A Proteção Legal da Cédula de Crédito Bancário (CCB) no Financiamento Agropecuário | Análise
Análise

A Proteção Legal da Cédula de Crédito Bancário (CCB) no Financiamento Agropecuário

Por Eduarda de Macedo Coelho

28 de May 15h30

A Cédula de Crédito Bancário (CCB) tornou-se frequente nas operações do agronegócio brasileiro, mas há pontos importantes que produtores precisam conhecer para garantir todos os seus direitos. 

Criada pela Lei 10.931/2004, a CCB é um título de crédito que representa promessa de pagamento em dinheiro em favor de instituições financeiras. Trata-se de instrumento bastante flexível: pode formalizar empréstimos e financiamentos de diversos tipos, voltados tanto para pessoas físicas quanto jurídicas, e para as mais variadas finalidades — como crédito pessoal, renegociação de dívidas, investimentos empresariais, entre outros.

Embora a CCB não seja exclusiva do setor agropecuário, é cada vez mais utilizada pelos bancos para financiar atividades do agronegócio, muitas vezes no lugar das tradicionais Cédulas de Crédito Rural (CCR), como as de natureza pignoratícia ou hipotecária. O problema é que, em certas situações, a escolha pela CCB busca disfarçar a natureza rural do financiamento, mascarando-o como se fosse um contrato bancário comum. Essa estratégia pode induzir o produtor a pagar encargos superiores ou renunciar a direitos específicos.

No entanto, a legislação brasileira é clara a respeito do tratamento do crédito rural. A Lei 4.829/1965 define que qualquer financiamento concedido por instituições financeiras a produtores rurais ou cooperativas, com finalidade específica de custear atividades agrícolas ou pecuárias, deve ser tratado juridicamente como crédito rural, independentemente da espécie do título usado — inclusive se for uma CCB. No caso, as principais legislações aplicáveis são:

  •     Lei nº 4.829/1965 — Institui a Política do Crédito Rural.
  •     Decreto-Lei nº 167/1967 — Regula as cédulas rurais.
  •     Lei nº 8.171/1991 — Dispõe sobre a Política Agrícola.

O critério principal é a destinação dos recursos. Se o valor captado por meio da CCB for destinado ao custeio, investimento ou comercialização de produtos agrícolas ou pecuários, estará enquadrado como crédito rural. Não importa a nomenclatura utilizada pelo banco: é a finalidade real que prevalece, e não a forma.

Se a CCB for utilizada para financiar atividades do campo, o produtor rural passa a contar com importantes proteções legais como:

    a) Juros limitados pelo CMN: O Conselho Monetário Nacional (CMN) regula o teto dos juros para operações de crédito rural, protegendo o produtor contra taxas abusivas.

    b) Juros de mora reduzidos: Em situações de inadimplência, os juros moratórios têm limite de até 1% ao ano (conforme fixado em lei para crédito rural), enquanto contratos bancários comuns podem prever até 12% ao ano, além de taxas referenciais como CDI, que não podem ser aplicadas ao crédito rural.

    c) Alongamento e renegociação da dívida: Caso eventos adversos, como quebra de safra ou desvalorização inesperada dos preços agrícolas, prejudiquem a capacidade de pagamento, a legislação prevê direito ao alongamento da dívida, permitindo prorrogação do financiamento com vistas à reestruturação do produtor — mecanismo essencial para a sobrevivência da atividade rural em crises cíclicas.

    d) Proteção contra práticas abusivas: A lei impede que instituições financeiras apliquem condições de contratos comuns (urbanos/comerciais) em operações de crédito rural formalizadas por meio da CCB. Cláusulas abusivas podem ser judicialmente afastadas.

Para resguardar os direitos do produtor, recomenda-se atenção redobrada, como por exemplo manter em ordem toda documentação que comprove a destinação rural dos recursos recebidos por meio da CCB. Ademais, antes de assinar a CCB, o produtor deve questionar qualquer cláusula que preveja encargos típicos de operações bancárias gerais (como cobrança de juros de mercado, taxas de administração injustificadas e indexadores como CDI).

Havendo recusa do banco em reconhecer a natureza rural da CCB ou cobrança de valores indevidos, o produtor deve imediatamente buscar um advogado especializado em Direito do Agronegócio para defesa efetiva de seus direitos, inclusive solicitando revisão contratual ou devolução de valores pagos indevidamente.

Portanto, a escolha por formalizar financiamentos rurais por meio de CCB não retira do produtor os direitos e proteções previstos nas normas específicas de crédito rural. Atenção ao propósito do financiamento é fundamental: se os recursos se destinam à produção rural, toda a legislação especial do setor se aplica.

Dra. Eduarda de Macedo Coelho

Sócia-fundadora do Macedo Coelho Advogados

Advogada especialista em Direito Agrário e do Agronegócio

OAB/SC 64.959