A mais antiga juíza da Suprema Corte dos Estados Unidos, Ruth Bader Ginsburg, faleceu recentemente aos 87 anos e deixa um vasto legado que é oportuno revisitar neste momento em que os temas diversidade e inclusão ganham tanta relevância no Brasil e no mundo. O movimento contra a discriminação por raça, gênero, orientação sexual, credo ou deficiência ganha evidência ao redor do mundo, ao mesmo tempo em que as consequências econômicas da pandemia do covid-19 se distribuíram de maneira assimétrica ao longo e ao largo da sociedade, expondo muito claramente a necessidade de persistirmos e avançarmos no caminho da inclusão social, para corrigir diferenças e expandir o exercício pleno da cidadania.
A juíza Ruth Bader Ginsburg ocupou uma das nove cadeiras da Suprema Corte norte-americana por 27 anos. Foi a segunda mulher a integrar a corte máxima. Este pioneirismo e suas posições firmes e fundamentadas fizeram dela um símbolo em defesa dos direitos civis. Essa foi a principal bandeira de sua carreira, iniciada nos anos 1960 como advogada militante da defesa notadamente dos direitos das mulheres, e, posteriormente, como juíza federal. Ela foi, por exemplo, a responsável pela admissão de mulheres, em 1996, no Instituto Militar da Virgínia.
Apesar de seu espírito combativo, ela se destacou pela maneira elegante com que se relacionava com os pares e pelo tom respeitoso com que expunha pontos de vista contrários aos de seu interlocutor. Situava o debate no campo intelectual das ideias e da sociedade em permanente movimento, sem render-se a conflitos pessoais.
Seu legado é atualíssimo, sobretudo porque é longa a marcha pela consolidação dos direitos. É certo que muito temos avançado no reconhecimento e proteção aos direitos civis, mas este é um processo dinâmico. O contrato social que nos rege é um retrato da própria sociedade em movimento e contempla em seu interior todas as diferenças e todas as aspirações individuais e coletivas e suas interações. O Estado de Direito estabelece o arcabouço dos direitos civis e do exercício da cidadania, mas um fenômeno novo e promissor de destaca: o engajamento das empresas privadas pela diversidade e inclusão. Isto significa reconhecer as diferenças que ainda remanescem na sociedade e a necessidade de avançar para superá-las no ambiente do trabalho, da educação, da vida social.
Permitam-me fazer referência ao exemplo da Fiat Chrysler Automóveis (FCA) que, como tantas outras empresas, iniciou sua jornada para ampliar as ações de diversidade e inclusão, na perspectiva de promover no ambiente corporativo maior diversidade e respeito às diferenças. Entendemos que é um imperativo contemporâneo as empresas refletirem em seus quadros a composição da própria sociedade, para melhor refleti-la e atendê-la. Em novembro de 2019, a FCA lançou seu posicionamento de diversidade e inclusão, formando simultaneamente comitê composto por pessoas de múltiplas áreas, a fim de desenvolver políticas internas em relação a gênero, raça, credo, orientação sexual e pessoas com deficiência (PcDs). Essas ações se relacionam, entre algumas frentes, com o desenvolvimento de talentos que fazem parte de grupos de minorias para assumir funções de liderança, partindo de um grande levantamento demográfico e de ações afirmativas para promoção de carreira.
A diversidade enriquece as relações sociais e de trabalho. Equipes mais conscientes, múltiplas e livres de preconceitos tendem a ser mais inovadoras, certamente porque enxergam os problemas e as oportunidades de distintos pontos de vista. Estamos convencidos de que maior diversidade e inclusão nos levarão a ser uma empresa mais competitiva.
Para dar concretude a essa política, foram revistos os processos de seleção e contratação de pessoal, a fim de equalizar as oportunidades de acesso a todos, independentemente de gênero, etnia, orientação sexual, credo e deficiência. Da mesma forma, o desenvolvimento de carreiras também está evoluindo para assegurar que todas as pessoas sejam verdadeiramente incluídas, não só os novos profissionais, mas aqueles que já estão dentro da organização, para galgarem postos de maior expressão. Cito o exemplo corporativo para destacar que a evolução da sociedade não depende exclusivamente do acervo de leis que regem as relações, mas precisa da ação coletiva para efetivamente enraizar-se nas múltiplas instâncias do cotidiano através de portas como o mundo do trabalho.
A evolução e o progresso são obras coletivas, nas quais o engajamento de cada um faz diferença. Essa crença é parte do legado da juíza Ruth Bader Ginsburg, ela sintetizou sua visão de mundo: "Eu gostaria de ser lembrada como alguém que usou todo o talento que tinha para fazer seu trabalho da melhor maneira possível. E para ajudar a reparar as divisões em sua sociedade e tornar as coisas um pouco melhores por meio do uso de qualquer habilidade que ela tivesse".