A rigor, as demandas relacionadas a bens situados em território estrangeiro fogem à competência da jurisdição nacional, em razão de previsão legal (art. 23 do CPC), somada ao princípio da reciprocidade, adotado pelo ordenamento jurídico brasileiro.
No que se refere à partilha de bens, essa é a regra aplicada pelos nossos Tribunais na hipótese em que a pretensão decorra do falecimento de alguém que deixou bens no exterior. Nesses casos, o STJ entende que "(...) a lei brasileira não tem aplicação em relação à sucessão dos bens no exterior, inclusive para fins de eventual compensação de legítimas"[1] e "o inventário e a partilha devem ser processados no lugar da situação dos bens deixados pelo falecido"[2].
Já a hipótese de partilha de bens decorrente da dissolução de um vínculo conjugal ou convivencial (divórcio ou dissolução da união estável) recebe tratamento oposto. No ano passado, o STJ reafirmou o seu posicionamento acerca da possibilidade de a justiça brasileira partilhar os bens adquiridos no exterior pelo casal, "especialmente porque a eventual impossibilidade de execução da sentença brasileira com esse conteúdo em território estrangeiro é uma questão meramente hipotética, futura, incerta e estranha à partilha igualitária dos bens amealhados pelo casal na constância do vínculo conjugal e que pode ser contornada pela compensação de valores ou readequação dos bens que caberão às partes"[3].
Em 2017, a Corte já havia determinado a partilha de saldo existente em conta bancária no exterior, por entender que a regra da competência exclusiva se aplica apenas ao inventário causa mortis, e não à separação ou divórcio[4].
E, muito antes disso, nos anos de 2014[5] e 2003[6], o STJ já havia firmado entendimento pela inclusão dos valores dos bens adquiridos no exterior na partilha dos bens situados no Brasil, de modo a preservar a divisão igualitária de bens do ex-casal.[7]
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[1] REsp n. 2.080.842/SP, relator Ministro Marco Aurélio Bellizze, Terceira Turma, DJe de 29/8/2024.
[2] AgInt no REsp n. 2.107.540/SP, relatora Ministra Maria Isabel Gallotti, Quarta Turma, DJe de 19/6/2024
[3] AgInt nos EDcl no AREsp n. 1.948.597/SP, relator Ministro Moura Ribeiro, Terceira Turma, DJe de 15/5/2024.
[4] REsp nº 1.552.913/RJ, Rel.: Min. MARIA ISABEL GALLOTTI, Quarta Turma, DJe 02/02/2017.
[5] REsp nº 1.410.958, Rel.: Min. PAULO DE TARSO SANSEVERINO, Terceira Turma, DJe 27/05/2014.
[6] REsp nº 275.985/SP, Rel. Min. SÁLVIO DE FIGUEIREDO TEIXEIRA, Quarta Turma, julgado em 17/06/2003, DJ 13/10/2003.
[7] REsp nº 1.410.958, Rel.: Min. PAULO DE TARSO SANSEVERINO, Terceira Turma, DJe 27/05/2014.