O assunto, monopólio voltou à tona recentemente por conta da proposta de fusão entre as duas maiores redes de varejo pet do Brasil, Petz e Cobasi, está gerando intensos debates sobre possíveis impactos concorrenciais no setor. A operação, que criaria uma gigante com receita combinada de aproximadamente R$ 6,9 bilhões e 483 lojas em cerca de 20 estados, está sob análise do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade).
Além disso, há preocupações sobre o impacto nas relações com fornecedores. A nova empresa teria poder de barganha significativo, o que poderia dificultar a entrada de novos concorrentes e limitar a diversidade de produtos disponíveis aos consumidores.
Petlove se posiciona contra a fusão
A Petlove, terceiro maior player do setor com faturamento anual de cerca de R$ 1 bilhão, manifestou-se contrária à fusão. A CEO da empresa, Talita Lacerda, destacou em entrevista sobre o tema, a importância de manter um ambiente competitivo saudável para evitar aumentos de preços e prejuízos aos consumidores. O Cade admitiu a Petlove como terceira interessada no processo e permitiu sua participação ativa na análise da operação.
Quando a concorrência se torna domínio?
De acordo com Guilherme Bruschini sócio do MBC Advogados e Daniel Douek especialista em Direito concorrencial, a concorrência desaparece ou é substancialmente afetada nesses casos. Isso ocorre quando poucas empresas concentram poder suficiente para controlar preços e limitar a oferta. Elas também podem impedir a entrada de novos concorrentes, sem sofrer pressão competitiva relevante.
"No contexto de uma concentração econômica, como essa fusão entre Petz e Cobasi, o CADE busca avaliar justamente em que medida a operação pode (a) eliminar a concorrência em parte substancial do mercado, (b) criar ou reforçar uma posição dominante ou (c) resultar na dominação do mercado relevante envolvido, sem apresentação de eficiências compensatórias (e.g. aumento de produtividade, melhoria de qualidade e eficiências que sejam repassadas ao consumidor)", explicam os especialistas.
Como identificar um monopólio?
De acordo com André Camara, sócio da área societária do Benicio Advogados Associados, o monopólio caracteriza-se pela posição exclusiva ou quase exclusiva de uma empresa no mercado relevante, que pode ser definido por critérios de produto e geografia. Os principais sinais de monopólio incluem:
- Market share elevado (geralmente acima de 70%);
- Inexistência de substitutos efetivos;
- Capacidade de fixar preços ou excluir concorrentes sem prejuízo próprio;
- Controle de insumos essenciais ou canais de distribuição únicos; e
- Barreiras à entrada significativas, sejam elas regulatórias, tecnológicas ou estruturais.
"A identificação de um monopólio requer análise técnica detalhada, especialmente nos setores de tecnologia, serviços e distribuição, onde o poder de mercado se exerce de forma mais sofisticada", destacou Camara.
O que fazer após identificar um monopólio?
A especialista Daniela Poli Vlavianos, sócia do Poli Advogados & Associados, indica que uma vez identificado um monopólio que possa caracterizar abuso de poder econômico ou restrição à concorrência, é possível acionar o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (CADE), nos termos do art. 47 da Lei nº 12.529/2011, mediante representação formal. Em caso de restrição à concorrência, é possível acionar o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (CADE), conforme o artigo 47 da Lei nº 12.529/2011. O interessado também pode propor ação judicial para reparar danos causados, com base nos artigos 186 e 927 do Código Civil. Além disso, é possível requerer tutela inibitória para interromper práticas anticoncorrenciais e evitar novos prejuízos ao mercado ou aos consumidores. É possível, ainda, requerer medidas administrativas junto ao Ministério Público ou entidades de classe para atuação coletiva.
Como se proteger de um monopólio?
De acordo com os especialistas, empresas que atuam em mercados concentrados ou que participam de processos de fusão devem implementar uma estratégia robusta de compliance concorrencial, que inclua:
- Acompanhamento jurídico especializado desde as etapas preliminares da operação;
- Simulações de impacto concorrencial, com base em dados reais de mercado;
- Protocolo de submissão obrigatória ao CADE, quando ultrapassados os limites legais de faturamento (art. 88 da Lei nº 12.529/2011);
- Treinamentos internos regulares, especialmente para executivos e equipes comerciais; e
- Auditorias preventivas de condutas de mercado, para mitigar riscos de práticas unilaterais anticompetitivas.
Eles destacam ainda que essas medidas não apenas reduzem riscos legais, mas agregam valor à imagem institucional e à reputação regulatória da empresa.
Como se defender de uma acusação de monopólio?
Daniela Poli destaca que a defesa contra acusação de prática monopolista exige demonstração de que não houve abuso de posição dominante ou infração à ordem econômica. "Primeiramente, deve-se contestar a definição de mercado relevante feita pela acusação ou pelo CADE, demonstrando que há efetiva concorrência de produtos ou serviços substituíveis. Também é possível sustentar que a concentração de mercado é resultado de eficiência econômica, inovação ou investimento legítimo (eficiência dinâmica), sem prejuízo aos consumidores". Ela chama atenção também à necessidade de apresentar provas de que não houve práticas como preços predatórios, recusa de contratar ou imposição de cláusulas de exclusividade. As partes devem exercer plenamente o contraditório e a ampla defesa no processo administrativo do CADE.
Próximos passos
A fusão ainda depende da aprovação do Cade, que está conduzindo uma análise detalhada dos possíveis impactos concorrenciais. A decisão final considerará não apenas os efeitos sobre os grandes players do mercado, mas também sobre os consumidores e os pequenos empreendedores do setor.
O desfecho desse processo poderá redefinir o cenário do varejo pet no Brasil, influenciando preços, variedade de produtos e a dinâmica competitiva do setor.