A crescente sofisticação das organizações criminosas, que cada vez mais buscam mimetizar estruturas empresariais legítimas, representa um risco concreto e crescente para empresas de todos os portes e setores.
Longe de serem exceções, as tentativas de infiltração por meio de empresas de fachada, contratos simulados, estruturas societárias opacas ou operações financeiras atípicas têm se tornado parte do cotidiano empresarial, exigindo uma postura proativa, técnica e multidisciplinar das corporações. Mais do que um desafio de compliance, trata-se de um problema que atinge a governança, a reputação e a própria sustentabilidade dos negócios.
A atuação do crime organizado nas esferas econômicas formais tem se mostrado cada vez mais sutil. Hoje, essas organizações abandonaram a informalidade ostensiva e passaram a operar por meio de mecanismos empresariais sofisticados, estruturando negócios, contratos e relações comerciais de aparência legítima, mas que, na prática, são utilizadas para lavar dinheiro, ocultar patrimônio, movimentar recursos ilícitos ou influenciar setores estratégicos da economia.
Em muitos casos, o que se vê é um padrão repetido de comportamento: alterações societárias sem justificativa plausível, entrada de sócios com perfis incompatíveis com o setor de atuação, uso de laranjas ou parentes de investigados como administradores, operações financeiras em dinheiro acima da média do mercado, envio de recursos para paraísos fiscais sem propósito comercial definido, entre outros elementos que, somados, configuram fortes sinais de alerta.
Vale lembrar que a omissão, ou a chamada "cegueira deliberada", dos gestores diante desses indícios pode gerar riscos de responsabilidade penal, administrativa e civil. Ignorar sinais claros de irregularidade, sobretudo quando recorrentes, não isenta a empresa, muito menos seus dirigentes, das consequências legais e reputacionais, pelo contrário.
O crescente avanço tecnológico empregado pelos órgãos oficiais de controle e accountability tem evidenciado que o dinheiro precisa ter lastro, justamente para não contaminar receitas lícitas com outras de origem duvidosa ou ilícita. A idoneidade dos processos internos de compliance, com isso, assume um papel central para assegurar a credibilidade dos resultados financeiros. Nunca ficou tão evidente o impacto econômico gerado pelo compliance, ao menos no Brasil, como diante dos inúmeros episódios públicos de infiltração do crime organizado em setores de negócios cuja confiança é um dos mais importantes pilares de sustentação.
E, nessa linha, o monitoramento robusto e a análise aprofundada do perfil e do histórico dos stakeholders convergem para apoiar as estratégias de negócio e proteger a reputação empresarial. Também é um momento oportuno para a melhoria do diálogo entre instituições públicas e privadas, unindo esforços em torno de fluxos de mercado (e de comunicação) mas transparentes, equilibrados e sustentáveis. Uma cultura corporativa baseada em padrões éticos claros, que investiga, corrige e reporta irregularidades, fomenta um ambiente hostil à criminalidade e, por isso mesmo, mais seguro para os negócios e para as pessoas.
Rodrigo Sardenberg é advogado da área de Compliance, Investigações Corporativas e Penal Empresarial do FAS Advogados in cooperation with CMS
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