sentido de incluir advogadas como sócias e estagiários negros como ação afirmativa, mas também há a completa falta de iniciativa. Há ainda as sociedades que iniciaram ações de DE&I com contradições já superadas em mercados mais maduros, por exemplo, começar programas de diversidade sem um compromisso da alta liderança com a iniciativa, sem alocação de orçamento específico para ações de DE&I, ou delegando o esforço como tarefa adicional a uma das poucas pessoas do escritório que pertencem a algum grupo minorizado.

Uma pesquisa recente feita pela Tree Diversidade junto a 114 escritórios membros do Centro de Estudos de Sociedades de Advogados (CESA) é reveladora dessas contradições ao identificar que 80% dos grandes escritórios entrevistados contavam com ações de DE&I, mas apenas 57,5% deles manifestaram publicamente seus objetivos e metas com elas.

O mesmo levantamento identificou que 30% dos grandes escritórios ainda não tinham definido metas para a inclusão de mulheres no quadro societário. Além disso, 42,5% dos grandes escritórios não tinham ações para o avanço da carreira de advogadas, embora elas já sejam maioria entre os operadores do direito.

Se DE&I é estratégica, então precisa ser liderada pelo alto escalão dos escritórios, discutida como questão estratégica, ter orçamento próprio, estratégia, ficar a cargo de lideranças profissionais e qualificadas, em condições de conduzir as ações com planejamento, objetivos e kpis de mensuração.

A academia já descobriu que a diversidade gerada nas universidades pela Lei de Cotas acabou produzindo uma ciência mais relevante, simplesmente porque os pesquisadores, no momento em que passaram a ser diversos, iniciaram estudos considerando questões pertinentes a uma parcela muito maior da sociedade.

Se o mesmo ocorrer no meio jurídico, então a diversidade pode contribuir com uma Justiça no mínimo menos enviesada, mais efetiva e necessariamente melhor.

Letícia é consultora especializada em diversidade, equidade e inclusão,. Bacharela em Relações Internacionais pela Universidade de São Paulo (USP), e em Contabilidade pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC-Minas).

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