Definição da base de cálculo do ITBI pelo STJ abre espaço para a restituição de valores pagos indevidamente pelo contribuinte | Análise
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Definição da base de cálculo do ITBI pelo STJ abre espaço para a restituição de valores pagos indevidamente pelo contribuinte

Por Dr. Lucas Soares Zanelatto, advogado do Edgard Leite Advogados Associados

11 de April 17h03

Em 2022, o Superior Tribunal de Justiça (STJ), consolidou um importante entendimento sobre a base de cálculo do Imposto Sobre Transmissão de Bens Imóveis (ITBI).

No julgamento do REsp 1.937.821/SP (Tema Repetitivo 1113), de relatoria do ministro Gurgel de Faria, a Corte estabeleceu que o ITBI deve ser calculado com base no valor do imóvel em condições normais de mercado, não estando vinculada à base de cálculo do IPTU.

Além disso, o STJ fixou que o valor da transação declarado pelo contribuinte nessas operações goza da presunção de que é condizente com o valor de mercado, e que o município não pode arbitrar previamente a base de cálculo do ITBI com respaldo em valor de referência por ele estabelecido unilateralmente.

Em que pese o entendimento firmado pela Corte, muitos municípios continuam arbitrando, por conta própria, o valor do imóvel para fins de cálculo do ITBI, desconsiderando o valor real da operação envolvendo o bem e ignorando, assim, o entendimento fixado pelo STJ sobre o tema.

Por essa razão, muitos contribuintes têm recorrido ao Poder Judiciário para contestar o arbitramento do valor de referência pelos municípios na base de cálculo do ITBI.

Não raras vezes, esses valores excedem, tanto o valor de mercado do imóvel, quanto o montante efetivamente negociado na operação, resultando em uma tributação superior ao de fato devido pelos contribuintes.

Entenda:

O ITBI, tributo municipal incidente sobre a transmissão onerosa da propriedade de bens imóveis, tem sua base de cálculo definida pelo artigo 38 do Código Tributário Nacional (CTN), que menciona o "valor venal dos bens ou direitos transmitidos", assim considerado o valor em condições normais de mercado para transmissões imobiliárias.

Da mesma maneira, o artigo 33, do CTN, se utiliza da expressão "valor venal do imóvel" para delinear a base de cálculo do Imposto sobre a Propriedade Predial e Territorial Urbana (IPTU).

Ao analisar o tema, o STJ ressaltou que, apesar de o Código Tributário Nacional (CTN) prever como base de cálculo para o IPTU e para o ITBI o seu "valor venal", os critérios para sua aferição do referido elemento quantitativo são distintos para cada um dos tributos.

Com efeito, enquanto o IPTU se baseia em um valor tabelado e padronizado pela Planta Genérica de Valores (PGV), critério aprovado pelo Poder Legislativo local, o ITBI deve refletir as condições reais do mercado imobiliário e considerar variáveis específicas da transação, como localização, metragem, benfeitorias e particularidades da negociação entre as partes.

A distinção é fundamental, pois impede que as Prefeituras se valham dos mesmos critérios utilizados no cálculo do IPTU para a apuração do valor devido pelos contribuintes a título de ITBI.

· Teses fixadas pelo STJ sobre o assunto:

1 - A base de cálculo do ITBI é o valor do imóvel transmitido em condições normais de mercado, não estando vinculada à base de cálculo do IPTU, que nem sequer pode ser utilizada como piso de tributação.

2 - O Município não pode arbitrar previamente a base de cálculo do ITBI com respaldo em valor de referência por ele estabelecido unilateralmente.

A presunção de boa-fé no valor declarado pelo contribuinte:

Outro relevante ponto estabelecido pelo STJ, no julgamento do REsp 1.937.821, é o de que, em razão do princípio da boa-fé objetiva, presume-se que o valor declarado pelo contribuinte é condizente com o valor venal de mercado do imóvel transmitido.

Nesses casos, contudo, a referida presunção pode ser afastada mediante instauração de processo administrativo próprio, em que o Fisco poderá demonstrar a incompatibilidade do valor declarado com a realidade, justificando o arbitramento da base de cálculo (artigos 147 e 148, CTN).

· Tese fixada pelo STJ sobre o assunto: o valor da transação declarado pelo contribuinte goza da presunção de que é condizente com o valor de mercado, que somente pode ser afastada pelo fisco mediante a regular instauração de processo administrativo próprio.

Simulação comparativa da base de cálculo do ITBI (município de São Paulo):

Para ilustrar como a diferença de critérios para a apuração da base de cálculo pode impactar o valor devido pelo contribuinte, elaboramos uma tabela comparativa.

Para tanto, consideramos um imóvel cujo valor de mercado real é R$ 650 mil, mas que, de acordo com o valor de referência do IPTU, foi arbitrado em R$ 800 mil.



CRITÉRIO DE AVALIAÇÃO DA BASE DE CÁLCULO

Arbitrada segundo valor de referência do IPTU

VALOR DO IMÓVEL (R$)                                               800.000

ALÍQUOTA (%)                                                                    3,00%

ITBI DEVIDO (R$)                                                               24.000

De acordo com o valor de mercado declarado pelo   contribuinte (Tema 1113)

VALOR DO IMÓVEL (R$)                                                650.000

ALÍQUOTA (%)                                                                     3,00%

ITBI DEVIDO (R$)                                                               19.500

Pela sistemática anterior, o ITBI seria calculado sobre um valor superior ao efetivamente negociado, resultando em um tributo mais oneroso para o contribuinte.

Com a decisão do STJ, contudo, o cálculo deve ser feito com base no valor real da transação, reduzindo o montante devido.

Considerações finais:

A definição da base de cálculo do ITBI pelo STJ trouxe maior segurança jurídica aos contribuintes, reafirmando que o tributo deve incidir sobre o valor real da transação e não sobre valores arbitrados unilateralmente pelos municípios.

No entanto, a resistência de algumas administrações municipais em adotar esse entendimento tem levado muitos adquirentes de imóveis a suportar uma tributação indevida, onerando suas operações imobiliárias.

Diante desse cenário, é essencial que os contribuintes revisem os valores recolhidos nos últimos anos e avaliem a possibilidade de reaver montantes pagos a maior.