A escritora mineira Fernanda Mello já dizia: "Promessas criam expectativas e expectativas, borram maquiagens e comprimem estômagos." Embora possa ser usada no cotidiano, a frase também se aplica à advocacia. O 1º Estudo Demográfico da Advocacia Brasileira (Perfil ADV), encomendado pelo Conselho Federal da OAB à Fundação Getulio Vargas (FGV) e publicado em 2024, apresenta o panorama da profissão no país, com base em 20.885 entrevistas realizadas em todo o território nacional.
Segundo o estudo, o Brasil possui a maior proporção de advogados por habitante em todo o mundo. São cerca de 1,3 milhão de profissionais em atividade para uma população de 212,7 milhões de pessoas, conforme dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Na prática, isso representa um advogado para cada 164 brasileiros.
O levantamento também revela que 34% dos advogados recebem até R$ 2.824 por mês, sendo que a maioria pertence à faixa etária de 21 a 23 anos. Enquanto 30% dos profissionais ganham entre dois e cinco salários mínimos. Já os que têm rendimentos entre cinco e 20 salários mínimos somam apenas 15% do total.
Diante desse cenário, tornam-se cada vez mais comuns as mentorias especializadas em prospecção de clientes, que utilizam a internet como ferramenta para ampliar os rendimentos, frequentemente apresentadas como "fórmulas de sucesso". Mas, assim como nos versos de Fernanda Mello, fica a pergunta: será que as expectativas conseguem se sustentar diante da realidade?
Estratégias de sucesso
Segundo Vinícius Nunes, CEO do VSN Advogados e mentor da imersão "Advogado Sustentável", é possível atrair clientes pela internet tanto por meio de tráfego orgânico quanto pago. "Se canalizar esse canhão de prospecção para dentro de um produto jurídico, em um nicho que paga honorários iniciais, e nesse nicho for algo simples de entregar, que não envolva audiências de instrução ou produção de provas mais complexas, ele terá um serviço fácil de executar, com cobrança antecipada de honorários e clientes chegando o tempo todo", afirma Nunes em um vídeo para o Instagram.
O advogado complementa dizendo que, por se tratar de um produto simples, é possível atuar mesmo sem experiência prévia. Além disso, ao cobrar honorários iniciais, o profissional é remunerado desde o início. Na visão do mentor, esse modelo oferece um volume expressivo de potenciais clientes, o que permite escalar a prestação de serviços jurídicos com maior previsibilidade.
Promessa x realidade
Mesmo com estratégias bem definidas, é difícil que as promessas de lucro rápido se apliquem a todos os nichos jurídicos existentes no mercado. Edmar Bulla, fundador da Croma Consultoria — empresa especializada em estratégias de inovação —, afirma que não existe atalho sustentável na construção de valor com o cliente, e o único caminho é no longo prazo.
"Prospecção eficaz não é sobre hackear algoritmos nem disparar mensagens padronizadas. É sobre gerar valor. Quando o resultado do seu trabalho vende a sua marca através de clientes, os negócios fluem por indicação. E isso, sim, é marketing de influência na sua melhor forma. Quem busca milagre no marketing acaba pagando caro por ilusão", diz Bulla.
Thiago Muniz, CEO da Receita Previsível — consultoria especializada em prospecção e vendas B2B —, reconhece que é possível obter ganhos rápidos na advocacia. No entanto, destaca que resultados pontuais não significam previsibilidade.
"Quem entra na advocacia achando que vai escalar faturamento sem estrutura, cai no ciclo da gangorra: um mês bom, dois ruins, três de dúvida existencial. Acredito que esse discurso não só é nocivo — ele é desonesto. E mais do que desonesto, ele cria um ciclo de frustração e comparação que paralisa quem está começando", complementa Muniz.
O marketing jurídico deve ser visto como uma ferramenta de construção de valor e relacionamento — e não como uma fórmula mágica para o sucesso imediato. Essa é a visão de Lilian Carvalho, coordenadora do Centro de Estudos em Marketing Digital da FGV EAESP e fundadora da Método Lumière.
"A chave está em promover a transparência, o conteúdo relevante e a ética profissional, alinhando o marketing à identidade real do advogado e à oferta legítima de serviços. Conforme modelos contemporâneos de marketing de serviços profissionais, o marketing eficaz cria confiança e fortalece a marca pessoal ao longo do tempo", afirma Lilian.
A visão de dentro dos escritórios de advocacia
Para Mirela Saár, sócia do Chalfin, Goldberg & Vainboim Advogados, eleito Mais Admirado 12 vezes no anuário ANÁLISE ADVOCACIA, existem boas práticas e pilares que podem orientar a prospecção de clientes de forma geral. No entanto, ela afirma que não há um "passo a passo" infalível que funcione para todos os advogados indiscriminadamente.
"O direito abrange diversas áreas, e é fundamental que o profissional defina seu nicho de atuação, o perfil de cliente que deseja atingir, a abordagem mais adequada para alcançá-lo e os canais de comunicação ideais para sua estratégia. A prospecção na advocacia está longe de ser uma fórmula universal — estratégias que funcionam bem para uns podem ser ineficazes para outros", complementa Mirela.
Mariana Cardoso Martins, sócia do CMRC Law, também diz não acreditar em fórmulas prontas para o sucesso na prospecção de clientes — seja para resultados rápidos ou para o fechamento de contratos. "Eu refuto completamente essas fórmulas. A maioria vende algo que não é o que entrega. Por isso, não acredito em fórmula de sucesso."
Segundo Mariana, para um profissional alcançar bons resultados, é necessário ter foco, disciplina, constância e, acima de tudo, compreender os caminhos de crescimento de uma empresa ou de uma carreira. "Tudo que é anunciado como fácil ou imediato, ou não existe, ou vai embora com a mesma rapidez", conclui.
O que fazer para ter sucesso na advocacia?
Infelizmente, o sucesso na advocacia é uma promessa que pode demorar a ser cumprida. Para Henrique Rodrigues e Silva, sócio do Coletta Rodrigues Advogados, em vez de seguir fórmulas milagrosas, o melhor caminho é investir tempo e recursos no preparo técnico individual e no desenvolvimento de habilidades comportamentais. "Saber se portar e fazer-se presente nos ambientes para ter acesso a bons clientes, e ter condições de gerenciar demandas complexas quando as oportunidades surgirem", afirma Rodrigues.
Já para Mariana Cardoso Martins, o conselho é construir autoridade, estudar, manter o foco, consolidar uma carreira com credenciais acadêmicas e, principalmente, cultivar uma boa rede de contatos e negócios. Mas nada disso acontece da noite para o dia.
"Eu sempre aconselho minha equipe: estudem, se preparem, escrevam sobre temas de interesse, não tenham vergonha de se expor, de participar de eventos e de buscar um networking qualificado. Esse é o meu diagnóstico. Para mim, não existe fórmula mágica. Carreira sólida, conhecimento técnico e carteira de clientes se constroem com o tempo, com foco, disciplina e estudo", complementa a sócia do CMRC Law.
Mirela Saár, do Chalfin, Goldberg & Vainboim Advogados, reforça que o marketing jurídico deve ocupar um lugar estratégico nos escritórios. Mais do que divulgar serviços, ele é uma ferramenta para gerar valor e construir autoridade no longo prazo.
"É fundamental ter consistência na produção de conteúdo, demonstrar excelência técnica e, principalmente, cuidar do relacionamento com os clientes. Marketing não é atalho: é ferramenta de posicionamento e construção de credibilidade ao longo do tempo", afirma Mirela.
Portanto, não há atalhos ou caminhos fáceis para se construir uma carreira de sucesso na advocacia. O que existe é constância, preparação e trabalho duro. No fim das contas, as promessas rápidas podem até parecer tentadoras — mas só aumentam o número de maquiagens borradas e consultas ao gastroenterologista.