Por que não existe produto de tecnologia jurídica no Brasil? | Análise
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Por que não existe produto de tecnologia jurídica no Brasil?

Fernando Gomes Xavier, advogado e CEO da FGX Legal Management

19 de December de 2023 7h

Na era da Inteligência Artificial Generativa, muito tem se falado em automatizar a leitura e a elaboração de documentos jurídicos. De fato, a tecnologia enfim atingiu um nível de maturidade que possibilita a execução dessas tarefas, mas existem alguns passos a serem dados pelos escritórios antes do sonho se tornar realidade. E o primeiro passo é organizar a casa.

Ao desenvolver soluções de IA utilizadas por mais de 100 mil advogados, percebi que a adoção dessas ferramentas nunca seria feita em sua máxima potência se os escritórios não tivessem a casa minimamente organizada do ponto de vista de gestão.

Onde estão os dados? De onde vem e para onde vão? Como integrar as ferramentas existentes para evitar controles paralelos? O time tem o devido treinamento para utilizar as ferramentas? Os fluxos que querem ser automatizados estão bem desenhados? Está claro o papel de cada um dentro desses fluxos e procedimentos?

AFINAL, O QUE É MAIS IMPORTANTE PARA OS ESCRITÓRIOS HOJE: GESTÃO OU TECNOLOGIA?

A integração da tecnologia nos escritórios de advocacia brasileiros tem sido um caminho de progressos significativos e desafios persistentes. Os avanços em gestão, marketing, finanças e recursos humanos são inegáveis, refletindo um amadurecimento do setor e uma mentalidade mais empreendedora entre os sócios.

Além disso, a participação efetiva de profissionais de outras áreas tem trazido uma nova dinâmica ao mercado jurídico, inspirando-se em modelos como o do mercado jurídico americano, onde temos a proporção de um profissional de outra área para cada dois advogados.

No entanto, essa evolução traz consigo um conjunto de desafios, particularmente na adoção de tecnologias. Afinal, a tentativa de replicar modelos de outros setores, como a ideia de 'escalar' negócios inspirados nas startups, nem sempre se mostra compatível com o contexto jurídico. A prestação de serviços jurídicos não é algo escalável e ponto. Para haver escala, é preciso conseguir atender a um volume muito maior de demanda (clientes) sem aumentar proporcionalmente o custo com a estrutura. E esse é apenas um exemplo de incompatibilidade.

Quanto falamos na adoção de produtos tecnológicos prontos e não customizáveis, como o modelo conhecido como Software as a Service (SaaS), observa-se uma tendência de subutilização. Isso não ocorre por falta de qualidade dessas ferramentas, mas por uma deficiência na capacitação das equipes e na integração desses sistemas aos fluxos e processos já existentes. Para que a tecnologia seja eficaz, é preciso investir em treinamento, gestão de conhecimento e estruturação dos dados.

Abordar a tecnologia com uma mentalidade aberta e adaptativa é o que vai diferenciar os escritórios que realmente inovam dos que apenas seguem a multidão.

Os escritórios de advocacia no Brasil têm o potencial não só de alcançar, mas de ultrapassar os padrões internacionais em inovação e eficiência. Mas para isso, precisamos jogar o jogo da gestão com maestria. Afinal, em breve os modelos de IA Generativa estarão tão avançados que a diferença entre o sucesso e o fracasso na implementação terão uma relação de causalidade com o nível de maturidade em gestão de cada negócio.

Fernando Gomes Xavier é advogado e empreendedor. Especialista em Finanças pela COPPEAD-UFRJ e em Gestão de Escritórios pela Fordham University. Fundador e CEO da FGX Legal Management, empresa de consultoria em gestão especializada em escritórios de advocacia, com dezenas de clientes por todo o Brasil, com mais de 20MM de receita gerada e quase 500 horas de imersão presencial nos projetos. Foi fundador e CEO da BuscaJuris, plataforma de pesquisa jurídica com inteligência artificial, utilizada por mais de 100 mil advogados e escolhida pela OAB como ferramenta oficial da advocacia. Foi fundador do Lawtech Hub, primeiro hub de direito e inovação da América Latina. Foi sócio da Future Law, CEO do Future Law Studio, Consultor de Business Development e Head de inovação em escritórios. É investidor-anjo, membro do pool do Investidores.vc e Board Advisor certificado pelo Anjos do Brasil.

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