Tradicionalmente, a discussão sobre D&I no meio jurídico focava em aspectos como gênero, etnia, orientação sexual e pessoas com deficiência física. No entanto, a compreensão de que a diversidade vai além do que é visível tem impulsionado a inclusão de pautas como a neurodiversidade, que abrange condições como Transtorno do Espectro Autista (TEA), Transtorno do Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH), dislexia, entre outras.
Após a pesquisa realizada para o especial ANÁLISE ADVOCACIA DIVERSIDADE E INCLUSÃO 2025, pudemos identificar uma ascensão da neurodiversidade como um novo pilar da advocacia inclusiva. Reconhecer e valorizar as diferentes formas de pensar e processar informações é fundamental para o desenvolvimento de uma advocacia verdadeiramente inclusiva e, consequentemente, mais eficiente.
Ascensão da neurodiversidade
Os dados da pesquisa revelam uma mudança significativa na percepção e implementação dos pilares de D&I nos escritórios de advocacia brasileiros. Enquanto temas como equidade de gênero e diversidade étnico-racial permanecem como prioridades, a neurodiversidade tem demonstrado um crescimento notável em sua adoção como pilar estratégico.
O número de escritórios que consideram neurodiversidade como pilar de D&I saltou de 20% em 2022 para 32% em 2025. Esse aumento de 12 pontos percentuais em apenas três anos, embora ainda represente uma fatia menor em comparação com outros pilares, sinaliza um reconhecimento crescente da importância de se abordar essa dimensão da diversidade.
Este avanço reflete uma maior conscientização sobre a prevalência da neurodiversidade na população e seus benefícios para o ambiente corporativo. Segundo o artigo Neurodiversidade no Trabalho, do British Medical Bulletin, estima-se que entre 15% e 20% da população global seja neurodiversa. No Brasil, embora dados precisos sejam escassos, a prevalência de condições como o Transtorno do Espectro Autista (TEA) segue a média mundial, com cerca de uma em cada 160 crianças sendo diagnosticada com TEA, segundo a Organização Mundial da Saúde. Por isso, a adoção de medidas específicas para incluir estes profissionais se faz cada vez mais necessária.
Para Leonardo Toledo, sócio do Toledo Marchetti — escritório que conta com profissionais neurodivergentes e atua com a neurodiversidade como um de seus pilares de inclusão —, o tema ganhou força recentemente:
Neurodiversidade como diferencial competitivo
A inclusão de profissionais neurodiversos no ambiente jurídico não é apenas uma questão de justiça social, mas também uma estratégia inteligente de negócios. As características frequentemente associadas à neurodiversidade podem se traduzir em vantagens competitivas significativas para escritórios de advocacia e departamentos jurídicos.
Por exemplo, indivíduos com Transtorno do Espectro Autista (TEA) podem apresentar uma capacidade excepcional de focar em detalhes, identificar padrões e analisar grandes volumes de informações de forma lógica e sistemática. Essas habilidades são inestimáveis em tarefas como revisão de contratos, análise de jurisprudência, due diligence e pesquisa jurídica, onde a precisão e a atenção minuciosa são cruciais.
Profissionais com TDAH, por sua vez, podem demonstrar alta energia, criatividade, pensamento lateral e a capacidade de hiperfoco em tarefas que os engajam. Essas qualidades podem ser extremamente benéficas em áreas que exigem inovação, como o desenvolvimento de novas estratégias jurídicas, a resolução criativa de disputas e a adaptação a cenários complexos e em constante mudança.
A dislexia, embora possa apresentar desafios na leitura e escrita tradicionais, muitas vezes está associada a habilidades superiores de raciocínio visual, pensamento holístico e resolução de problemas.
Ao avaliar o impacto dessa transformação no setor jurídico, Toledo reforça:
Desafios na inclusão de neurodivergentes
Embora os benefícios da neurodiversidade sejam evidentes, a sua plena inclusão no setor jurídico ainda enfrenta desafios significativos. A falta de conhecimento e a persistência de estereótipos são barreiras que precisam ser superadas.
Um dos principais desafios é a falta de conscientização e compreensão sobre o que é a neurodiversidade e como ela se manifesta. Muitos profissionais ainda associam a neurodiversidade a deficiências, ignorando o vasto espectro de habilidades e talentos que ela engloba.
Comentando sobre os obstáculos mais recorrentes, Toledo observa:
"O maior gargalo costuma ser comunicacional. Criar caminhos de comunicação mais claros é fundamental para garantir que o profissional seja ouvido para que haja inclusão real".
Outro desafio reside na adaptação dos processos de recrutamento e seleção. Os métodos tradicionais, que muitas vezes valorizam a comunicação verbal e a interação social em detrimento de outras habilidades, podem desfavorecer candidatos neurodiversos. Além disso, a criação de um ambiente de trabalho verdadeiramente inclusivo exige adaptações no dia a dia, como flexibilização de horários, oferta de espaços silenciosos e capacitação de líderes.
Os próximos passos da inclusão
A neurodiversidade representa um novo e promissor pilar para a advocacia inclusiva. Os dados da pesquisa demonstram um avanço, ainda que gradual, na conscientização e implementação de programas que contemplam essa dimensão da diversidade.
Ao abraçar a neurodiversidade, os escritórios de advocacia e departamentos jurídicos não apenas cumprem um papel social fundamental, mas também se posicionam estrategicamente em um mercado cada vez mais exigente e competitivo.
Na visão do advogado, avançar nessa pauta exige um olhar equilibrado: