A revolução verde necessita do amparo do Direito Agrário e do Direito do Agronegócio | Análise
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A revolução verde necessita do amparo do Direito Agrário e do Direito do Agronegócio

Por Adauto do Nascimento Kaneyuki, sócio-fundador do escritório J. Ercílio de Oliveira Advogados

17 de February de 2022 11h08

Não é segredo para ninguém que o agronegócio tem sido, ao longo dos últimos anos, a principal atividade econômica do Brasil que representa mais de 25% do PIB e o principal fator de equilíbrio da balança comercial. Aliás, para se ter ideia da importância desta atividade, faz-se necessário registrar que a segurança alimentar mundial depende muito do sucesso do agronegócio brasileiro, que precisa ter crescimento anual constante sob pena de causar crise de desabastecimento alimentar.

Obviamente que o crescimento da produção agropecuária deve respeitar as regulamentações ambientais, e assim tem sido ao longo dos últimos anos, até porque o país ainda tem áreas rurais em abundância que permitem a abertura de novas áreas produtivas de maneira legal e, principalmente, porque utilizamos as melhores técnicas agrícolas que permitem o crescimento de produção por hectare.

Diante da inquestionável importância da agricultura e da pecuária na esfera econômica e social do país, é extremamente necessário que o Direito Agrário e o Direito do Agronegócio também acompanhem o desenvolvimento com a mesma fluidez e velocidade. Afinal, com o crescimento exponencial desta atividade, torna-se cada vez mais relevante que os negócios jurídicos sejam amparados por uma legislação moderna, fazendo com que novos investidores mundiais se sintam tão atraídos pela pujança do nosso agronegócio, quanto seguros pelos nossos mecanismos jurídicos.

Entrando nesta seara jurídica, é fundamental detalhar a diferença entre o Direito Agrário e o Direito do Agronegócio que, à primeira vista, parece tratar-se de uma mesma matéria.

O Direito Agrário regulamenta as atividades do homem com a terra, fundamentada especialmente no Estatuto da Terra (Lei 4.504/1964), no Decreto 59.566/1966 que serve de lei regulamentar de parte do Estatuto da Terra, nos artigos 184 a 191 da Constituição Federal, no Código Florestal e nas leis ambientais estaduais.

Tratando-se de um país com extensão continental, o que não faltam são discussões teóricas acaloradas sobre a utilização da área rural, em busca do enquadramento da função social da propriedade que, em suma, consiste na correta utilização econômica da terra e na sua justa distribuição, atendendo acima de tudo o bem-estar da coletividade. Não se pode perder de vista a importância social do pequeno produtor e da pequena propriedade rural que, dentro do Direito Agrário, possuem uma justa e adequada proteção legal em respeito à agricultura familiar de subsistência.

É evidente que as discussões sobre o uso da terra agrícola pelo homem não se limitam às questões sociais. Existem diversas questões econômicas, tributárias e do uso da terra concedido a terceiros (arrendamento rural e parceria agrícola) que também são amplamente abordadas pela nossa legislação.

Se, por um lado, o Direito Agrário trata da relação quase exclusiva entre o homem do campo e a área rural, por outro lado, o Direito do Agronegócio trata, de maneira ampla, toda a relação jurídica que envolve a cadeia de negócios relacionadas à agricultura e à pecuária.

O agronegócio pode ser conceituado como um feixe de cadeias produtivas definidas como uma sequência coordenada que, a partir do financiamento destinado ao produtor rural, lhe permite adquirir insumos agrícolas fabricados por indústrias e comercializados pela própria empresa fabricante ou por distribuidoras espalhadas pelo país. Neste sentido, por meio da aplicação adequada dos insumos agrícolas, o produtor rural consegue obter produção agrícola satisfatória a ser comercializada no mercado interno para a agroindústria nacional ou no mercado internacional.

Veja que a engrenagem dessa máquina envolve relações jurídicas, das mais simples até as mais complexas, sendo necessário, portanto, acompanhamento técnico jurídico preventivo e conhecimento técnico jurídico específico para defender direitos em demandas judiciais ou até mesmo por arbitragem.

Além das questões jurídicas do Direito Agrário, o Direito do Agronegócio abrange também todos os princípios do Direito Empresarial, pois as relações envolvem operações comerciais entre empresas e instituições na compra ou venda de insumos agrícolas, entre empresas na compra ou venda dos produtos agrícolas, análise da tributação sobre essas operações mercantis ou financeiras, análise jurídica sobre importação de matérias-primas ou exportação de produtos rurais e, ainda, o conhecimento jurídico sobre as estruturações de negócios junto ao mercado de capitais.

Todavia, existem algumas peculiaridades do agronegócio que apenas um advogado especialista pode se atentar. Por exemplo, a possibilidade de pedido de Recuperação Judicial do produtor rural, fato este que muito assustou o mercado financiador, mas que, de certa forma, foi contornado por meio de bons contratos e garantias formuladas por advogados especialistas.

Podemos dizer que o início desta "Revolução Verde" começou ao final da década de 70, quando o Governo Federal decidiu investir com mais intensidade no financiamento agrícola, concedendo juros atrativos para a modernização da agricultura ou até mesmo subsidiando algumas culturas inicialmente.

Com esse incentivo inicial, houve uma evolução científica e tecnológica nas diversas culturas, resultando no crescimento do setor. Assim, o financiamento público passou a ser insuficiente para atender as necessidades do campo. Na sequência, as indústrias fabricantes e fornecedoras de insumos agrícolas passaram a participar do financiamento agrícola juntamente com as instituições financeiras privadas e atualmente há um interesse e concorrência enorme entre instituições do mercado financeiro e mercados de capitais para financiar o agronegócio como um todo.

Todo esse apetite no investimento do agronegócio é resultado do sucesso da atividade agrícola brasileira, que é mundialmente reconhecida, juntamente com a modernização da nossa legislação. Recentemente, houve a introdução em nosso ordenamento jurídico da chamada "nova lei do agro" que contém a inclusão de novos institutos jurídicos de garantia específicas do agro, a atualização de leis criadas em décadas anteriores (especialmente sobre a Cédula de Produto Rural - título mais utilizado no setor) e a inclusão de conceitos modernos do Direito, que permitem a desburocratização, desestatização e digitalização do sistema.

Para quem acompanha o agronegócio à distância, pode ficar a falsa impressão de que tudo são flores para quem participa desta cadeia. Mas, na realidade, é bastante desafiador obter sucesso na concessão de crédito ao produtor rural, à agroindústria ou, até mesmo, na compra antecipada de produtos rurais, que dependem de uma série de fatores.

Por se tratar de uma "usina a céu aberto", a boa produção depende de fatores climáticos. Além disso, um dos fatores de preocupação é a volatilidade do preço do produto rural e do câmbio, que muito interfere na lucratividade do negócio. De fato, o agronegócio traz uma série de oportunidades ao investidor nacional ou internacional; contudo, é necessário fazer uma prévia e cautelosa gestão de risco.

Não há dúvida de que as perspectivas do agronegócio para esta safra e para o futuro são maravilhosas, seja pelo crescimento tecnológico dos produtores rurais, usinas e agroindústrias, seja pela profissionalização da camada estrutural. Ainda existem, é claro, uma série de desafios estruturais a serem melhorados por parte do Governo; no entanto, os pequenos ajustes já realizados na legislação já foram suficientes para aumentar o interesse do mercado mundial em financiar o agronegócio brasileiro. A procura de financiamento por meio de mercados de capitais continua crescendo em progressão geométrica, assim como tem aumentado muito nos últimos anos o interesse na compra de empresas nacionais do agronegócio por fundos investidores e empresas internacionais.

É fato que o atual investidor do agronegócio está cada vez mais exigente em relação ao respeito ao meio ambiente e às aplicações de política de compliance e ESG. Observa-se, de maneira positiva, que o produtor rural brasileiro está muito bem amparado neste quesito, até porque a nossa Legislação Ambiental é uma das mais modernas e rigorosas do mundo no tocante ao respeito de reserva legal, de áreas de preservação permanente próximas a rios e lagos, proteção às áreas florestais e regras de controle de queimadas. Ademais, a fiscalização por meio do INCRA é possível ser realizada por satélite, graças à obrigatoriedade legal do Cadastro Ambiental Rural (CAR) de toda propriedade rural e a obrigatoriedade da realização de georreferenciamento (instrumento utilizado para padronizar e identificar um determinado imóvel rural) sobre toda área rural.

Para que essa "Revolução Verde" continue a crescer de maneira robusta, é preponderante a aplicação adequada do Direito Agrário e do Direito do Agronegócio, a fim de regular o agronegócio e garantir a segurança jurídica aos envolvidos. Por isso, mais do que nunca, a presença de um profissional do Direito especializado, no momento da decisão estratégica, é fundamental.

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