PRINCIPAIS PONTOS DA REFORMA TRIBUTÁRIA PARA O AGRONEGÓCIO
Após a aprovação da Emenda Constitucional 132/2023, o Congresso avança na implementação da Reforma Tributária com a análise do Projeto de Lei Complementar nº 68/2024, apresentado pelo Governo Federal, com a regulamentação dos novos tributos a serem instituídos. Na quarta-feira (10/07), a Câmara dos Deputados aprovou o texto com algumas modificações, o qual será remetido ao Senado Federal para ser votado no segundo semestre deste ano.
Como se sabe, a reforma propõe a instituição de um novo sistema de tributação sobre o consumo, substituindo os atuais PIS, COFINS, IPI, ICMS e ISS, para a criação do IBS (Imposto sobre Bens e Serviços), do CBS (Contribuição sobre Bens e Serviços) e do IS (Imposto Seletivo).
Neste novo sistema, busca-se, entre outros objetivos maiores, a implementação de regras tributárias uniformes em todo o território nacional, com poucos regimes de exceção. Abarcada por este propósito, este propósito, está a intenção de vedar a concessão de benefícios fiscais, salvo nas hipóteses já dispostas na EC 132/2023. Com este panorama, cumpre se atentar às principais disposições do PLP nº 68/2024 que afetam o agronegócio, setor pujante da economia brasileira e, atualmente, cercado de tratamentos fiscais excepcionais e subsídios.
A começar pela produção agropecuária, o Art. 132 do PLP nº 68/2024, atendendo ao disposto no Art. 9º, §1º, inciso XI da Emenda Constitucional, prevê a redução de alíquota do IBS e da CBS sobre as operações com insumos agropecuários. Ou seja, as aquisições realizadas pelos produtores rurais, a princípio, terão desoneração de mais da metade do IBS e da CBS (cujas alíquotas, somadas, foram estimadas em 26,5%), alcançando a tributação direta de 10,6%.
Contudo, importa destacar que a desoneração não se aplicará a toda e qualquer compra realizada pelo produtor rural. Isto, pois o PLP nº 68/2024 traz consigo uma lista (Anexo X) de bens que são considerados insumos agropecuários. Conforme declaração da Secretaria Extraordinária da Reforma Tributária, a lista se ampara no atual Convênio ICMS nº 100/1997, celebrado entre os Estados para a uniformização dos benefícios fiscais de ICMS para insumos agropecuários. Da análise preliminar do Anexo X do PLP destaca-se a presença de sementes, mudas de plantas, inseticidas, fungicidas e outros produtos destinados à proteção das lavouras, ração animal e resíduos das indústrias alimentares comumente utilizados como ração animal e vacinas e medicamentos de uso veterinário. Não se encontram na lista, por exemplo, máquinas e equipamentos comumente utilizados nas atividades agropecuárias.
A venda dos produtos derivados da atividade agropecuária também se encontra desonerada na mesma proporção, porém, de forma ímpar, o Art. 132 do PLP, que regulamenta a referida redução de alíquota, não apresenta lista de produtos agropecuários a ela submetidos. Por bem, o dispositivo apenas limita a aplicação da desoneração aos bens "in natura", considerados como aqueles não submetidos a processos de industrialização e não acondicionados em embalagem de apresentação. Ainda, não perde a característica aqueles produtos que passarem por processos de resfriamento, secagem, limpeza, debulha, descaroçamento ou acondicionamento indispensável ao transporte.
A Emenda Constitucional nº 132/2023 também previa a possibilidade de concessão de crédito presumido de IBS e CBS para as indústrias que adquirissem produtos agropecuários de produtores rurais não contribuintes dos novos tributos (Art. 9º, §5º). Apesar da ausência de tributação em tais operações, o crédito presumido destina-se a permitir a recuperação dos tributos suportados pelo produtor rural na aquisição de seus insumos (parcialmente desonerados, conforme visto anteriormente), que aumentam o seu custo de produção e refletem na formação do seu preço.
Salvo por opção própria, não estarão obrigados a recolher IBS e CBS nas suas vendas os produtores que auferirem receita inferior a R$ 3.600.000,00 (Art. 159 do PLP). Em tais hipóteses, a empresa adquirente tomará o crédito presumido cujo valor ainda não se encontra determinado (Art. 163 do PLP).
Neste ponto, o PLP nº 68/2024 traz relevante mudança na sistemática de crédito presumido da compra de produtor rural, visto que não haverá mais percentual fixo para o cálculo do crédito, sendo o percentual recalculado ano a ano, conforme a participação dos produtores rurais não contribuintes no abastecimento das atividades agroindustriais. Ainda, cumpre observar que o "teto" para definição do produtor não contribuinte tem sido amplamente questionado, havendo diversos pleitos para a sua equiparação ao teto do Simples Nacional (R$ 4.800.000,00).
Quanto ao ponto, o texto votado na Câmara dos Deputados trouxe relevante mudança. Originalmente, o PLP nº 68/2024 previa que o produtor não contribuinte que, no ano calendário, ultrapassasse o teto mencionado, seria considerado contribuinte para o ano todo, sendo obrigado ao recolhimento de IBS e CBS acrescidos de juros de mora e correção monetária. Porém, o texto foi modificado de modo que, pela redação atual, o produtor rural somente se tornará contribuinte a partir do segundo mês em que o limite de faturamento for ultrapassado.
No âmbito da agroindústria, cabe mencionar que os alimentos destinados ao consumo humano se encontram desonerados, integral e parcialmente (também em 60%). Contudo, tais desonerações também são limitadas por anexos do PLP nº 68/2024 (Anexos I e VIII). Na desoneração integral (Art. 120 do PLP - Cesta Básica) constam, por exemplo, arroz, feijão, café, farinhas de diversos cereais e, recentemente incluídas pelos Deputados, as proteínas animais.
A previsão da alíquota zero para alguns alimentos induz à situação para algumas indústrias de alimentos de acúmulo de créditos, visto que os produtos agropecuários são adquiridos apenas com desoneração parcial. Para tanto, o PLP nº 68/2024 prevê o ressarcimento dos créditos acumulados, que poderão ser processados, via de regra, em até 75 dias (Art. 58 do PLP). Para os contribuintes enquadrados em programas de conformidade fiscal, este prazo poderá ser reduzido para, 45 dias.
Por fim, importa destacar que a regulamentação do Imposto Seletivo não trouxe a sua incidência sobre bens e insumos comuns à atividade agropecuária, salvo veículos. O tributo que teve a sua incidência limitada, no âmbito constitucional, a produtos prejudiciais à saúde e ao meio ambiente não será cobrado, a princípio, sobre a produção e venda de defensivo agrícolas, por exemplo, especialmente para manter a coesão do sistema tributário frente à desoneração de tais produtos na modalidade de insumo agropecuário mencionada anteriormente (Art. 132).
Assim, mesmo com o intuito de construir um sistema mais uniforme, a Reforma Tributária, reconhecendo a importância do agronegócio para a economia brasileira, prevê uma série de mecanismos para manter o estímulo à atividade. Neste sentido, em que pese a necessidade ajustes no texto, entende-se o movimento legislativo se apresenta como meio adequado e oportuno para a superação de problemas e ineficiências do atual sistema tributário, especialmente em relação à recuperabilidade de tributos.
Autor: Arthur Stringheta.