Em 2022, o Superior Tribunal de Justiça (STJ), consolidou um importante entendimento sobre a base de cálculo do Imposto Sobre Transmissão de Bens Imóveis (ITBI).
No julgamento do REsp 1.937.821/SP (Tema Repetitivo 1113), de relatoria do ministro Gurgel de Faria, a Corte estabeleceu que o ITBI deve ser calculado com base no valor do imóvel em condições normais de mercado, não estando vinculada à base de cálculo do IPTU.
Além disso, o STJ fixou que o valor da transação declarado pelo contribuinte nessas operações goza da presunção de que é condizente com o valor de mercado, e que o município não pode arbitrar previamente a base de cálculo do ITBI com respaldo em valor de referência por ele estabelecido unilateralmente.
Em que pese o entendimento firmado pela Corte, muitos municípios continuam arbitrando, por conta própria, o valor do imóvel para fins de cálculo do ITBI, desconsiderando o valor real da operação envolvendo o bem e ignorando, assim, o entendimento fixado pelo STJ sobre o tema.
Por essa razão, muitos contribuintes têm recorrido ao Poder Judiciário para contestar o arbitramento do valor de referência pelos municípios na base de cálculo do ITBI.
Não raras vezes, esses valores excedem, tanto o valor de mercado do imóvel, quanto o montante efetivamente negociado na operação, resultando em uma tributação superior ao de fato devido pelos contribuintes.
Entenda:
O ITBI, tributo municipal incidente sobre a transmissão onerosa da propriedade de bens imóveis, tem sua base de cálculo definida pelo artigo 38 do Código Tributário Nacional (CTN), que menciona o "valor venal dos bens ou direitos transmitidos", assim considerado o valor em condições normais de mercado para transmissões imobiliárias.
Da mesma maneira, o artigo 33, do CTN, se utiliza da expressão "valor venal do imóvel" para delinear a base de cálculo do Imposto sobre a Propriedade Predial e Territorial Urbana (IPTU).
Ao analisar o tema, o STJ ressaltou que, apesar de o Código Tributário Nacional (CTN) prever como base de cálculo para o IPTU e para o ITBI o seu "valor venal", os critérios para sua aferição do referido elemento quantitativo são distintos para cada um dos tributos.
Com efeito, enquanto o IPTU se baseia em um valor tabelado e padronizado pela Planta Genérica de Valores (PGV), critério aprovado pelo Poder Legislativo local, o ITBI deve refletir as condições reais do mercado imobiliário e considerar variáveis específicas da transação, como localização, metragem, benfeitorias e particularidades da negociação entre as partes.
A distinção é fundamental, pois impede que as Prefeituras se valham dos mesmos critérios utilizados no cálculo do IPTU para a apuração do valor devido pelos contribuintes a título de ITBI.
· Teses fixadas pelo STJ sobre o assunto:
1 - A base de cálculo do ITBI é o valor do imóvel transmitido em condições normais de mercado, não estando vinculada à base de cálculo do IPTU, que nem sequer pode ser utilizada como piso de tributação.
2 - O Município não pode arbitrar previamente a base de cálculo do ITBI com respaldo em valor de referência por ele estabelecido unilateralmente.
A presunção de boa-fé no valor declarado pelo contribuinte:
Outro relevante ponto estabelecido pelo STJ, no julgamento do REsp 1.937.821, é o de que, em razão do princípio da boa-fé objetiva, presume-se que o valor declarado pelo contribuinte é condizente com o valor venal de mercado do imóvel transmitido.
Nesses casos, contudo, a referida presunção pode ser afastada mediante instauração de processo administrativo próprio, em que o Fisco poderá demonstrar a incompatibilidade do valor declarado com a realidade, justificando o arbitramento da base de cálculo (artigos 147 e 148, CTN).
· Tese fixada pelo STJ sobre o assunto: o valor da transação declarado pelo contribuinte goza da presunção de que é condizente com o valor de mercado, que somente pode ser afastada pelo fisco mediante a regular instauração de processo administrativo próprio.
Simulação comparativa da base de cálculo do ITBI (município de São Paulo):
Para ilustrar como a diferença de critérios para a apuração da base de cálculo pode impactar o valor devido pelo contribuinte, elaboramos uma tabela comparativa.
Para tanto, consideramos um imóvel cujo valor de mercado real é R$ 650 mil, mas que, de acordo com o valor de referência do IPTU, foi arbitrado em R$ 800 mil.
CRITÉRIO DE AVALIAÇÃO DA BASE DE CÁLCULO
Arbitrada segundo valor de referência do IPTU
VALOR DO IMÓVEL (R$) 800.000
ALÍQUOTA (%) 3,00%
ITBI DEVIDO (R$) 24.000
De acordo com o valor de mercado declarado pelo contribuinte (Tema 1113)
VALOR DO IMÓVEL (R$) 650.000
ALÍQUOTA (%) 3,00%
ITBI DEVIDO (R$) 19.500
Pela sistemática anterior, o ITBI seria calculado sobre um valor superior ao efetivamente negociado, resultando em um tributo mais oneroso para o contribuinte.
Com a decisão do STJ, contudo, o cálculo deve ser feito com base no valor real da transação, reduzindo o montante devido.
Considerações finais:
A definição da base de cálculo do ITBI pelo STJ trouxe maior segurança jurídica aos contribuintes, reafirmando que o tributo deve incidir sobre o valor real da transação e não sobre valores arbitrados unilateralmente pelos municípios.
No entanto, a resistência de algumas administrações municipais em adotar esse entendimento tem levado muitos adquirentes de imóveis a suportar uma tributação indevida, onerando suas operações imobiliárias.
Diante desse cenário, é essencial que os contribuintes revisem os valores recolhidos nos últimos anos e avaliem a possibilidade de reaver montantes pagos a maior.