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Compliance Antidiscriminatório…se ainda não conhece…corra!

Por Fabiano Machado da Rosa, sócio fundador do Petri & Machado da Rosa Advocacia

20 de February de 2024 16h26

No universo jurídico há fenômeno que acontece de tempos em tempos e gera um conjunto incrível de oportunidades para escritórios de advocacia de todos os portes: o surgimento de uma nova área regulada que gera impactos transversais no mercado como um todo. Antes mesmo de entrar no centro do nosso artigo, nos permitam dois exemplos acerca dessa afirmação.

Com advento da Constituição de 1988, promulgada há 35 anos atras, todo um arcabouço jurídico e institucional foi criado com o objetivo de proteger o meio ambiente. Ainda não se falava em sustentabilidade ambiental ou crise climática, mas por certo a proteção e a preservação ecológica ganhava primazia e impacto econômico com o Direito Ambiental.

Recentemente, temos certeza de que você leu e ouviu (muito) sobre o surgimento da Lei Geral de Proteção de Dados - intimamente conhecida como LGPD - e a regulação dela derivada nessa área que representa o centro da corrente revolução tecnológica humana.

Em comum, trata-se de dois exemplos de conjuntos normativos que excedem o habitual âmbito de impacto de uma nova norma. Mormente adstritas à áreas especificas da atividade jurídica e econômica, ao contrário, nesses casos, são normas que pela relevância, atualidade e, porque não dizer, urgência criam um senso generalizado de importância que obriga a tudo e a todos à necessária adaptação e observância.

Falamos nesse artigo de mais um desses exemplos disruptivos: o compliance, como gênero acompanhado de suas espécies.

Compliance, modernamente, pode ser compreendido como um sistema complexo transversal que dota a organização de  metodologias, ferramentas e frameworks de controles que visam a prevenção e detecção de condutas criminosas, ilegais ou antiéticas no ambiente interno da organização.

Mais do que nunca, quando o paradigma se coloca no âmbito de condutas humanas - com todas as veleidades e subjetividades intrínsecas - podemos apontar para uma forma contínua de comunicação, estímulo, educação, treinamento e engajamento do conjunto da organização, em todos os seus níveis, a fazer o que é correto, lícito e ético, fomentando um ambiente de integridade, pela via dos reforços positivos quanto à vontade de "fazer o que é certo" ou dos reforços negativos quanto à conduta de "fazer o que não é certo", por meio da ameaça de punição.

Em sua primeira onda, o compliance se ocupou, de forma quase sinonímica do salutar combate à corrupção e condutas atinentes às fraudes financeiras, fraudes contábeis e demais práticas no âmbito monetário. Todavia, defendemos que a percepção de corrupção apenas nesse diapasão é, ao mesmo tempo, reducionista e temerária.

A etimologia do termo "corrupção" partir do latim "corruptus" como sendo o ato de quebrar aos pedaços, decompor ou deteriorar algo. Uma organização que permita que sua cultura interna seja maculada por vieses preconceituosos ou práticas discriminatórias contra as pessoas é, por definição, um ambiente de corrupção e corrompido.

O ambiente de negócios está diante de novos tempos, felizmente, de mudanças sociais, de novos sujeitos, de novos direitos e formas de organização. As novas gerações chegam ao mercado - de trabalho e de consumo -  com novas mentalidades.

Grupos sociais que por muito tempo foram  invisibilizados e silenciados, em sociedades marcadas pela estruturalidade de práticas preconceituosas foram (ou ainda são em muitos casos) aceitas, toleradas e naturalizadas estruturalmente; passam a exercer pressões inovadoras por tutelas protetivas gerando, ao mesmo tempo, novas oportunidades e novos riscos.

A valorização da diversidade como um ativo imprescindível de nossos tempos para o ambiente de negócios; a compreensão de que a agenda ESG é uma realidade inevitável; a dialogicidade com uma nova geração pautada por novos valores humanos; a certeza de que a economia e as formas de produção sofrerão adaptações face aos desafios da sustentabilidade; a revolução absoluta cognitivo-comportamental provocada pela inteligência artificial são  traços de um novo caminho para a humanidade.

Nesse ponto, a grande onda do Compliance - como gênero - hoje é a espécie do Compliance Antidiscriminatório pelo qual um novo paradigma de valorização da diversidade (como ativo organizacional) perpassa todos os pilares, processos e políticas de um programa de compliance moderno que se proponha efetivo.

Dentre outros pontos, o Compliance Antidiscriminatório, como campo autônomo, auxiliará as organizações prioritariamente na:

(a) Garantia do respeito à diversidade;

(b) Promoção do convívio marcado pelo respeito e pela segurança;

(c) Consolidação de uma cultura interna fundada na ética e nos direitos humanos;

(d) Fomento de um espaço não-violento de acolhimento da multipotencialidade das diferenças e estímulo do livre desenvolvimento da personalidade;

(e) Sistematização de políticas corporativas que objetivem à equidade, dentre outras contribuições.

Na era da Agenda ESG (um nova revolução em curso), realidade estável e estrutural para o mundo dos negócios, a sustentabilidade ambiental no contexto do aquecimento global terá a força de converter a matriz econômica mundial nas próximas décadas; empresas sem governança serão aniquiladas do jogo concorrencial com maior rapidez a cada novo ciclo de tecnologias exponenciais; e, no centro de tudo, o "S" da agenda significará direitos humanos, democracia, equidade, inclusão, acesso, igualdade e respeito à dignidade da pessoa humana. Nesse ponto, o Compliance Antidiscriminatório será um divisor de águas entre as organizações que entenderam e adaptaram suas culturas internas das organizações que, ao não compreenderem os tempos atuais, simplesmente serão varridas do mapa.

Fabiano Machado da Rosa é sócio fundador do Petri & Machado da Rosa Advocacia (PMR), possui pós-graduação em Direito Constitucional pela Faculdade de Lisboa (PT), e em Compliance na área de saúde pelo Instituto de Ensino e Pesquisa do Hospital Sírio-Líbanes; completou sua especialização com o curso de Compliance oferecido pela Universidade de George Washington (EUA). Além de advogado, é professor universitário e palestrante.

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