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Análise

A liderança feminina na advocacia

Por Débora Pimentel, sócia do Pimentel e Fonti Advogados

3 de December de 2020 10h09

Comecei a trabalhar na advocacia criminal na década de 90, um tempo em que o Direito Penal não tinha a sofisticação dos dias atuais. A Polícia Federal funcionava em um mal-ajambrado edifício no centro de São Paulo, com um elevador que vez ou outra despencava alguns andares, quase matando a gente de susto. O Direito Penal era um território um tanto hostil e quase completamente dominado por homens.

Felizmente, testemunhei a rápida evolução do Direito Penal Empresarial, modernizado por novas técnicas de investigação, acordos negociais e regras de compliance. Repaginada, a área criminal hoje é bem mais técnica e transparente, e, não por acaso, as mulheres começaram a assumir cada vez mais destaque.

Há quase dez anos sou sócia de um escritório liderado por mulheres e observo ao meu redor que o poder feminino nunca esteve tão em alta, com advogadas se destacando em cargos de chefia. Nos escritórios de advocacia com visão mais moderna, essa é uma realidade que vem ganhando força. Mulheres têm ocupado cargos de liderança em bancas renomadas e, com suas habilidades femininas, potencializam a gestão e a produtividade.

A consultoria empresarial Mckinsey constatou que empresas lideradas por mulheres aumentam em 21% as chances de atingir resultados financeiros acima da média. A mesma consultoria constatou que empresas com maior número de mulheres em seus conselhos de administração são mais lucrativas. Outro estudo, feito pela Organização Internacional do Trabalho com 14 mil empresas, aponta que companhias com políticas de equidade de gênero têm resultados melhores.

Os estudos estatísticos vêm apenas reforçar o que as mulheres à frente da advocacia de ponta há anos percebem no seu dia a dia. Inicialmente, bem me recordo, a resistência frente a mulheres nas delegacias, fóruns e afins era sensível e gritante. Era preciso uma dose extra de paciência e habilidade, mas toda a resiliência valeu a pena com o advento, mesmo que ainda pequena, da pluralidade atual.

Acredito que hoje a questão central não se trata mais do embate entre os gêneros, mas sim de reconhecer e saber aproveitar ao máximo a força das características naturais presentes na diversidade. As aptidões múltiplas somam. Uma história dominada essencialmente por figuras de poder e de liderança masculinas não deixava isso transparecer como hoje. Ao conquistarmos nosso lugar, o reconhecimento da capacidade feminina é uma realidade atual.

Uma das propriedades essenciais, a meu ver, no sucesso da gestão feminina é exatamente a sensibilidade para percepção dessas características diversas. Saber reconhecê-las, abraçá-las e incentivá-las confere uma força incrível e impulsiona em grande parte o sucesso nos negócios de uma banca.

Assisti em primeira mão ao longo da minha carreira, juristas mulheres galgarem passos importantes - não sem alguma resistência, claro - e chegarem a cargos de gestão. Nos escritórios de advocacia criminal, em especial, o olhar feminino costuma produzir mais empatia, não só com a equipe, mas também com os próprios clientes. A vantagem direta desse comportamento é a criação de um ambiente mais acolhedor e democrático. Os reflexos são sentidos na performance da equipe liderada, que se sente mais valorizada e, consequentemente, motivada. Como reflexo, os clientes passam a ser atendidos de uma forma mais personalizada, completa e eficiente.

A representatividade na liderança estimula as novas gerações. Ao verem mulheres na liderança, as estagiárias e advogadas mais jovens se sentem representadas e percebem que também podem chegar lá.

Uma das barreiras ainda é conciliar a divisão das tarefas e desafios da maternidade. Parece absurdo, mas é comum que mulheres sejam demitidas ou tenham suas carreiras prejudicadas quando voltam de licença maternidade. No nosso escritório estabelecemos flexibilidade para administrar o tempo da melhor forma possível, sem diminuir o volume e a qualidade do trabalho apresentado, além de propiciar um ambiente acolhedor, que não obriga a mulher a optar pela criação dos filhos ou pelo seu crescimento profissional.

Ainda temos um longo caminho para percorrer, mas acredito na luta por condições estruturais melhores e ambientes cada vez mais humanos, diversos e integrados. A advocacia brasileira precisa se modernizar urgentemente. A aceitação da liderança feminina é apenas o primeiro passo.

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