AS MÚLTIPLAS FACES DO DEVER DE DILIGÊNCIA[1]
Mariana Pinto[2]
Sumário: 1 - Considerações iniciais. 2 - Noções acerca do dever de diligência. 3 - Movimentação e acomodação do núcleo do dever de diligência. 4 - Possíveis destinatários do dever de diligência. 5 - Conclusões. 6- Referências.
1 - Considerações iniciais
As sociedades manifestam-se por intermédio de seus órgãos. A vontade social é refletida através deles, tanto interna quanto externamente. Assim, na clássica definição de Pontes de Miranda, os órgãos sociais presentam a sociedade, ou seja, fazem presente, tornam presente a vontade da pessoa jurídica[3]_[4].
O administrador não mantém com a pessoa jurídica que administra uma relação contratual; não se apresenta como um simples mandatário, prestador de serviços ou representante da sociedade. É mais do que isso. Funciona como órgão social, titular de funções indelegáveis, através do qual a pessoa jurídica manifesta a sua vontade.
Nesse passo, sua responsabilidade não possui natureza contratual, mas sim extracontratual, ex lege ou aquiliana, justamente porque não deriva da infração ou do inadimplemento de um contrato, mas sim do descumprimento de um dever legal.
Dentre os deveres legais, inclui-se o de diligência. Esse específico dever fiduciário já vinha contemplado no §7º do artigo 116 do Decreto-Lei nº. 2.627/1940, o qual preconizava que os diretores deveriam "empregar, no exercício de suas funções, tanto no interesse da empresa, como no do bem público, a diligência que todo homem ativo e probo costuma empregar, na administração de seus próprios negócios"[5].
Por ocasião do advento da Lei nº. 6.404/76, o legislador foi bem além. Com o declarado propósito de fixar um padrão do desejado comportamento a ser adotado pelos administradores, dedicou campo próprio para reunir, de forma didática e ordenada, os seus principais deveres, quais sejam: (i) o dever de diligência (artigo 153); (ii) o dever de realizar os fins da empresa exercida pela companhia (artigo 154); (iii) o dever de lealdade (caput do artigo 155); (iv) o dever de sigilo (§§1º a 4º do artigo 155); (v) o dever de não entrar em conflito com os interesses da sociedade (artigo 156); e (vi) o dever de informar (artigo 157).
Na exposição de motivos do referido diploma legal, foi consignado que as regras contempladas nos demais preceitos que compõem a Seção IV ("Deveres e Responsabilidades"), de seu Capítulo XII ("Conselho de Administração e Diretoria"), traduzem, "em sua maior parte, meros desdobramentos e exemplificações do padrão de comportamento dos administradores definido pela lei em vigor - o do ‘homem ativo e probo na administração dos seus próprios negócios’ (§7º do art. 116 do Decreto-Lei nº. 2.627)". Assim, sob essa ótica, pode-se tomar o dever de diligência como o dever fiduciário básico[6], de maior abrangência[7] ou amplitude[8], a partir do qual desdobram-se os demais.
No âmbito da Lei nº. 6.404/76, vem ele enunciado no já aludido artigo 153, segundo o qual "o administrador da companhia deve empregar, no exercício de suas funções, o cuidado e diligência que todo homem ativo e probo costuma empregar na administração dos seus próprios negócios".
Já no universo do Código Civil, tal dever encontra-se refletido no caput de seu artigo 1.011, que, em termos muito próximos aos do mencionado artigo 153 da Lei nº. 6.404/76, assim dispõe: "o administrador da sociedade deverá ter, no exercício de suas funções, o cuidado e a diligência que todo homem ativo e probo costuma empregar na administração de seus próprios negócios".
O artigo 64º do Código das Sociedades Comerciais português impõe aos administradores a observância de "deveres de cuidado, revelando a disponibilidade, a competência técnica e o conhecimento da actividade da sociedade adequados às suas funções e empregando nesse âmbito a diligência de um gestor criterioso e ordenado"[9]. A parte inicial do artigo 2.392 do Código Civil italiano faz referência à necessidade de cumprimento dos deveres impostos pela lei e pelo ato regra da sociedade, com a diligência exigida pela natureza de sua função e de sua específica competência[10]. De acordo com o artigo 59 da Lei de Sociedades Comerciais argentina, a diligência é associada à figura do bom homem de negócios[11]_[12] e, em consonância com o artigo 225 da Lei de Sociedades de Capital espanhola, à do ordenado empresário[13].
2 - Noções acerca do dever de diligência
O dever de diligência vem refletido, tanto no artigo 153 da Lei nº. 6.404/76, quanto no caputdo artigo 1.011 do Código Civil, ambos já referidos no item anterior, como um modelo de conduta, um padrão de comportamento ou, ainda, um standard. Expressa-se, assim, como uma orientação flexível e maleável, apta a adaptar-se à luz das especificidades do caso concreto[14].
Em verdade, ambos os preceitos revelam vagueza socialmente típica[15]e traduzem autêntica cláusula geral[16]a pautar a atuação dos administradores, ensejando a abertura e a mobilidade do sistema[17].
Não nos diz o legislador em que consiste exercer funções com o cuidado e a diligência que todo homem ativo e probo costuma empregar na administração de seus próprios negócios, cabendo ao intérprete, diante das peculiaridades do caso concreto, atestar o cumprimento, ou não, desse dever. Nesse exercício hermenêutico, deverá levar em consideração o cargo ocupado pelo administrador[18], suas atribuições, a ação ou omissão por ele protagonizada, as informações de que dispunha, o timing, o porte da sociedade administrada, dentre outros elementos. E mais: todos esses fatores deverão ser avaliados à luz da realidade daquele específico momento. Assim, já tendo conhecimento do que efetivamente sucedeu à postura adotada pelo administrador, não cabe ao intérprete buscar aferir, ex post, se foi ela a mais adequada possível.
A adoção dos vocábulos cuidado[19] e diligêncianos remete naturalmente à ideia de zelo. Para observar o dever de diligência, além de pautar-se pela boa-fé[20], o administrador deve agir de maneira zelosa, dedicada, cautelosa e atenciosa. De todo modo, a necessidade de atendimento desse imperativo não pode ser vista de forma distorcida. Administrar passa necessariamente por assumir, em menor ou maior grau, algum nível de risco. No exercício de suas funções, o administrador precisa tomar decisões, muitas vezes com agilidade. Deve ele, enfatize-se, atuar com zelo, dedicação, cautela e atenção, mas, no afã de agir dessa forma, não pode enredar-se em um imobilismo incompatível com o exercício de sua função, cujo norte é o atingimento do fim social.
A clássica associação da figura do homem ativo e probo ao padrão jurídico do bom pai de família[21] suscita críticas por parte da doutrina.
Em comentário dedicado ao artigo 153 da Lei nº. 6.404/76, Nelson Eizirik salienta que se exige do administrador "algo mais que o cuidado do bom pai de família", incumbindo-lhe atuar buscando a consecução do objeto social e a obtenção de lucros. Aduz que o bom pai de família deve procurar manter o patrimônio, ao passo que o administrador deve procurar multiplicá-lo. E arremata observando que "a gestão do bom pai de família é caracterizada pela prudência, enquanto a atuação do administrador, voltada para a realização de lucros, envolve necessariamente a assunção de riscos"[22]_[23].
Fábio Ulhoa Coelho, por sua vez, assim pontua[24]:
A adoção do bom pai de família como paradigma não é mais operacional, hoje em dia. De um lado, por se tratar de padrão por demais impreciso e em total descompasso com a realidade, tendo em vista as profundíssimas alterações na distribuição social de trabalho entre os sexos e as novas estruturas familiares. De outro lado, o atual estágio de desenvolvimento da "ciência" da administração - nascida do pioneiro trabalho de Frederick Taylor, no fim do século XIX - permite à doutrina jurídica deitar ao lado as já gastas fórmulas do direito romano. Em suma, o paradigma do administrador competente deve substituir o do bom pai de família.
De fato, a referência ao homem ativo e probo precisa ser enxergada com os olhos desse nosso tempo, voltando-se, assim, na direção do "administrador competente", como propõe Fábio Ulhoa Coelho na passagem acima reproduzida[25], ou, ainda, tendo "seu eixo direcionado do homem para o empresário (ou empresária) probo; isto é, íntegro e honesto, mas, por definição, capaz de conviver, com alguma naturalidade, em ambientes competitivos e estressados e, de modo informado, alocar riscos", como defende Rodrigo Monteiro de Castro[26].
Diante de todas as especificidades que cercam a caracterização do dever de diligência, a doutrina dedicou-se a reunir elementos que tivessem o condão de favorecer a revelação de seu atendimento por parte dos administradores. Nesse passo, é recorrente a sua decomposição em outros deveres, que estariam abrigados sob a sua cláusula geral, integrando, de certo modo, o seu núcleo e contribuindo para a identificação de sua expressão mais simples. São eles (i) possuir e preservar qualificação técnica para exercer a função; (ii) informar-se; (iii) bem administrar[27]; (iv) fiscalizar; (v) investigar; e (vi) intervir[28].
3 - Movimentação e acomodação do núcleo do dever de diligência
Em função do contexto no qual a sociedade se veja inserida, os contornos do núcleo do dever de diligência, marcado por flexibilidade e maleabilidade, podem movimentar-se e ganhar diferentes formas de acomodação ou conformação. Isso ocorre, por exemplo, quando de sua observância por administradores de sociedades que se encontram em recuperação judicial[29] e, ainda, por administradores de sociedades integrantes de grupo de fato[30].
Ademais, a constante transformação do direito repercute, como não poderia deixar de ser, no campo dos deveres fiduciários.
Ao longo dos últimos anos, em função de uma série de inovações em nosso ordenamento jurídico, passou-se a atribuir valor a adequados e efetivos programas de compliance, os quais podem se voltar, de forma integrada, na direção de distintas áreas do direito como, por exemplo, a concorrencial, a anticorrupção e a de proteção de dados[31].
Podemos enxergar o compliance como o "conjunto de ações a serem adotadas no ambiente corporativo para que se reforce a anuência da empresa à legislação vigente, de modo a prevenir a ocorrência de infrações ou, já tendo ocorrido o ilícito, propiciar o imediato retorno ao contexto de normalidade e legalidade"[32]. Vincula-se, pois, às noções de autorregulação e autovigilância. De todo modo, seu propósito transcende ao desejo de simples cumprimento da legislação em vigor. Vai-se além: almeja-se "criar, difundir e consolidar uma cultura e uma prática de respeito às normas jurídicas e éticas"[33].
O núcleo do dever de diligência é impactado por essa realidade, cumprindo ser elastecido para também abrigar o dever de instituir e manter a organização de modo compatível com as atividades desempenhadas e os riscos assumidos[34], o qual se une, pois, àquele feixe de deveres declinado ao final do item anterior. A essa altura, o conteúdo do dever de diligência não pode estar divorciado do conceito de compliance[35]_[36]. Como cláusula geral, deve progredir, à luz do ainda recente conjunto de inovações legislativas, recebendo os novos elementos, que têm de ser devidamente alojados e conectados com aqueles que lá já se encontram, proporcionando a oxigenação do instituto e a adequação valorativa do sistema no qual está inserido.
Avançando, cabe fazer mais um registro: de há muito, é o dever de diligência associado à figura da obrigação de meio, em contraposição à da obrigação de fim ou de resultado[37].
De fato, a aferição do cumprimento, ou não, do dever de diligência por parte do administrador não é norteada pelo resultado advindo de sua postura, mas sim pela sua conformação com o standard em comento. Por mais diligente seja o administrador, sua atuação pode acarretar resultado negativo (prejuízo) para a sociedade, em função de fatores endógenos ou exógenos alheios à sua vontade e à sua capacidade de controle. Não se exige, pois, que sua conduta enseje necessariamente resultado positivo (lucro). Aliás, em diversas situações, a diligência do administrador vem revelada justamente pelo fato de a pessoa jurídica por ele administrada experimentar menor prejuízo, diante do contexto em que se encontrava. De todo modo, até mesmo esse ponto deve ser enxergado com cautela.
O dever de bem administrar, que integra o feixe de deveres em que se decompõe o dever de diligência, abriga a ideia de que o administrador deve tomar decisões racionais e razoáveis, afastando-se de erros graves. Sob essa ótica, uma decisão claramente irracional e desarrazoada, que traduza erro evidentemente grave e gere prejuízo para a sociedade certamente estará associada à inobservância do dever de diligência.
Ademais, como bem ilumina Ana Frazão, a própria Lei nº. 13.303/2016 preconiza, no caputde seu artigo 23, ser "condição para investidura em cargo de diretoria da empresa pública e da sociedade de economia mista a assunção de compromisso com metas e resultados específicos a serem alcançados, que deverá ser aprovado pelo Conselho de Administração, a quem incumbe fiscalizar seu cumprimento". Assim, ao menos no âmbito das estatais, atrela-se a atuação do administrador - mais especificamente do diretor - ao cumprimento de metas e ao atingimento de resultados, relativizando-se, em certa medida, a visão de estar o dever de diligência vinculado à noção de obrigação de meio.
4 - Possíveis destinatários do dever de diligência
Os denominados deveres fiduciários - dentre os quais se inclui o de diligência - foram concebidos tendo em mira a atuação dos administradores, justamente com o propósito de se estabelecer um padrão do desejado comportamento a ser por eles adotado. Não tardou para que se atestasse que o controlador também deve observá-los[38]. Em certa medida, chegam a alcançar até mesmo os minoritários, como se tem, por exemplo, com os deveres de lealdade e de não ingressar em conflito com os interesses da sociedade.
Mas o certo é que o dever de diligência, tema central deste breve trabalho, não se volta tão somente na direção de administradores e controladores.
Nos moldes da parte inicial do caput do artigo 165 da Lei nº. 6.404/76, os integrantes do conselho fiscal possuem "os mesmos deveres dos administradores de que tratam os arts. 153 a 156". Assim, ao assessorarem a assembleia geral e cumprirem a sua missão fundamental de fiscalizar os órgãos de administração, sobretudo quanto à regularidade de suas contas e de seus atos de gestão, à luz do cumprimento de seus deveres[39], os membros do conselho fiscal devem necessariamente atentar para o atendimento do dever de diligência.
O agente fiduciário dos debenturistas também está a ele adstrito, por força do disposto no artigo 68, §1º, alínea a, da Lei nº. 6.404/76, que elenca, dentre seus deveres, o de "proteger os direitos e interesses dos debenturistas, empregando no exercício da função o cuidado e a diligência que todo homem ativo e probo costuma empregar na administração de seus próprios bens". Nesse mesmo passo, o agente fiduciário dos titulares de partes beneficiárias igualmente deve cumpri-lo, a teor do que preconiza o §3º do artigo 51 do mesmo diploma legal. Na qualidade de representante da comunhão dos debenturistas ou dos titulares de partes beneficiárias, conforme o caso, deve, pois, o agente fiduciário atuar de forma diligente.
Mas isso não é tudo. A depender do estágio da vida da sociedade, outros atores assumem protagonismo no palco social, conectando-se com o dever de diligência. É o que se tem, por exemplo, na liquidação.
No decorrer da liquidação, o órgão de gestão e representação da sociedade é o liquidante[40]. Ele substitui os administradores da sociedade limitada e os diretores da sociedade anônima, cujas funções cessam[41]. Assim, com o ingresso da sociedade no estado de liquidação, esses administradores são automaticamente destituídos em bloco[42]_[43].
As obrigações e responsabilidades do liquidante regem-se pelas regras relativas aos administradores da sociedade liquidanda, nos moldes dos artigos 1.104 do Código Civil e 217 da Lei nº. 6.404/76. Assim é que, durante toda a liquidação, deve ele observar - além de seus específicos deveres, elencados de forma meramente exemplificativa ao longo dos artigos 1.103 do Código Civil e 210 da Lei nº. 6.404/76 - os deveres fiduciários, incluindo-se aí o de diligência, sempre tendo em mira os propósitos da liquidação.
E aqui reside um ponto digno de nota: na fase de liquidação, o fim social sofre uma significativa modificação. Deixa de consistir na obtenção de lucros, através da execução do objeto social e passa a vincular-se à efetivação do procedimento de liquidação da maneira mais eficiente possível. Em sua essência, a liquidação relaciona-se com a ultimação dos negócios da sociedade, a realização de seu ativo, o pagamento de seu passivo e a partilha do saldo remanescente entre os seus sócios. Todos os esforços, portanto, devem ser coordenados para a adequada implementação dos movimentos de alienação do ativo e adimplemento do passivo, de forma a maximizar o mencionado saldo remanescente[44].
Como os deveres fiduciários foram cunhados tendo em mira o prosseguimento das atividades sociais, ao serem observados pelo liquidante, precisam ter seu eixo ajustado aos objetivos próprios da liquidação. Em outros termos, nessa peculiar fase da vida social, cumpre fazer uma releitura de tais deveres, que se aplicam, sim, aos liquidantes, mas com as devidas adaptações[45].
No que tange especificamente ao dever de diligência, cumpre, por exemplo, revisitar o dever de bem administrar, abrigado em sua cláusula geral, em consonância com a própria alteração de fim social acima destacada. No curso normal da vida social, a ideia de bem administrar está associada à atuação que tem em mira possibilitar que a sociedade aufira lucros através da exploração de seu objeto social. Já no estado de liquidação, é revelada pela busca da máxima eficiência do procedimento de liquidação, ou seja, pelo propósito de que ele ocorra do modo mais célere e menos oneroso possível.
Há, ainda, outra figura que não pode passar desapercebida nessa análise: o administrador judicial e, aqui, sob o especial enfoque do processo de falência.
No regime dualista agasalhado pela Lei nº. 11.101/2005, a falência vem associada à perspectiva de liquidação judicial do patrimônio do devedor insolvente, predominando, pois, a noção de falência-liquidação[46]. Nesse contexto, o administrador judicial emerge como um órgão ou agente auxiliar da justiça, que funciona como administrador da massa falida, agindo na defesa dos interesses que a compõem e sendo o seu liquidatário[47]_[48].
A liquidação judicial do patrimônio do devedor falido, a um só tempo, proporciona o saneamento do mercado, dele eliminando empresas cuja recuperação não se faça possível, e viabiliza seja assegurado aos credores um tratamento racional por ocasião da realização de seus créditos, obstando preferências descabidas e injustas e em atendimento, sobretudo, à par conditio creditorum[49].
Mas há, ainda, um outro potencial a ser explorado quando dessa liquidação judicial: a promoção da preservação, mesmo na falência, da empresa até então exercida pelo devedor falido[50]. E essa específica vocação conecta-se com a eventual continuação provisória da atividade e com a célere realização do ativo, à luz de imperativa ordem de preferência constante do artigo 140 da Lei nº. 11.101/2005, tendo em mira (i) preservar e otimizar a utilização produtiva dos bens, dos ativos e dos recursos produtivos, inclusive os intangíveis; (ii) permitir a ágil liquidação das empresas viáveis, com vistas à realocação eficiente de recursos na economia; e (iii) fomentar o empreendedorismo, inclusive por meio da viabilização do expedito retorno do empreendedor falido à atividade econômica, de forma que a falência possa efetivamente funcionar, nos termos do §2º do artigo 75 da Lei nº. 11.101/2005, como um "mecanismo de preservação de benefícios econômicos e sociais decorrentes da atividade empresarial, por meio da liquidação imediata do devedor e da rápida realocação útil de ativos na economia"[51].
Assim é que, no processo falimentar, deve, sim, o administrador judicial, notadamente ao desempenhar a sua função de administrador da massa falida e de seu liquidatário, observar o dever de diligência para a realização de todos os fins acima, ainda que em apertada síntese, indicados.
5 - Conclusões
O dever de diligência pode ser enxergado como o dever fiduciário básico, a partir do qual desdobram-se os demais. Tanto no artigo 153 da Lei nº. 6.404/76, como no caputdo artigo 1.011 do Código Civil, vem ele refletido como um modelo de conduta, um padrão de comportamento ou um standard, expressando-se como uma orientação flexível e maleável, apta a adaptar-se à luz das especificidades do caso concreto. Tais preceitos traduzem autêntica cláusula geral a pautar a atuação dos administradores, ensejando a abertura e a mobilidade do sistema.
De fato, o legislador não nos diz em que consiste exercer funções com o cuidado e a diligência que todo homem ativo e probo costuma empregar na administração de seus próprios negócios. Cabe, pois, ao intérprete, diante das peculiaridades do caso concreto e tendo em mira a realidade daquele específico momento, atestar o cumprimento, ou não, desse dever. Nesse exercício hermenêutico, faz-se oportuno considerar que, além de pautar-se pela boa-fé, o administrador deve agir de maneira zelosa, dedicada, cautelosa e atenciosa, o que, entretanto, não repele a assunção, em menor ou maior grau, de algum nível de risco, inerente à própria ação de administrar. Cumpre, ainda, revisitar a clássica referência ao homem ativo e probo, enxergando-a com os olhos desse nosso tempo.
Diante de todas as especificidades que cercam a caracterização do dever de diligência, fez-se usual a sua decomposição em outros deveres, que estariam abrigados sob a sua cláusula geral, integrando, de certo modo, o seu núcleo e contribuindo para a identificação de sua expressão mais simples. Nesse passo, ganham destaque os deveres de (i) possuir e preservar qualificação técnica para exercer a função; (ii) informar-se; (iii) bem administrar; (iv) fiscalizar; (v) investigar; e (vi) intervir.
Mas a riqueza do dever de diligência não reluz apenas a partir dessas suas noções essenciais. A depender do contexto no qual a sociedade se veja inserida, os contornos de seu núcleo podem movimentar-se e ganhar diferentes formas de acomodação ou conformação. Esse efeito pode ser percebido, por exemplo, quando de seu cumprimento por administradores de sociedades que se encontram em recuperação judicial ou integram grupo de fato.
Ademais, tem-se que, a essa altura, o conteúdo do dever de diligência não pode estar divorciado do conceito de compliance. Seu núcleo deve ser elastecido para também abrigar o dever de instituir e manter a organização de modo compatível com as atividades desempenhadas e os riscos assumidos. Como cláusula geral, deve progredir, recebendo os novos elementos, que têm de ser devidamente alojados e conectados com aqueles que lá já se encontram, proporcionando a oxigenação do instituto e a adequação valorativa do sistema no qual está inserido.
Outrossim, até mesmo o ponto de ser o dever de diligência, de há muito, associado à figura da obrigação de meio, em contraposição à da obrigação de fim ou de resultado, deve, nos dias de hoje, ser visto com cautela, notadamente porque, ao menos no âmbito das estatais, atrela-se a atuação do administrador - mais especificamente do diretor - ao cumprimento de metas e ao atingimento de resultados, relativizando-se, em certa medida, a visão de estar o dever de diligência vinculado à noção de obrigação de meio.
A sofisticação do dever de diligência também é revelada quando se tem em mira seus possíveis destinatários e, sobretudo, sua releitura na esfera jurídica de cada um desses sujeitos. Esse específico dever fiduciário não se volta apenas na direção de administradores e controladores. Com efeito, alcança outros relevantes atores, como integrantes do conselho fiscal, agentes fiduciários de debenturistas, agentes fiduciários de titulares de partes beneficiárias, liquidantes e, ainda, administradores judiciais que atuem em processos de falência.
Ao longo deste breve trabalho, o elastecimento da reflexão sobre o dever de diligência foi abrigado em duas esferas distintas: uma objetiva, associada à movimentação e à acomodação de seu próprio núcleo; e outra subjetiva, focada na figura de agentes que devem observá-lo. E assim foi feito por considerar-se que, dessa forma, algumas de suas múltiplas faces se desvelam com maior nitidez.
6 - Referências
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WALD, Arnoldo. Comentários ao novo Código Civil. 2ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2010. v. XIV.
[1] Há pouco mais de dez anos, tive a alegria de passar a conviver com o Professor Fábio Ulhoa Coelho, por quem já possuía natural admiração. Ao longo desses anos, acompanhei algumas de suas muitas ações em prol do nosso Direito Comercial; encantei-me com a sua rara capacidade de transformar ideias em realidade; e, por diversas vezes, testemunhei manifestações concretas de sua amizade e generosidade. Nessa oportunidade, não poderia deixar de fazer esse breve registro. Parabéns, Fábio, pelos seus 40 anos de magistério.
[2] Advogada. Sócia do Escritório Campinho Advogados. Mestre em Economia Empresarial pela Universidade Candido Mendes. Doutora em Direito pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), na linha de pesquisa denominada Empresa e Atividades Econômicas.
[3] Pontes de Miranda. Tratado de direito privado. 3ª ed. Rio de Janeiro: Borsoi, 1972. Tomo L, p. 384.
[4] Paulo Fernando Campos Salles de Toledo, com acuidade, trata da aplicação da teoria organicista tanto às sociedades anônimas, quanto às sociedades contratuais, sendo oportuna a reprodução de suas palavras: "A Lei das Sociedades Anônimas é muito clara a respeito da adoção da teoria organicista. Lê-se, em seu art. 139, que ‘as atribuições e poderes conferidos por lei aos órgãos de administração não podem ser outorgados a outro órgão, criado por lei ou por estatuto’. Além de explicitamente empregar a expressão ‘órgão de administração’, acentua uma das principais características do organicismo: a indelegabilidade das funções legalmente atribuídas a um órgão societário. Já o Código Civil, ao tratar das sociedades, não é tão ostensivo. Ainda assim, não deixa dúvidas quanto a também ter adotado a teoria organicista, seguindo, neste passo, a tradição do direito brasileiro. O maior exemplo da opção assumida encontra-se no art. 1.070, o qual, em termos muito próximos do art. 139 da Lei das S.A., dispõe que ‘as atribuições e poderes conferidos pela lei ao conselho fiscal não podem ser outorgados a outro órgão da sociedade’. É certo que o dispositivo refere-se exclusivamente ao conselho fiscal, mas obviamente deve ser estendido a outros órgãos societários. Não faria sentido, com efeito, que uma atribuição própria da assembleia de sócios, prevista por norma legal específica, fosse, por cláusula contratual, outorgada a outro órgão da sociedade limitada. Por outro lado, a regra do art. 1.070 é reforçada pelo disposto no art. 1.018, ao prescrever que ‘ao administrador é vedado fazer-se substituir no exercício de suas funções’. Em outros termos, ele não pode delegá-las, e isto, como facilmente se depreende, por ser órgão da sociedade" (As sociedades limitadas podem ter conselho de administração? In: CASTRO, Rodrigo R. Monteiro de; AZEVEDO, Luís André N. de Moura (Coord.). Poder de controle e outros temas de direito societário e mercado de capitais. São Paulo: Quartier Latin, 2010. p. 364-365).
[5] Como o Decreto nº. 434/1891 era silente em relação ao tema, Carvalho de Mendonça propunha fosse o artigo 142 do Código Comercial de 1850, referente à atuação do mandatário no bojo de mandato mercantil, aplicado analogicamente ao administrador da sociedade anônima, o qual, enfatize-se, enquadrava como órgão social (Tratado de direito comercial brasileiro. 4ª ed. posta em dia por Achilles Bevilaqua e Roberto Carvalho de Mendonça. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 1946. v. IV, p. 77, 7, 38 e 55). O citado artigo 142 contava com a seguinte redação: "Aceito o mandato, o mandatário é obrigado a cumpri-lo segundo as ordens e instruções do comitente; empregando na sua execução a mesma diligência que qualquer comerciante ativo e probo costuma empregar na gerência dos seus próprios negócios".
[6] Egberto Lacerda Teixeira; José Alexandre Tavares Guerreiro. Das sociedades anônimas no direito brasileiro. São Paulo: Bushatsky, 1979. v. 2, p. 471.
[7] Luiz Antonio de Sampaio Campos. Deveres e responsabilidades. In: LAMY FILHO, Alfredo; PEDREIRA, José Luiz Bulhões (Coord.). Direito das companhias. Rio de Janeiro: Forense, 2009. v. I, p. 1.097.
[8] Marcelo Vieira von Adamek. Responsabilidade civil dos administradores de S/A e as ações correlatas. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 120.
[9] Artigo 64º do Código das Sociedades Comerciais: "1 - Os gerentes ou administradores da sociedade devem observar: a) Deveres de cuidado, revelando a disponibilidade, a competência técnica e o conhecimento da actividade da sociedade adequados às suas funções e empregando nesse âmbito a diligência de um gestor criterioso e ordenado; e b) Deveres de lealdade, no interesse da sociedade, atendendo aos interesses de longo prazo dos sócios e ponderando os interesses dos outros sujeitos relevantes para a sustentabilidade da sociedade, tais como os seus trabalhadores, clientes e credores. 2 - Os titulares de órgãos sociais com funções de fiscalização devem observar deveres de cuidado, empregando para o efeito elevados padrões de diligência profissional e deveres de lealdade, no interesse da sociedade".
[10] Parte inicial do artigo 2.392 do Código Civil: "Gli amministratori devono adempiere i doveri ad essi imposti dalla legge e dallo statuto con la diligenza richiesta dalla natura dell'incarico e dalle loro specifiche competenze. [...]".
[11] Artigo 59 da Lei de Sociedades Comerciais: "Los administradores y los representantes de la sociedad deben obrar con lealtad y con la diligencia de un buen hombre de negocios. Los que faltaren a sus obligaciones son responsables, ilimitada y solidariamente, por los daños y perjuicios que resultaren de su acción u omisión".
[12] Na lição de Isaac Halperin e Julio Otaegui, "la noción de ‘buen hombre de negocios’ establece una auténtica responsabilidad profesional, ya que implica capacidad técnica, experiencia, conocimientos" (Sociedades anónimas. 2ª ed. Buenos Aires: Depalma, 1998. p. 549).
[13] Artigo 225 da Lei de Sociedades de Capital: "1. Los administradores deberán desempeñar el cargo y cumplir los deberes impuestos por las leyes y los estatutos con la diligencia de un ordenado empresario, teniendo en cuenta la naturaleza del cargo y las funciones atribuidas a cada uno de ellos; y subordinar, en todo caso, su interés particular al interés de la empresa. 2. Los administradores deberán tener la dedicación adecuada y adoptarán las medidas precisas para la buena dirección y el control de la sociedad. 3. En el desempeño de sus funciones, el administrador tiene el deber de exigir y el derecho de recabar de la sociedad la información adecuada y necesaria que le sirva para el cumplimiento de sus obligaciones".
[14] Ao observar que o dever de diligência se apresenta como um "padrão normativo de conduta", Modesto Carvalhosa assim consigna: "Os standardssão próprios da legislação anglo-norte-americana, revestindo-se de caráter enunciativo quanto às possíveis formas de inobservância de obrigações de natureza legal por parte dos administradores. Tais standards remetem a doutrina e a jurisprudência à configuração das práticas que se inserem nos conceitos legais enunciativos dos abusos, por omissão ou ação, praticados pelos administradores na condução dos negócios sociais. A norma, na espécie, define as condutas-tipo que devem ser observadas pelo administrador. É função do intérprete verificar quais as manifestações da conduta do administrador, no exercício de suas funções, que não correspondem a tais padrões. Os padrões de cuidado e diligência são, portanto, enunciativos e não rígidos, e sua interpretação ampla" (Comentários à lei de sociedades anônimas. 4ª ed. São Paulo: Saraiva, 2009. v. 3, p. 272-273).
[15] Conforme registra Judith Martins-Costa, a locução foi cunhada por Claudio Luzzatti "para indicar os casos de emprego legislativo de expressões programaticamente vagas, verificáveis quando algum termo, segundo uma certa interpretação, exprime um conceito valorativo cujos critérios aplicativos não são sequer determináveis senão através da referência aos ‘variáveis parâmetros de juízo e às mutáveis tipologias da moral social e do costume’". Mais adiante, a própria autora elenca, dentre os exemplos de expressões dotadas de vagueza socialmente típica contempladas do Código Civil, o "cuidado (...) de todo o homem ativo e probo", constante do indigitado caput do artigo 1.011 (A boa-fé no direito privado: Critérios para a sua aplicação. 2ª ed. São Paulo: Saraiva, 2018. p. 153-155).
[16] Judith Martins-Costa salienta que cláusulas gerais e conceitos indeterminados não se confundem, sendo certo que a efetiva distinção não está na linguagem, mas sim na estrutura normativa. Nesse passo, assim sustenta: "Os chamados conceitos indeterminados podem estar presentes em estruturas normativas completas, em que há hipótese legal (ainda que formulada de modo semanticamente vago) e consequência predeterminada. Diferentemente, nas cláusulas gerais em sentido próprio, a estrutura deverá ser completada pelo intérprete, pela adição da consequência devida. De fato, as cláusulas gerais constituem estruturas normativas parcialmente em branco, as quais são completadas por meio da referência às regras extrajurídicas, ou a regras dispostas em outros ‘loci’ do sistema jurídico". Logo à frente, após destacar que "a cláusula geral exige que o intérprete-aplicador concorra de um modo diverso para complementar o enunciado normativo", assim arremata: "Enquanto nos conceitos indeterminados o juiz se limita a reportar ao fato concreto o elemento (semanticamente vago) indicado na fattispecie (devendo, pois, individuar os confins da hipótese abstratamente posta, cujos efeitos já foram predeterminados legislativamente), na cláusula geral a operação intelectiva do juiz é mais complexa. Este deverá, além de averiguar a possibilidade de subsunção de uma série de casos-limite na fattispecie, averiguar a exata individuação das mutáveis regras sociais às quais o envia a metanorma jurídica. Deverá, por fim, determinar também quais são os efeitos incidentes ao caso concreto, ou, se estes já vierem indicados, qual a graduação que lhes será conferida no caso concreto, à vista das possíveis soluções existentes no sistema" (A boa-fé no direito privado: Critérios para a sua aplicação. 2ª ed. São Paulo: Saraiva, 2018. p. 158-159).
[17] Na precisa lição de Judith Martins-Costa, "as cláusulas gerais têm por função auxiliar a abertura e a mobilidade do sistema jurídico, propiciando o seu progresso mesmo se ausente a inovação legislativa. A abertura diz respeito ao ingresso no corpus legislativo de princípios, máximas de conduta, standards e diretivas sociais e econômicas, viabilizando a captação e a inserção de elementos extrajurídicos de modo a promover a ‘adequação valorativa’ do sistema (abertura ou permeabilidade do sistema). A mobilidade diz respeito à acomodação no interior do sistema desses novos elementos, conectando-os, num movimento dialético, com outras soluções sistemáticas (ressistematização)" (A boa-fé no direito privado: Critérios para a sua aplicação. 2ª ed. São Paulo: Saraiva, 2018. p. 174).
[18] Como anota Nelson Eizirik, "não se pode, por exemplo, exigir de um conselheiro de administração o mesmo conhecimento sobre a gestão da companhia do que o de um diretor" (A lei das S/A comentada. 2ª ed. São Paulo: Quartier Latin, 2015. v. III, p. 116). O ponto também é destacado por Ana Frazão, que igualmente considera que as distintas posições dos administradores funcionam como variável relevante para a análise do dever de diligência (Função social da empresa: Repercussões sobre a responsabilidade civil de controladores e administradores de S/As. Rio de Janeiro: Renovar, 2011. p. 354).
[19] A palavra cuidado não constava das redações do artigo 142 do Código Comercial de 1850 e do §7º do artigo 116 do Decreto-Lei nº. 2.627/1940.
[20] Ao cuidar dos critérios para a avaliação dos deveres dos administradores, Judith Martins-Costa defende que, "nesta matéria a boa-fé pode, assim, ter o duplo relevo de atuar (i) conjuntamente com os deveres fiduciários tradicionais, ‘otimizando-os’ em vista de sua melhor realização, como ocorre, e.g., com o dever de disclosurenas companhias abertas; (ii) como cânone de hermenêutica dos comportamentos devidos pelo administrador e, (iii) de modo autônomo, para integrar lacuna legal, então apanhando casos de violação da fidúcia em que estruturada a atividade de administração" (A boa-fé no direito privado: Critérios para a sua aplicação. 2ª ed. São Paulo: Saraiva, 2018. p. 360)
[21] O enquadramento da figura do bom pai de família como um padrão jurídico é feito por António Menezes Cordeiro (Da boa fé no direito civil. Coimbra: Almedina, 2015. p. 1.230).
[22] A lei das S/A comentada. 2ª ed. São Paulo: Quartier Latin, 2015. v. III, p. 117.
[23] Nesse curso, Luiz Antonio de Sampaio Campos observa que "o comportamento do bom pai de família não se ajusta ao do administrador da companhia" e prossegue assim aduzindo: "O modelo teórico do bom pai de família, proveniente do direito romano, remete a uma pessoa conservadora e avessa a riscos, preocupada mais em preservar o patrimônio do que em aumentá-lo. A estrutura da companhia pressupõe a propensão ao risco empresarial e, muitas vezes, a adoção de posturas criativas e inovadoras. O aplicador da lei deve estar atento a essas peculiaridades" (Deveres e responsabilidades. In: LAMY FILHO, Alfredo; PEDREIRA, José Luiz Bulhões (Coord.). Direito das companhias. Rio de Janeiro: Forense, 2009. v. I, p. 1.101).
[24] Curso de direito comercial: Direito de empresa. 20ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2016. v. 2, p. 247.
[25] Nesse sentido, confiram-se, ainda: Modesto Carvalhosa. Comentários à lei de sociedades anônimas. 4ª ed. São Paulo: Saraiva, 2009. v. 3, p. 272; e Flávia Parente. O dever de diligência dos administradores de sociedades anônimas. Rio de Janeiro: Renovar, 2005. p. 52.
[26] Parametrização do dever de diligência. In: COELHO, Fábio Ulhoa (Coord.). Lei das sociedades anônimas comentada. Rio de Janeiro: Forense, 2021. p. 874.
[27] A necessidade de possuir disponibilidade para o exercício da função e de a ela dedicar tempo e energia compatíveis está, a meu ver, abrangida pelo dever de bem administrar.
[28] Jorge Manuel Coutinho de Abreu apresenta fragmentação que contempla (i) "o dever de controlo ou vigilância organizativo-funcional"; (ii) "o dever de actuação procedimentalmente correcta (para a tomada de decisões)"; e (iii) "o dever de tomar decisões (substancialmente) razoáveis" (Deveres de cuidado e de lealdade dos administradores e interesse social. In: Reformas do Código das Sociedades. Coimbra: Almedina, 2007. p. 20). Após fazer referência à repartição proposta pelo aludido autor, Ana Perestrelo de Oliveira assim aduz: "Do próprio art. 64º resultam concretizações deste dever: (i) o dever de aquisição de competência técnica adequada às suas funções; (ii) o dever de obtenção do conhecimento sobre a atividade da sociedade (o que envolve a aquisição e análise crítica da mesma e a implementação de sistemas de gestão de riscos, sistemas de controlo interno e sistemas de auditoria interna [...]); (iii) o dever de disponibilidade (obrigação de orientação do tempo e energia do administrador à promoção do fim ou interesse da sociedade); a estes deveres acrescenta-se (iv) o dever de atuar segundo critérios de racionalidade empresarial (art. 72º/2)" (Manual de governo das sociedades. Coimbra: Almedina, 2017. p. 233). Flávia Parente, por sua vez, o desmembra nos seguintes deveres: (i) qualificar-se para o exercício do cargo; (ii) bem administrar; (iii) informar-se; (iv) investigar; e (v) vigiar (O dever de diligência dos administradores de sociedades anônimas. Rio de Janeiro: Renovar, 2005. p. 101-102). Já Laís Machado Lucas, o fraciona nos deveres de (i) informar-se; (ii) qualificar-se; (iii) fiscalizar; (iv) investigar; (v) intervir; (vi) participar (também denominado de dever de assiduidade); e (vii) bem administrar e não praticar erros graves (Programas de integridade nas sociedades anônimas: Implementação como conteúdo do dever de diligência dos administradores. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2021. p. 143-151).
[29] Ao longo da recuperação judicial, o atendimento do dever de diligência passa pela observância dos vetores e pela realização dos fins contemplados no artigo 47 da Lei nº. 11.101/2005, segundo o qual ela "tem por objetivo viabilizar a superação da situação de crise econômico-financeira do devedor, a fim de permitir a manutenção da fonte produtora, do emprego dos trabalhadores e dos interesses dos credores, promovendo, assim, a preservação da empresa, sua função social e o estímulo à atividade econômica".
[30] De acordo com o disposto no artigo 245 da Lei nº. 6.404/76, "os administradores não podem, em prejuízo da companhia, favorecer sociedade coligada, controladora ou controlada, cumprindo-lhes zelar para que as operações entre as sociedades, se houver, observem condições estritamente comutativas, ou com pagamento compensatório adequado; e respondem perante a companhia pelas perdas e danos resultantes de atos praticados com infração ao disposto neste artigo". Em trabalho elaborado em conjunto com Sérgio Campinho, consignei enxergar o citado preceito como regra geral em matéria de Direito Societário, aplicável aos administradores de toda e qualquer sociedade, seja ela unipessoal ou pluripessoal, independentemente de sua espécie e de seu tipo e também da regência supletiva adotada, e ainda que o grupo de fato em questão não possua sequer uma sociedade anônima; registrei, ainda, tratar-se de um dever especial, que se une àquele feixe de deveres gerais, os quais devem ser observados por todo e qualquer administrador (A responsabilidade dos administradores de sociedades integrantes de grupo de fato. In: ROSSETTI, Maristela Abla; PITTA, Andre Grunspun (Coord.). Governança corporativa: Avanços e retrocessos. São Paulo: Quartier Latin, 2017. p. 826 e 828). Por mais que o dever refletido no artigo 245 da Lei nº. 6.404/76 efetivamente se apresente como um dever especial, o certo é que ele está conectado com os deveres de diligência e de lealdade, dirigindo-os no contexto dos grupos de fato.
[31] Como atestam Milena Donato Oliva e Rodrigo da Guia Silva, "no Brasil, assiste-se, progressivamente, à atribuição de efeitos jurídicos ao compliance, que é tratado na legislação como: (i) prática incentivada por meio da previsão legal de consequências favoráveis (v.g. dosimetria da pena) ou (ii) obrigação legal em sentido estrito (como no caso da imposição, pela legislação federal, da obrigatoriedade de as empresas estatais adotarem programas de compliance)". Em complementação, asseveram que se verifica "uma gradual expansão, por parte da jurisprudência, da utilização da noção de compliance como parâmetro interpretativo para a resolução de questões as mais variadas envolvendo a atividade empresarial" (Origem e evolução histórica do compliance no direito brasileiro. In: CUEVA, Ricardo Villas Bôas; FRAZÃO, Ana (Coord.). Compliance: Perspectivas e desafios dos programas de conformidade. Belo Horizonte: Fórum, 2018. p. 33).
[32] O conceito é articulado por Ana Frazão em seu Programas de compliance e critérios de responsabilização de pessoas jurídicas por ilícitos administrativos. In: ROSSETTI, Maristela Abla; PITTA, Andre Grunspun (Coord.). Governança corporativa: Avanços e retrocessos. São Paulo: Quartier Latin, 2017. p. 42.
[33] Ana Frazão. Propósitos, desafios e parâmetros gerais dos programas de compliance e das políticas de proteção de dados. In: FRAZÃO, Ana; CUEVA, Ricardo Villas Bôas (Coord.). Compliance e políticas de proteção de dados. São Paulo: Thomson Reuters, 2021. p. 36-37.
[34] Assim já sustentei em trabalho elaborado juntamente com Ana Frazão sobre compliance de dados e incidentes de segurança: "[...] quando o foco está posto na prevenção de incidentes de segurança, ganha especial relevo o dever de diligência, cujo núcleo mínimo é ampliado à luz do próprio conceito de compliance, para também abrigar o dever de instituir e manter a organização de modo compatível com as atividades desempenhadas e os riscos assumidos, inclusive no que tange à proteção de dados" (Compliancede dados e incidentes de segurança. In: PINHEIRO, Caroline da Rosa (Coord.). Compliance entre a teoria e a prática: Reflexões contemporâneas e análise dos programas de integridade das companhias listadas no novo mercado. Indaiatuba/SP: Foco, 2022. p. 49).
[35] Como bem coloca Ana Frazão: "[...] o compliancereforça a dimensão organizacional do dever de diligência, a fim de que controladores e administradores estruturem a organização empresarial de forma compatível com as atividades da companhia e com o risco por ela assumido. Para isso, torna-se necessário criar adequados sistemas de vigilância, supervisão e investigação sobre as atividades da sociedade, de modo a assegurar o respeito às obrigações legais e possibilitar a intervenção adequada diante da identificação de problemas e ameaças. Não é sem razão que um aspecto fundamental dos programas de compliance é a necessidade de comprometimento da alta administração. Logo, é inequívoco o potencial do compliance para ampliar o núcleo básico do dever de diligência, abrindo margem para que, ao lado do dever de agir bem informado, acrescente-se igualmente a importante obrigação de instituir e manter uma organização idônea para lidar com o risco assumido, inclusive no que diz respeito à prevenção de ilícitos" (O dever de diligência sob a perspectiva organizacional. In: COELHO, Fábio Ulhoa (Coord.). Lei das sociedades anônimas comentada. Rio de Janeiro: Forense, 2021. p. 889).
[36] Focando no compliance anticorrupção, Laís Machado Lucas assim sustenta: "Diante do que até aqui foi pesquisado, entende-se que a implementação dos programas de integridade é obrigatória pelo dever de diligência dos administradores, pois o artigo 7º, VIII, da Lei 12.846/2013 criou mais um subdever intrínseco à cláusula geral do artigo 153 da Lei 6.404/76. Lembre-se de que a concreção da normativa parcialmente em branco se dá mediante análise do caso concreto, buscando-se elementos no próprio ordenamento jurídico e em situações extrajurídicas. Por isso, pode-se afirmar que o conteúdo do dever de diligência dos administradores é mutante, podendo ser alterado, sempre que surjam novas legislações ou práticas de mercado que exijam a revisão ou readaptação da conduta dos administradores. No caso, diante do cenário social e jurídico que se vivencia, o dever de diligência requer nova conformação para exigir dos administradores uma postura voltada para o combate às fraudes empresariais, mais precisamente à corrupção" (Programas de integridade nas sociedades anônimas: Implementação como conteúdo do dever de diligência dos administradores. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2021. p. 153).
[37] Nesse sentido: Arnoldo Wald. Comentários ao novo Código Civil. 2ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2010. v. XIV, p. 159; Fábio Ulhoa Coelho. Curso de direito comercial: Direito de empresa. 20ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2016. v. 2, p. 247; Judith Martins-Costa. A boa-fé no direito privado: Critérios para a sua aplicação. 2ª ed. São Paulo: Saraiva, 2018. p. 360; Luiz Antonio de Sampaio Campos. Deveres e responsabilidades. In: LAMY FILHO, Alfredo; PEDREIRA, José Luiz Bulhões (Coord.). Direito das companhias. Rio de Janeiro: Forense, 2009. v. I, p. 1.103-1.105; Marcelo Vieira von Adamek. Responsabilidade civil dos administradores de S/A e as ações correlatas. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 132-135; Nelson Eizirik. A lei das S/A comentada. 2ª ed. São Paulo: Quartier Latin, 2015. v. III, p. 121; e Sérgio Campinho. Curso de direito comercial: Sociedade anônima. 5ª ed. São Paulo: Saraiva, 2020. p. 319.
[38] Como pontuado por Ana Frazão, "a doutrina brasileira é farta em lições segundo as quais o controlador também está sujeito a deveres fiduciários, especialmente no que se refere à lealdade" (Função social da empresa: Repercussões sobre a responsabilidade civil de controladores e administradores de S/As. Rio de Janeiro: Renovar, 2011. p. 251-252).
[39] Sérgio Campinho. Curso de direito comercial: Sociedade anônima. 5ª ed. São Paulo: Saraiva, 2020. p. 349.
[40] Conforme já registrei, em conjunto com Sérgio Campinho, em nossa obra dedicada à sociedade limitada na perspectiva de sua dissolução, "o liquidante não mantém com a sociedade em liquidação uma relação contratual; não se apresenta como um simples mandatário, prestador de serviços ou representante da pessoa jurídica, de seus sócios e muito menos de seus credores. É mais do que isso. Funciona como um órgão social, titular de funções indelegáveis, predefinidas em lei e supletivamente no contrato social, por meio do qual, ao longo desse específico período da vida social - a liquidação -, a pessoa jurídica manifesta a sua vontade e se relaciona com terceiros, com o fim de alcançar a sua extinção regular" (A sociedade limitada na perspectiva de sua dissolução. São Paulo: Saraiva, 2022. p. 79).
[41] Nos termos da parte inicial do §1º do artigo 208 da Lei nº. 6.404/76, a companhia que tiver conselho de administração poderá mantê-lo, competindo-lhe nomear o liquidante. Entretanto, a conveniência de se preservar esse órgão de administração ao longo da fase de liquidação vem sendo questionada pela doutrina. Sobre o tema, cabe conferir: Mauro Rodrigues Penteado. Dissolução e liquidação de sociedades. 2ª ed. São Paulo: Saraiva, 2000. p. 265; Nelson Eizirik. A lei das S/A comentada. 2ª ed. São Paulo: Quartier Latin, 2015. v. IV, p. 48; e Sérgio Campinho. Curso de direito comercial: Sociedade anônima. 5ª ed. São Paulo: Saraiva, 2020. p. 403 e, ainda, Funcionamento do conselho de administração e do conselho fiscal. In: COELHO, Fábio Ulhoa (Coord.). Lei das sociedades anônimas comentada. Rio de Janeiro: Forense, 2021. p. 1.189.
[42] Sérgio Campinho; Mariana Pinto. A sociedade limitada na perspectiva de sua dissolução. São Paulo: Saraiva, 2022. p. 80.
[43] Nesse sentido, Nelson Eizirik assim expõe: "A companhia dissolvida estará submetida, no curso da liquidação, a uma estrutura organizacional inteiramente nova, tendo em vista a necessidade de maior celeridade e redução de custos. Assim, os diretores são automaticamente destituídos em bloco na assembleia geral que deliberar a dissolução e substituídos pelo liquidante, de preferência nomeado na mesma assembleia, para evitar qualquer solução de continuidade. O liquidante constitui órgão de gestão e de representação da companhia, em substituição aos diretores, devendo exercer suas funções durante todo o período da liquidação" (A lei das S/A comentada. 2ª ed. São Paulo: Quartier Latin, 2015. v. IV, p. 46-47). De modo ainda mais enfático, consigna Alfredo de Assis Gonçalves Neto: "O liquidante é a figura central da liquidação; é, em verdade, o órgão de administração da sociedade destinado a fazê-la desaparecer do mundo jurídico. É, portanto, o administrador da sociedade durante a liquidação, investido dos poderes adequados à prática de todos os atos necessários para conduzir a sociedade à sua extinção" (Direito de empresa: Comentários aos artigos 966 a 1.195 do Código Civil. 9ª ed. São Paulo: Thomson Reuters, 2019. p. 559).
[44] Sérgio Campinho; Mariana Pinto. A sociedade limitada na perspectiva de sua dissolução. São Paulo: Saraiva, 2022. p. 83.
[45] Sérgio Campinho; Mariana Pinto. A sociedade limitada na perspectiva de sua dissolução. São Paulo: Saraiva, 2022. p. 84.
[46] Sérgio Campinho. A preservação da empresa na falência. In: WAISBERG, Ivo; RIBEIRO, José Horácio Halfeld Rezende (Org.). Temas de direito da insolvência: Estudos em homenagem ao Professor Manoel Justino Bezerra Filho. São Paulo: IASP, 2017. p. 1.023-1.024.
[47] Sérgio Campinho. Curso de direito comercial: Falência e recuperação de empresa. 11ª ed. São Paulo: Saraiva, 2020. p. 72.
[48] O legislador procurou apresentar, de forma mais concentrada, ao longo do artigo 22 da Lei nº. 11.101/2005, os deveres e atribuições do administrador judicial, sendo certo que seu inciso I contempla os comuns aos processos de recuperação judicial e falência, seu inciso II reúne os referentes à recuperação judicial e seu inciso III volta-se na direção daqueles relativos à falência. No rol deste último inciso, encontram-se os deveres e atribuições de (i) arrecadar bens e documentos do devedor e elaborar auto de arrecadação (alínea f); (ii) avaliar os bens arrecadados ou, caso considere não possuir condições técnicas de fazê-lo, contratar avaliadores, preferencialmente oficiais, mediante autorização judicial, para a implementação da providência (alíneas g e h); (iii) praticar os atos necessários à realização do ativo e ao pagamento dos credores (alínea i); (iv) realizar a venda de todos os bens da massa falida no prazo máximo de cento e oitenta dias, contados a partir da data da juntada do auto de arrecadação, sob pena de destituição, salvo haja impossibilidade fundamentada, reconhecida por decisão judicial (alínea j); (v) praticar todos os atos conservatórios de direitos e ações e diligenciar a cobrança de dívidas outorgando as correspondentes quitações (alínea l); (vi) requerer todas as medidas e diligências que forem necessárias para o cumprimento da Lei nº. 11.101/2005, a proteção da massa ou a eficiência da administração (alínea o); e (vii) arrecadar os valores dos depósitos realizados em processos administrativos ou judiciais nos quais o falido figure como parte, decorrentes de penhoras, bloqueios, apreensões, leilões, alienações judiciais e outras hipóteses de constrição judicial, ressalvado o disposto nas Leis nos. 9.703/98 e 12.099/2009 e na Lei Complementar nº. 151/2015 (alínea s).
[49] Sérgio Campinho. A preservação da empresa na falência. In: WAISBERG, Ivo; RIBEIRO, José Horácio Halfeld Rezende (Org.). Temas de direito da insolvência: Estudos em homenagem ao Professor Manoel Justino Bezerra Filho. São Paulo: IASP, 2017. p. 1.024.
[50] O ponto - que já vinha, há alguns anos, sendo iluminado por Paulo Fernando Campos Salles de Toledo (A preservação da empresa, mesmo na falência. In: DE LUCCA, Newton; DOMINGUES, Alessandra de Azevedo (Coord.). Direito recuperacional: Aspectos teóricos e práticos. São Paulo: Quartier Latin, 2009. p. 526-533) e por Sérgio Campinho (A preservação da empresa na falência. In: WAISBERG, Ivo; RIBEIRO, José Horácio Halfeld Rezende (Org.). Temas de direito da insolvência: Estudos em homenagem ao Professor Manoel Justino Bezerra Filho. São Paulo: IASP, 2017. p. 1.025-1.030) - restou ainda mais nítido em virtude da nova redação atribuída ao artigo 75 da Lei nº. 11.101/2005 pela Lei reformadora nº. 14.112/2020.
[51] Confiram-se, em especial, além dos já citados artigos 140 e 75 da Lei nº. 11.101/2005, os artigos 22, inciso III, alínea j; 99, inciso XI e §3º; 139; e 141, todos do mesmo diploma legal.