O Contencioso da LGPD | Análise
Análise

O Contencioso da LGPD

Por Ricardo Oliveira, sócio do COTS Advogados

29 de July de 2021 8h

A Lei 13.709/2018, mais conhecida como Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD), é um dos temas mais falados nos últimos tempos. Não é por acaso: o ineditismo da lei obrigou a sociedade brasileira como um todo a se preocupar sobre o que são e como são tratados os dados pessoais.

Um reflexo natural que a LGPD gerou foi a judicialização de demandas. Isso porque, não apenas os titulares foram contemplados com direitos a serem exercidos contra os agentes de tratamento (controladores e operadores), como também, por conta da organização sistêmica oferecida pela nova lei, autoridades vinculadas aos interesses sociais e dos titulares se encontram habilitadas a buscar o Judiciário para combater o tratamento indevido de dados pessoais quando realizado de forma maciça, como é o caso do Ministério Público, Procon, Idec, etc.

Sobre o prisma das empresas, a judicialização das demandas pode condenar o negócio à falência. Explicamos: o tratamento de dados pessoais geralmente está vinculado a um processo, ou seja, um ciclo de ações repetitivas que buscam um único resultado. Tal processo poderia estar vinculado ao core business da empresa, como seria o caso de empresas que atuam com tratamento de dados pessoais no oferecimento de produtos ou serviços ao mercado, ou em seu backoffice, ou seja, a realização de tratamento de dados pessoais com foco em suas atividades de sustentação de negócio, como é o caso dos Recursos Humanos.

Em ambos os casos (tratamento de dados pessoais no core business ou backoffice), o processo geralmente atinge mais de um titular. O birô de informações, por exemplo, só tem seu valor como negócio quando dispõe de uma massa considerável de dados, ou seja, seus processos de negócio atingem um número alto de titulares. Por outro lado, uma grande indústria que, eventualmente, implementa a concessão de benefícios por meio de compartilhamento de dados pessoais, também atua com público considerável. Raramente uma empresa implementará um processo para o tratamento dos dados de um único titular.

De outra ponta, as autoridades também estão iniciando sua jornada de aprendizado quanto à LGPD, o que resultará em decisões nem sempre acertadas. Isso aconteceu na União Europeia, por exemplo, onde algumas decisões de autoridades locais geraram verdadeiras aberrações interpretativas e trouxeram impactos negativos aos seus jurisdicionados.

Sendo assim, o que aconteceria, por exemplo, se houvesse uma ação judicial isolada questionando um tipo de tratamento de dados pessoais inserido em um processo empresarial? Uma decisão desfavorável sobre a licitude do tratamento poderia se replicar a um público considerável de titulares e contaminar decisões judiciais futuras em processos judiciais com a mesma matéria. Se, por exemplo, um banco é condenado por desvio de finalidade no tratamento de dados pessoais de seus clientes, isso em uma ação individual, o que impediria os demais clientes que estivessem na mesma situação de ingressarem com ação própria para discutir a mesma matéria? E o que impediria a autoridade judicial de decidir de forma igual e em desfavor da empresa? O que impediria os demais empregados de uma empresa de ingressarem com ação judicial questionando, por exemplo, o compartilhamento de seus dados pessoais com terceiros, se o colega teve uma decisão favorável em seu processo?

A replicações de ações não é um tema novo no Judiciário. Tanto é assim, que o Código de Processo Civil estabelece regras para tais demandas, como as do seu artigo 12, por exemplo. A necessidade de regular a atuação jurisdicional se deu por conta de ações semelhantes com os mesmos temas, especialmente no caso de consumidores ou públicos homogêneos com a mesma necessidade.

Sendo assim, e caminhando para nossa conclusão, as empresas devem se atentar ao tratamento de demandas judiciais que versem sobre a LGPD. Não se pode tratar tais demandas com desprezo ou lançá-las em uma vala comum, juntamente com aquelas ações já triviais e de conhecimento dos profissionais envolvidos. Atualmente todas as demandas sobre LGPD são relativamente novas, pois não se formou jurisprudência sobre elas, ou seja, o corpo jurídico das empresas, as autoridades em geral e os juízes estão formando seu convencimento nesse exato momento, e muita reflexão ainda terá que ser feita.

Não é o momento de economia no tratamento de ações judiciais que versem sobre LGPD. Querer economizar agora pode resultar na contratação de profissionais não especializados que poderão comprometer o resultado de ações futuras. Costumamos dizer aos nossos clientes que as primeiras ações judiciais precisam ser derrubadas com "tiros de bazuca", ou seja, com todo o esforço possível para que não se crie precedentes contra a empresa, o que, a médio e longo prazo, consumiram muito mais recursos do que fazer um bom trabalho nesse momento inicial.

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