As funções que demandam comunicação entre empregado e cliente exigem suporte tecnológico. Porém, ainda falta embasamento jurídico-legal no que diz respeito ao uso de celular particular para serviço.
O uso do celular particular para fins laborais é de amplo debate na esfera cível e trabalhista. É imperioso destacar que não há qualquer menção legislativa que assegure o dever da empresa e o direito do trabalhador quanto à temática.
Contraditório ao velho ditado de que "o direito está sob constante evolução", há zonas que caem em esquecimento e em que não há qualquer embasamento jurídico-legal para o pedido ou fundamentação em julgamentos.
Recentemente, a 43ª Vara do Trabalho de Belo Horizonte (MG) decidiu pela indenização de um trabalhador de um comércio atacadista que laborava com seu telefone particular para contatar clientes de seu empregador*. Para isso, ao fixar a condenação do comércio atacadista, o d. Juízo precisou interpretar amplamente o art. 2º da Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT), concomitantemente com a aplicação do princípio da alteridade.
Portanto, com uma decisão extremamente recente, é possível alertar ao legislativo quanto à deficiência na previsão de direitos e deveres em situações que não são mais incomuns na sociedade. É racional pensar que, se o empregador não exige a utilização do celular para trabalho, o mesmo não possui o dever de fornecer o aparelho e arcar com os custos. Isso, talvez, fosse insignificante anos atrás.
Tendo como base os dias atuais, os gastos com transportes - sejam eles de carro, ônibus ou aplicativo de corrida, combustível, trânsito, estacionamento e etc - consomem muito mais o tempo do trabalhador. Por óbvio, pensando na agilidade e produtividade, o trabalhador recorre aos meios de comunicação de alcance para tratar assuntos com os clientes responsáveis pelo faturamento do empregador.
Hoje em dia, todas as funções que demandam comunicação entre empregado e cliente exigem um suporte tecnológico para que possam ser resolvidas com brevidade. Ocorre que, em confronto com o art. 5º, II da Constituição Federal**, o empregador não pode e nem deve exigir do empregado que o mesmo utilize celular para realizar seu trabalho. A partir do momento em que o uso do celular é exigido, conforme entendimentos atuais, o empregador possui duas opções: conceder ao empregado um aparelho de celular, com o pagamento de todas as despesas advindas deste, ou indenizar integralmente o empregado pelos custos, quando este utilizar o celular particular para fins laborais.
A última hipótese levanta discussão também quanto à uma possível confusão nos assuntos pessoais e de trabalho do empregado, interferindo inclusive no horário de expediente. Por mais que o empregado esteja protegido pela Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT), a hierarquia é um forte alicerce na cadeia trabalhista e torna cristalino que uma mensagem de cliente no seu telefone pessoal, após o expediente, facilmente será respondida.
Pelo exposto, é possível verificar que existe uma carência nesta demanda do Direito, tanto de forma legislativa quanto jurisprudencial. Nas lides já enfrentadas, o Judiciário é levado a aplicar princípios e normas vagas, que não suprem a necessidade dos que recorrem à Justiça, tornando fato de que o Direito deve sempre se atualizar, prevendo quais são os limites a serem observados pelo empregador, para se estabelecer equilíbrio na relação com o empregado a fim de minimizar os riscos trabalhistas.
Referências:
** "Art. 5º [...] II - ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei;"