O contexto atual das contratações públicas está inserido em um mundo caracterizado pelo conceito de VUCA (volatilidade, incerteza, complexidade e ambiguidade). Esse cenário exige que governos adotem novas estratégias para lidar com desafios emergentes, como mudanças tecnológicas aceleradas, novas demandas sociais e restrições orçamentárias.
É fato que Startups e empresas de base tecnológica desempenham um papel central ao trazer soluções disruptivas, no entanto, para que essas inovações sejam incorporadas às políticas públicas, é fundamental o conhecimento do arcabouço jurídico existente e suas derivações.
Nesse sentido, a Lei Complementar nº 182/2021 (Marco Legal das Startups) representa um avanço ao estabelecer normas que facilitam a contratação de startups pelo poder público e flexibilizam procedimentos administrativos para permitir a adoção de soluções inovadoras.
Tanto as empresas quanto o Poder Público devem aproveitar os avanços legislativos para, em conjunto, potencializar seus benefícios e estimular um ambiente de crowd in, no qual o investimento público impulsiona a participação e os investimentos do setor privado.
Esse efeito positivo favorece o crescimento econômico, fomenta a inovação e viabiliza a solução de desafios sociais complexos. Esse movimento ocorre dentro de um marco regulatório que moderniza e flexibiliza um sistema de contratação historicamente marcado pelo excesso de burocracia e rigidez. Além disso, ao reduzir a cultura de responsabilização punitiva excessiva, cria-se um ambiente mais seguro e propício à inovação na prestação de serviços públicos, incentivando contratações privadas estratégicas e ampliando o impacto das políticas públicas.
E, dentre os instrumentos disponíveis para promover essa inovação, destaca-se o Contrato Público para Solução Inovadora (CPSI), introduzido pelo Marco Legal das Startups. Esse mecanismo viabiliza a experimentação de soluções inovadoras no setor público, possibilitando o desenvolvimento de novas tecnologias e processos que atendam às necessidades governamentais sem comprometer a segurança jurídica dos gestores.
A inovação é, por natureza, um processo incerto. Diferentemente das contratações tradicionais, nas quais os requisitos e os resultados esperados são bem definidos, os contratos para inovação envolvem risco tecnológico e incerteza quanto à viabilidade das soluções propostas.
O CPSI é estruturado para mitigar esses riscos ao permitir a realização de testes experimentais, sem a obrigatoriedade de sucesso imediato. Essa abordagem é fundamental para estimular a criação de soluções inovadoras sem penalizar gestores públicos e fornecedores por eventuais falhas inerentes ao processo de inovação.
Infelizmente, o Brasil ainda ocupa uma posição modesta no Índice Global de Inovação. Apesar de refletir avanços em setores como tecnologia da informação, agronegócio e biotecnologia, denota-se a existência de muitas barreiras estruturais, como baixa eficiência em transformar pesquisa acadêmica em produtos comercializáveis e dificuldades na adoção de inovações pelo setor público.
E as CPSIs representam uma estratégia essencial para melhorar esse desempenho, pois podem criar demanda para soluções tecnológicas desenvolvidas no país e estimular a competitividade das empresas brasileiras no mercado global a partir de: experimentação regulada, permitindo que soluções sejam testadas antes da adoção definitiva; mitigação de riscos, evitando a responsabilização de gestores públicos por falhas inerentes ao processo de inovação; estímulo ao desenvolvimento tecnológico, criando um mercado para soluções inovadoras.
E, portanto, a sua adoção representa uma grande oportunidade para modernizar a administração pública e impulsionar o ecossistema de inovação no Brasil, gerando melhoria da eficiência dos serviços públicos, fortalecimento do setor de tecnologia nacional e maior competitividade econômica.
Guilherme da Costa Ferreira Pignaneli é sócio no escritório Ernesto Borges Advogados, atua na área de Legal Operation. Autor do livro "Análise Econômica da Litigância". Graduado pela PUC-PR Especialização LLM em Direito Empresarial FGV/RIO; Mestre em Direito Econômico e Socioambiental PUC/PR.
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