Nota-se, principalmente a partir de 2017, um amplo movimento reformista do Direito do Trabalho - não limitado à reforma da legislação trabalhista.
De fato, as leis da "Reforma Trabalhista" (Lei nº 13.467/2017), da Terceirização (Lei nº 13.429/2017), e a Lei da Liberdade Econômica (Lei nº 13.874/2019) trouxeram novidades relevantes e indicaram um viés mais liberal adotado pelo legislativo.
Mas além da atividade legislativa, o Supremo Tribunal Federal (STF) assumiu protagonismo na interpretação de uma série de relevantes matérias trabalhistas, validando essa visão do legislador, flexibilizando e superando conceitos e ideias arraigados na cultura jurídica justrabalhista - e em grande medida indo contra a jurisprudência de longa data consolidada pela Justiça do Trabalho.
Resumidamente, alguns dos temas trabalhistas solucionados pelo STF nos últimos anos:
· constitucionalidade da terceirização irrestrita, em qualquer atividade da empresa, meio ou fim (ADIs 5.685 e 5.695; Tema 725);
· constitucionalidade da figura do transportador rodoviário de cargas sem vínculo de emprego prevista na Lei nº 11.442/2007 (ADC 48 e ADI 3.961);
· constitucionalidade do contrato de parceria sem vínculo empregatício entre salões de beleza e profissionais (ADI 5.625);
· o fim da contribuição sindical compulsória (ADI 5.794 e ADC 55);
· alteração do critério de atualização dos débitos trabalhistas, valendo a SELIC em substituição ao índice de correção monetária e taxa de juros (ADCs 58 e 59);
· prevalência do negociado coletivo sobre o legislado, desde que respeitados direitos indisponíveis (Tema 1.046);
· a inconstitucionalidade parcial das regras da Reforma Trabalhista que limitavam a gratuidade de justiça na Justiça do Trabalho (ADI 5.766);
· a não incorporação dos direitos previstos nos acordos coletivos e convenções coletivas de trabalho aos contratos individuais de trabalho após o término da sua vigência (ADPF 323);
· regulamentação das demissões em massa, estabelecendo o STF apenas a necessidade de participação do sindicato, mas sem exigir autorização do sindicato ou que seja assinado acordo coletivo (Tema 638);
· validade da saída do Brasil da Convenção nº 158 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), permanecendo o direito dos empregadores de realizar demissões imotivadas de empregados (ADI 1.625 e ADC 39);
· a inconstitucionalidade do teto de indenização por danos morais estabelecido pela Reforma Trabalhista, servindo a lei apenas como parâmetro (ADIs 6.050, 6.069 e 6.082);
· a constitucionalidade da contribuição sindical assistencial a ser paga por todos os empregados da categoria, mesmo para os não sindicalizados, desde que assegurado o direito de oposição (Tema 935);
· validade da jornada de 12h de trabalho por 36 horas de descanso por acordo individual - sem participação sindical e negociação coletiva (ADI nº 5.994).
E mesmo com tantas relevantes decisões, ainda há temas sensíveis que aguardam conclusão no STF:
Ø a (in)constitucionalidade do contrato de trabalho intermitente (questionada nas ADIs 5.826, 5.829 e 6.154);
Ø a (in)constitucionalidade de disposições da Reforma Trabalhista que dificultaram a edição e alteração de Súmulas dos tribunais trabalhistas (ADI 6.188); e
Ø a possibilidade de inclusão, já em execução, de codevedor solidário que não participou da fase de conhecimento, por ser empresa integrante do grupo econômico, bem como nas hipóteses de fraude à execução (Tema 1.232).
Além de todas estas decisões, o Supremo formou jurisprudência inovadora a partir dos julgamentos das terceirizações irrestritas, do transportador autônomo e do profissional parceiro nos salões de beleza, entendendo pela compatibilidade da "pejotização" com a Constituição Federal. O STF validou a adoção de formas alternativas de contratação de mão de obra, sem prevalência ou preferência do vínculo de emprego celetista, principalmente para os profissionais não-hipossuficientes, de maior qualificação ou remuneração - a exemplo de profissionais liberais, médicos, advogados, professores, jornalistas, artistas etc.
Nesse sentido, diversas Reclamações Constitucionais (RCL) foram acolhidas pelo STF para cassar decisões da Justiça do Trabalho em casos de reconhecimento de vínculo empregatício de médicos (RCL 47.843), advogados (RCL 53.899), entre outros tantas (RCLs 56.285, 57.793, 59.836, 59.906, apenas para citar algumas).
O impacto dessa nova orientação do Supremo Tribunal Federal é altíssimo, porque supera alguns dogmas do Direito do Trabalho, abalando não apenas a jurisprudência até então pacífica do Tribunal Superior do Trabalho e demais tribunais trabalhistas, mas também a doutrina sedimentada há décadas - talvez inaugurando um novo momento das relações trabalhistas no Brasil, impondo a reabertura do debate de institutos e temas caros ao Direito do Trabalho.