Opinião | Análise
Análise

Decisão do STJ reforça segurança jurídica das Cooperativas de Crédito nas Recuperações Judiciais

Por Autor: Erick Christian Tomazine Silva

28 de October 15h52

A recente decisão da 3ª Turma do Superior Tribunal de  Justiça, no julgamento conjunto dos Recursos Especiais nº 2.091.441/SP e  nº 2.110.361/SP, confirmou que a concessão de crédito realizada pelas  cooperativas a seus associados caracteriza-se como ato cooperativo, não  estando sujeita aos efeitos da recuperação judicial.

No caso concreto, a 3ª Turma do STJ acolheu esse  entendimento por unanimidade. As cooperativas de créditos interessadas  impugnaram a inclusão de dívidas originadas por empréstimos concedidos  aos cooperados nos respectivos processos de recuperação judicial. As  instituições argumentaram que os contratos são decorrentes de atos  cooperativos e, portanto, não poderiam ser submetidos à recuperação  judicial.

Ao fundamentar seu voto, o relator, Ministro Ricardo  Villas Bôas Cueva, destacou que a concessão de crédito ao associado  integra a atividade-fim das cooperativas, nos termos do artigo 79 da Lei  nº 5.764/711. Dessa forma, esses contratos devem ser reconhecidos como atos cooperativos.

Com base nesse entendimento e considerando o disposto no parágrafo 13 do artigo 6º, introduzido pela Lei nº 14.112/20202,  tais créditos foram classificados como extraconcursais. Na prática,  isso significa que eles permanecem fora do alcance da recuperação  judicial, permitindo às cooperativas prosseguirem normalmente com  cobranças judiciais ou extrajudiciais, sem sofrer suspensão automática  de suas execuções.

A decisão do STJ põe fim às divergências que existiam  entre tribunais estaduais, empresas em recuperação e credores,  reforçando os avanços trazidos pela reforma da Lei nº 11.101/2005,  consolidando através deste precedente maior segurança jurídica às  operações típicas do cooperativismo de crédito.

A Lei nº 5.764/71, que regula o cooperativismo, define  atos cooperativos como aqueles realizados entre a cooperativa e seus  associados com o objetivo de atender às finalidades sociais previstas na  legislação. Nesse sentido, empréstimos e financiamentos oferecidos  pelas cooperativas de crédito a seus cooperados têm finalidade  eminentemente social e institucional.

A própria legislação enfatiza que tais operações não se  confundem com transações típicas de mercado, distinguindo-se, portanto,  das relações comuns entre instituições financeiras comerciais e  consumidores.

Além disso, com a reforma introduzida pela Lei nº  14.112/2020 na Lei de Falências e Recuperação Judicial, o dispositivo já  citado (art. 6º, § 13º) é expresso no sentido de que não

1 Art. 79. Denominam-se atos cooperativos os praticados entre as cooperativas e seus associados, entre estes e aquelas

e pelas cooperativas entre si quando associados, para a consecução dos objetivos sociais.

2 Art. 6º A decretação da falência ou o deferimento do processamento da recuperação judicial implica:

(…)

§ 13. Não se sujeitam aos efeitos da recuperação judicial  os contratos e obrigações decorrentes dos atos cooperativos praticados  pelas sociedades cooperativas com seus cooperados, na forma do art. 79  da Lei nº 5.764, de 16 de dezembro de 1971, consequentemente, não se  aplicando a vedação contida no inciso II do art. 2º quando a sociedade  operadora de plano de assistência à saúde for cooperativa médica. estão  sujeitos aos efeitos da recuperação judicial os contratos e obrigações  decorrentes dos atos cooperativos praticados pelas cooperativas com seus  associados.

Dessa forma, obrigações internas, como os empréstimos  entre cooperativa e cooperados, não devem ser incluídas nas discussões  judiciais nem integradas na relação de créditos a serem pagos conforme o  plano de recuperação apresentado pela recuperanda.

Ao excluir tais contratos do âmbito da recuperação  judicial, o legislador preserva a essência do cooperativismo, evitando  que medidas restritivas impactem negativamente os ciclos operacionais  das cooperativas. Isso porque, a sujeição desses atos poderia ameaçar  diretamente a operação e sustentabilidade do sistema, e assim, a  alteração legislativa tem o mérito de proteger o sistema cooperativista  frente ao aumento das demandas de recuperação judicial.

Portanto, o marco legislativo recente e agora o precedente  do STJ evidencia um reconhecimento formal das peculiaridades do modelo  cooperativista, visando garantir competitividade e estabilidade às  cooperativas diante dos grandes agentes do mercado financeiro.